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Explosão populacional ao sul do Saara África enfrenta uma bomba populacional Planejamento familiar pode reverter a situação
Por ELISABETH ROSENTHAL Lagos, Nigéria Se o índice de crescimento demográfico da Nigéria se mantiver, dentro de 25 anos o país terá 300 milhões de habitantes -uma população equivalente à dos EUA hoje. Em Lagos, centro comercial do país onde nos últimos 15 anos a população quase dobrou, chegando a 21 milhões de pessoas, o padrão de vida de muitas delas vem caindo. Habitantes da cidade como Peju Taofika e suas três netas vivem em um cômodo num prédio de apartamentos de um tipo muito comum, conhecido como "Face You, Face Me" (algo como "você e eu cara a cara"), porque famílias inteiras se comprimem em cômodos de dois por três metros dispostos ao longo de um corredor estreito. Até 50 pessoas dividem uma mesma cozinha, privada e pia. Falta água com frequência no bairro. Enquanto grande número de estudantes se forma nos colégios e nas universidades, o índice de desemprego na Nigéria é de quase 50% entre pessoas da zona urbana na faixa dos 15 aos 24 anos, fomentando a criminalidade e a insatisfação. A crescente classe média também sente o aperto. Seus deslocamentos para o trabalho, a partir dos subúrbios, podem consumir duas a três horas por dia. Em outubro passado, a ONU anunciou que a população global tinha passado dos 7 bilhões de pessoas e vai crescer rapidamente pelas próximas décadas, sobrecarregando os recursos naturais. Quase todo o crescimento demográfico acontece na África subsaariana, onde o crescimento populacional supera de longa a expansão econômica. Dos 20 países do mundo em que as mulheres têm mais de cinco filhos em média, quase todos ficam nessa região. Em outras países em desenvolvimento, na Ásia e na América Latina, o índice de fertilidade teve queda acentuada nas últimas décadas e hoje é semelhante ao dos EUA: um pouco mais de dois filhos por mulher. Em cada país essa transformação foi motivada por oportunidades de ensino e emprego para as mulheres, acesso à contraceptivos, urbanização e pelo crescimento da classe média. Não está claro se forças iguais vão desativar a bomba populacional na África subsaariana. "O ritmo do crescimento demográfico na África supera qualquer coisa vista na história. É um problema crítico", afirmou Joel E. Cohen, professor de demografia na Universidade Rockefeller, em Nova York. "O que é eficaz no contexto desses países pode não ser o que funcionou na América Latina, em Kerala ou em Bangladesh." Em toda a África subsaariana, governos alarmados estão começando a tomar medidas, em muitos casos revertendo políticas de longa data de incentivo de famílias grandes. No ano passado, a Nigéria disponibilizou anticoncepcionais gratuitos e as autoridades vêm promovendo a ideia de famílias menores como a chave da salvação econômica, apontando para o exemplo dos avanços financeiros feitos em países como a Tailândia. País que tem a sexta maior população mundial -167 milhões de pessoas-, a Nigéria é um teste crucial. Se este país grande, dono de riqueza petrolífera, não conseguir controlar seu crescimento, que esperanças haverá para os países menores e mais pobres? As estatísticas são assombrosas. A África subsaariana, que hoje tem 12% da população mundial, até 2100 será responsável por mais de um terço dela. Durante séculos, a África foi pouco povoada e tinha economia de base agrícola; por essas razões, seus líderes encorajavam os altos índices de fertilidade. Introduzido nos anos 1970, o planejamento familiar foi visto como algo estrangeiro. Mais tarde, dinheiro e atenção foram desviados do planejamento familiar para o combate à crise da Aids no continente. A transição de índices de natalidade altos para baixos traz benefícios econômicos substanciais, segundo Eduard Bos, especialista demográfico do Banco Mundial. Os responsáveis políticos da Nigéria estão estudando como fomentar a transição nesse país. Hoje, muitos adultos jovens, especialmente as mulheres com nível de instrução mais alto, querem dois a quatro filhos. Mas as preferências dos homens, especialmente os mais velhos, têm demorado mais a mudar, fato crucial numa cultura patriarcal em que a poligamia é amplamente praticada. Em sua casa de concreto na cidade de Ipetumodu, o lavrador Abel Olanyi, 35, disse que tem quatro filhos e quer mais dois. "O número de filhos que você tem depende de sua força", afirmou. Famílias grandes são um sinal de prosperidade e importância em culturas africanas. Em algumas sociedades só se permite às mulheres participar de reuniões depois de terem tido seu 11˚ filho. E um histórico de alta mortalidade infantil faz com que as famílias relutem em ter menos filhos. Nos países asiáticos, o uso de anticoncepcionais pelas mulheres saltou de menos de 20% para entre 60% e 80%, em poucas décadas. Na América Latina, a exigência de que as meninas concluam o ensino médio foi acompanhada por uma queda acentuada na natalidade. No entanto, o uso de anticoncepcionais vem subindo apenas a uma fração de 1% ao ano na África subsaariana -em muitos países, não chega a 20%- e, nas pesquisas, mulheres com alto nível de instrução afirmam querer entre quatro e seis filhos. Para o demógrafo Peter Ogunjuyigbe, as mudanças na economia e nos estilos de vida dos africanos de classe média podem ajudar a fazer a maré virar. À medida que a população da Nigéria se urbaniza, a ajuda dos filhos no campo deixa de ser necessária e as famílias extensas se decompõem. "As crianças eram consideradas uma espécie de seguro para o futuro; hoje são vistas como despesa para toda a vida", disse ele. Ayoola Adeeyo, 42, que aguardava numa clínica para mulheres, quer que seus quatro filhos, de 6 anos a 17 anos, façam faculdade e disse que não quer mais filhos. "Antigamente as pessoas queriam seis, sete ou até 12, mas hoje ninguém mais dá conta disso. É a economia", explicou. Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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