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O escritório em mutação

No ruído das baias, um grito de socorro

A busca por uma boa acústica e pelo espaço privado

Jennifer S. Altman/The New York Times
Barrie Berg, diretora de uma consultoria em Manhattan, diz que baias como as de lanchonetes garantem privacidade para conversas
Barrie Berg, diretora de uma consultoria em Manhattan, diz que baias como as de lanchonetes garantem privacidade para conversas

Por JOHN TIERNEY

As paredes dos escritórios vêm caindo, mas os habitantes dos cubículos continuam construindo outras. Eles se entrincheiram atrás de armários com arquivos. Fortificam suas baias com torres de livros e papéis. Ou seguem uma "lei da etiqueta tecnológica", tal qual estabelecida por Raj Udeshi no escritório aberto que ele divide com outros empresários de software em Manhattan.

"Fones de ouvido são as novas paredes", disse ele, apontando as orelhas cobertas dos seus vizinhos.

Ultimamente, as queixas sobre os cubículos têm sido ouvidas por gestores e cientistas sociais, e as empresas vêm redesenhando os escritórios e tentando melhorar a acústica. Há um grande burburinho em torno de "mascarar o som".

Os cientistas estão mensurando a infelicidade e a menor produtividade dos trabalhadores distraídos. Após entrevistarem 65 mil pessoas na última década em países de quatro continentes, pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, relataram que mais da metade dos funcionários de escritórios está insatisfeita com seu grau de "privacidade do discurso", uma das principais queixas nos locais de trabalho.

"Em geral, as pessoas não gostam da acústica dos escritórios abertos", disse John Goins, líder da pesquisa realizada pelo Centro para o Ambiente Construído, de Berkeley. "Os barulhentos não se incomodam tanto com a falta de privacidade, mas a maioria das pessoas não está feliz, e os projetistas estão finalmente começando a levar isso em consideração."

Há três anos, quando a empresa de softwares Autodesk se mudou para um prédio de planta aberta em Waltham, Massachusetts, foi instalado um sistema de "ruído rosa": um sopro suave emitido por alto-falantes parecidos com um sistema de ventilação, que foi formulado para acompanhar as frequências das vozes humanas.

A Autodesk operou o sistema por três meses sem contar aos empregados -e então, para avaliar seu impacto, o desligou um dia.

"Ficamos surpresos com a quantidade de queixas que recebemos", disse Charles Rechtsteiner, gerente de instalações da empresa.

"As pessoas não sabiam ao certo o que estava diferente, mas sabiam que havia algo de errado. Elas estavam sendo distraídas por conversas a 18 metros de distância. Quando o sistema está ligado, a fala se torna ininteligível a partir de seis metros".

A motivação inicial para o escritório aberto, além de economizar espaço e dinheiro, foi a de estimular a comunicação, a colaboração e a inovação.

Mas comunicação demais às vezes tem o efeito contrário: perda de privacidade e irritação entre os colegas.

"Estudos mostram que as pessoas têm conversas mais curtas e superficiais em escritórios abertos, porque estão cientes de que podem ser entreouvidas", disse Anne-Laure Fayard, professora de administração no Instituto Politécnico da Universidade de Nova York.

"Todo mundo ainda está experimentando formas de equilibrar a necessidade de colaboração e a necessidade de privacidade."

É o caso do escritório de Udeshi na incubadora de negócios do instituto, um galpão com dezenas de startups (empresas iniciantes) abrigadas em baias baixas.

Os empreendedores de lá dizem que às vezes têm ideias úteis ao entreouvirem conversas, mas que também se veem fugindo para um banheiro ou um armário de vassouras para conversas reservadas.

Quando precisam discutir um assunto delicado com um vizinho, as pessoas geralmente recorrem ao e-mail ou a mensagens instantâneas.

"Você acaba sendo muito interrompido pelos pensamentos aleatórios das pessoas", disse o consultor de energia Jonathan McClelland, que trabalha no local.

Pesquisadores do Instituto de Saúde Ocupacional da Finlândia estudaram as conversas de escritório e seu efeito sobre ouvintes involuntários.

Eles observaram um declínio de 5% a 10% no desempenho de tarefas cognitivas que exigem o uso eficiente da memória de curto prazo, como ler, escrever ou outras formas de trabalho criativo.

"O barulho é o problema mais sério no escritório aberto, e a fala é o tipo mais perturbador de som, porque é diretamente entendida na memória de trabalho do cérebro", disse Valtteri Hongisto, especialista em acústica no instituto.

Ele concluiu que os trabalhadores ficavam mais satisfeitos e rendiam mais em tarefas cognitivas quando sons da fala eram mascarados pelo ruído de fundo de um riacho borbulhante.

Os projetistas de escritórios começaram a adicionar materiais à prova de ruído nos cubículos e a testar configurações que ofereçam lugares tranquilos nos quais os trabalhadores possam se recolher. Uma tática comum é reservar uma salinha para conversas e telefonemas.

Fayard, da Universidade de Nova York, descobriu que algumas salas de reunião são evitadas por parecerem formais e intimidadoras. Ir para lá, disse ela, causa nas pessoas a sensação de que é preciso "esconder alguma coisa ou falar de algum problema".

Na sede da consultoria What If, em Manhattan, quem quer conversar pode ir para baias semelhantes às de lanchonetes, na ponta do espaço comum.

"Há algo de muito satisfatório numa baia [desse tipo]", disse Barrie Berg, executiva-chefe de operações da empresa nos Estados Unidos.

"Dá para ver o que está acontecendo ao seu redor, as pessoas podem ver você, mas você ainda consegue ter uma conversa particular sem perturbar ninguém ao redor. Somos uma cultura de gente que trabalha melhor com um burburinho ao nosso redor, mas esse burburinho precisa ser administrável", completa Berg.

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