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Inteligência/Erhard Stackl

Ponto de inflexão na Europa

Viena

As crises europeias se encaminham para um ponto de inflexão no próximo domingo, quando França e Grécia realizam eleições parlamentares nas quais avançam forças políticas que propõem novas maneiras de resolver os problemas da moeda continental.

O Partido Socialista, do presidente François Hollande, favorito para obter maioria parlamentar nas eleições programadas para ontem e para o dia 17, exige como solução para a crise a emissão de títulos garantidos conjuntamente por membros da zona do euro. A Alemanha resiste a esse plano, e a chanceler Angela Merkel insiste em cortes de gastos públicos para salvar o euro. Internamente, Merkel enfrenta críticas por despejar o dinheiro alemão em países europeus considerados mal administrados.

Na Grécia, uma coalizão de partidos radicais de esquerda está desafiando ainda mais os credores, ameaçando suspender os pagamentos da dívida nacional. Os líderes da coalizão Syriza desejam permanecer no euro, mas abandonar o programa de austeridade. Seu objetivo é obrigar a "troika" de credores -Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional- a voltarem à mesa de negociação. O Syriza também deseja revogar medidas impostas pela "troika", como a redução do salário mínimo em 20%.

Um novo livro de Thilo Sarrazin, que escreveu o anti-islâmico "A Alemanha Está Se Abolindo", cujas vendas atingiram mais de 1,4 milhão de exemplares, está agitando a opinião pública alemã. A atitude de Sarrazin frente à moeda única é declarada já no título do seu novo livro: "A Europa Não Precisa do Euro". Sarrazin, 67, um indômito social-democrata e ex-presidente do Banco Central, traça uma distinção entre os europeus do norte, que, segundo ele, são cautelosos com suas finanças, e os do sul, cuja gastança precipitou a crise do euro. Ele argumenta ainda que outros europeus continuam tentando arrancar dinheiro da Alemanha por causa dos seus crimes durante a Segunda Guerra Mundial.

Franz Vranitzky, ex-chanceler da Áustria, observou que países como o seu e a Alemanha prosperaram sob o euro. A Áustria, disse, está protegida das flutuações cambiais desde a criação do euro, em 1999. Antes, os exportadores de países competidores, como a Finlândia, podiam derrotar os austríacos em mercados lucrativos, desvalorizando sua moeda nacional da noite para o dia.

O poderio econômico alemão deriva em grande medida do fato de o país destinar quase metade das suas exportações para a zona do euro. Outros também querem se aproveitar dos benefícios do euro, como a Polônia, que registra o maior crescimento da região e mantém seus planos de aderir à moeda comum.

Vranitzky, 75, também social-democrata e ex-presidente de Banco Central, acha que os comentários de Sarrazin servem para vender livros, pois despertam a atenção de um público "suscetível ao populismo, à xenofobia e ao nacionalismo". Ele crê que os títulos comuns europeus sejam necessários. "É preciso continuar negociando o financiamento de países que foram empurrados para a recessão por medidas de austeridade", afirmou Vranitzky. "É impossível combater a recessão mantendo em vigor o elemento que a criou."

A alegação de que a Alemanha continua sendo chamada a expiar o Holocausto é um "absurdo ultrajante", acrescentou.

Mas nem todos estão dispostos a deixar o passado para trás. Novamente, são os gregos que discordam. "Reparações ainda são uma questão em aberto para nós", me disse o economista Theodoros Paraskevopoulos, porta-voz do Syriza.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o Banco Central da Grécia foi forçado a conceder empréstimos à Alemanha nazista e à Itália fascista. "A Itália pagou seu empréstimo, já a Alemanha se recusou", disse Paraskevopoulos.

Para o historiador de origem austríaca Hagen Fleischer, da Universidade Nacional de Atenas, o valor pleiteado pela Grécia alcança € 5 bilhões (US$ 6,2 bilhões), sem os juros. Os esquerdistas gregos querem suspender os pagamentos à "troika" para que a população tenha tempo de se recuperar.

"O pacote de austeridade fracassou economicamente. Ele está provocando o colapso do Estado", disse Paraskevopoulos.

O Syriza propõe que, durante três anos de moratória, as parcelas do resgate financeiro à Grécia poderiam ser reduzidas consideravelmente, pois cerca de 90% da ajuda se destina a custear o serviço da dívida.

Ultimamente, políticos gregos moderados começaram a falar em renegociação dos termos do resgate. Se o novo governo grego concordar em manter o euro, ambos os lados precisarão ser mais flexíveis, segundo Vranitzky. Para acabar com o drama grego, eles precisarão aceitar restrições financeiras, mas novos incentivos também são necessários para fortalecer a economia.

Um colapso financeiro da Grécia espalharia ondas de choque pela Europa, expondo outros países em dificuldades e próprio o euro a um perigo letal. Ninguém deseja realmente descobrir o que aconteceria então.

Erhard Stackl é ex-editor-chefe do "Der Standard", e autor do livro "1989 - The Falling of Dictatorships" ["1989 - A queda das ditaduras"]. Envie comentários para intelligence@nytimes.com

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