Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Inteligência/Yanzhong Huang

Mesmo fora dos holofotes, a OMS é vital

Nova York

Viajei para Déli no início deste ano para me encontrar com autoridades do governo, acadêmicos e líderes de organizações não-governamentais para explorar o envolvimento da Índia na saúde global. Para minha surpresa, muitos na Índia ainda viam a OMS (Organização Mundial de Saúde) basicamente como uma agência operacional e não a consideravam tão importante quanto o Banco Mundial ou a Fundação Gates.

A imagem da OMS na Índia mostra a situação bizarra da agência na cena internacional. Enquanto o poder global se desloca em direção às economias emergentes, incluindo os chamados Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), elas também estão enfrentando novos desafios de saúde. Por causa de mudanças na dieta, estilo de vida, urbanização e falta de exercício, enfrentam doenças não transmissíveis como diabetes, câncer e doenças cardíacas. China, Rússia, Índia e Brasil perdem mais de 20 milhões de anos-vidas produtivos por ano para doenças não transmissíveis, segundo o Fórum Econômico Mundial.

Mas a OMS, a principal agência especializada em saúde internacional no sistema das Nações Unidas, carece criticamente de peritos para cobrir essas doenças. Seria de esperar que esses países com crescentes poderes financeiros e problemas de saúde investissem mais em saúde global. Mas suas contribuições são limitadas. A parcela total de contribuição dos Brics à OMS para seu orçamento regular de 2012-13 é de apenas 7,3%.

Historicamente, a organização empreendeu um amplo leque de campanhas contra grandes ameaças de doenças, que culminaram na bem-sucedida erradicação da varíola nos anos 1970. A partir dos anos 1980, os complexos desafios representados pelo HIV/Aids puseram em questão o papel de líder da OMS na governança de saúde global. A fracassada iniciativa 3 por 5 da organização, que se destinava a fornecer aos 3 milhões de pessoas que vivem com HIV /Aids em países de baixa e média renda drogas antirretrovirais que prolongam a vida até o final de 2005, foi um revés em seus esforços para exercer um papel importante na luta contra os prementes problemas de saúde global.

Não é por acaso que a diretora da OMS, Margaret Chan, não foi uma das "vozes proeminentes" na Conferência Internacional da Aids 2012 em Washington no mês passado, apesar de a OMS ter iniciado a conferência com maior participação do mundo sobre HIV/Aids 17 anos atrás.

No século 21, enquanto o aumento das doenças não transmissíveis expande a discrepância entre o objetivo da organização e sua capacidade, a OMS acha difícil adaptar-se a um mundo que está concentrado em "resultados" e "valor pelo dinheiro". Enquanto seu orçamento e influência se desgastam em um tempo de austeridade, a OMS é obscurecida por outras organizações e iniciativas de saúde como o Banco Mundial, que tem um poder financeiro substancial, e a Fundação Gates, cujo orçamento de saúde global é cerca de duas vezes o orçamento da OMS.

Mas a OMS é a organização que facilita o acesso a medicamentos para HIV/Aids, malária e tuberculose. Ela mobilizou uma rede de alerta e reação contra o surto de SARS em 2003 e usou seu poder de fazer tratados para negociar a Convenção Básica sobre Controle de Tabaco, um dos tratados mais amplamente e rapidamente ratificados na ONU. Qualquer esforço de reforma da OMS deve refletir suas vantagens.

Durante a epidemia de gripe H1N1 em 2009, o mundo em desenvolvimento não buscou no Banco Mundial informação sobre como reagir à disseminação do vírus desconhecido, nem procurou a Fundação Gates para coordenar a distribuição de vacinas limitadas. No rastro da epidemia de gripe suína, foi a OMS que patrocinou o acordo fundamental para abrir caminho para o compartilhamento de vírus e acesso a vacinas para a Indonésia e o resto do mundo em desenvolvimento. Quer se goste ou não, a OMS ainda é o principal órgão de referência para apoio no tratamento de ameaças de saúde globais. Parafraseando Voltaire, se a OMS não existisse, seria preciso inventá-la.

Infelizmente, a OMS está subfinanciada e superutilizada, o que limita sua capacidade de reagir efetivamente às ameaças de saúde. Nas últimas duas décadas, a organização teve um crescimento nominal zero em contribuições de seus países membros. A organização tem de contar com contribuições voluntárias. Hoje, 75% de suas verbas vêm de contribuições voluntárias, que geralmente são reservadas para doenças, setores ou regiões específicos. A falta de financiamento previsível, flexível e sustentável comprometeu seriamente sua capacidade de cumprir suas funções básicas.

Em maio de 2001, quando os EUA "ganharam" uma redução em suas contribuições orçamentárias à OMS de 25% para 22%, outros países membros, notadamente China, Cuba e Paquistão, protestaram, dizendo que isso aumentaria o peso para os países em desenvolvimento. Enquanto é crucial para a OMS seguir uma agenda de reformas que seja mais assertiva em natureza e intenção, é imperativo reforçar seu orçamento para se beneficiar de potências emergentes cuja ascensão econômica permite que façam maiores contribuições financeiras.

Yanzhong Huang é membro sênior de Saúde Global no Conselho de Relações Exteriores e professor associado na Escola de Diplomacia e Relações Internacionais John C. Whitehead da Universidade Seton Hall, em Nova Jersey. Envie comentários para intelligence@nytimes.com

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.