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Em meio à guerra, criminalidade dispara na Síria

ALEPPO, Síria - As consequências da guerra aqui já se tornaram familiares. Mas, no fundo, muitos sírios temem algo além: uma onda de criminalidade semelhante à que o Iraque viveu após a invasão das tropas americanas. Em toda a Síria, os combates basicamente devastaram o Estado civil. Moradores dizem que ladrões atacam os mais fracos e que os policiais fugiram das delegacias.

Sequestros ocorrem de forma desenfreada, como descobriu em julho o empresário Hur, 40. Ele se aproximava do seu carro para voltar para casa quando foi abordado por um homem que, cutucando suas costas com uma pistola, o mandou entrar no veículo.

"Pediram à minha família um resgate de 15 milhões de libras sírias [US$ 200 mil]", contou Hur.

Líderes rebeldes tentam preencher o vácuo, mas seu controle é limitado. Os sírios de Aleppo e outros lugares dizem que agora enterram suas joias e outros valores dentro da sua mobília. Moradores e empresários sírios estão pondo cadeados em seus bens para protegê-los contra oportunistas que se misturam aos combatentes.

"Ninguém quer sair das suas casas, porque você nunca sabe quem vai parar ou atacar você", disse uma moradora de Aleppo que, temerosa, se identificou apenas como Yasmin, 50.

Aleppo começou a mergulhar nessa aparente anarquia alguns meses atrás. Donos de fábricas neste que é o principal polo industrial sírio dizem que isso começou nas estradas dos arredores da cidade, onde bandidos armados pegavam o que queriam dos veículos. Um dos principais exportadores de automóveis da Síria recentemente contou a um amigo que passou a enviar veículos para o Iraque de barco, a partir do Líbano, por causa da insegurança nas rodovias.

No fim de março, pedidos de resgate já aconteciam diariamente em Aleppo, segundo Amal Hanano, uma escritora e analista síria radicada nos EUA. Geralmente, disse ela, os sequestradores pediam cerca de US$ 75 mil e após duras negociações reduziam o preço a um quinto.

Hur, que se identificou apenas com o apelido, por medo de ser novamente sequestrado, disse que seu irmão convenceu os bandidos a aceitarem o equivalente a cerca de US$ 30 mil. Levou uma semana, e ele diz ter passado a maior parte do tempo amarrado a um cano, nos fundos de uma lojinha, nos arredores de Aleppo.

Hamano e muitos ativistas dizem que a onda de criminalidade nas cidades sírias começou quando os distúrbios levaram à guerra. As batalhas causaram uma fuga coletiva, deixando as ruas vazias e facilitando os roubos.

Durante anos, o regime de Assad baseou seu controle em milícias privadas chamadas "shabiha", pagas pelo governo ou por seus ricos apoiadores. Esses pagamentos parecem ter cessado, segundo Hamano e outros, levando milicianos a pegarem como soldo qualquer coisa que conseguirem.

Uma entidade de direitos humanos, a Mulheres Sob Cerco, disse ter documentado quase cem casos de estupros na Síria desde o início do conflito, muitos deles envolvendo homens supostamente ligados às milícias pró-governo.

Mas os "shabiha" estão longe de serem o único problema. Comandantes rebeldes dizem que há "assaltos à luz do dia" nas filas de padarias sob seu controle -os ladrões pegam pães para vender no mercado negro. Rebeldes também já foram flagrados furtando carros e destruindo um restaurante de Aleppo.

Os criminosos estão se tornando mais experientes e atrevidos. Yasmin disse que um primo seu, de 65 anos, foi roubado às 13h30 no seu jardim. A família assistiu impotente aos ladrões levarem tudo que ele tinha, uns US$ 70. Agora, o irmão dela, que mora em frente, só sai de casa com os bolsos vazios.

"Nós todos nos tornamos mais cuidadosos desde aquele incidente", disse Yasmin. "Dá para imaginar? Não é seguro andar nem com US$ 70."

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