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Ocupado, ocupado, ocupado. Mas qual é a recompensa?

Nas economias mais frágeis da Europa -Irlanda, Espanha, Portugal e Grécia- os índices de desemprego continuam insistentemente altos, entre 15% e 25%. E, apesar de uma lenta e gradual recuperação, o desemprego nos EUA ainda está acima de 8%.

Mas para os afortunados que têm trabalho, especialmente os americanos, a principal queixa é que estão ocupados demais.

"Tornou-se a resposta padrão quando você pergunta a alguém como vai: 'Ocupado! Muito ocupado. Loucamente ocupado'", escreveu Tim Kreider no "Times". Toda essa atividade é autoimposta, diz ele; as pessoas trabalham muitas horas e lotam suas agendas fora do trabalho, depois empurram os filhos para participar de atividades extra-escolares e programas esportivos.

Kreider chama a si mesmo de "a pessoa ambiciosa mais preguiçosa que conheço" e diz que essa indolência lhe cai bem. O tempo ocioso permite as conexões inesperadas e a inspiração que o fazem realizar o verdadeiro trabalho, escreve ele, como o momento do "Eureka" de Arquimedes no banho ou da maçã de Newton.

Mas os americanos estão programados para manter suas rodas girando e por isso Kreider culpa os puritanos: "Os puritanos transformaram o trabalho em uma virtude, evidentemente esquecendo que Deus o inventou como um castigo".

As conclusões de uma série de experimentos que foram publicadas no ano passado no "Journal of Experimental Social Psychology" confirmaram essa ligação, quatro séculos depois que os austeros protestantes ingleses chegaram às praias do Novo Mundo, escreveu Matthew Hutson no "Times".

Uma pesquisa com estudantes americanos e canadenses que decifraram quebra-cabeças envolvendo anagramas descobriram que os americanos solucionavam mais quando pensavam na salvação. "Eles se esforçavam mais", escreveu Hutson.

Seu estado de espírito segue os ensinamentos de Martinho Lutero e Calvino, que acreditavam que o sucesso era um sinal de salvação e que o trabalho duro e as boas ações trariam recompensas na terra e na vida após a morte.

"As atitudes protestantes sobre o trabalho podem influenciar como os americanos tratam seus colegas de trabalho", escreveu Hutson. "Os protestantes -mas não os católicos- tornam-se menos sensíveis às emoções dos outros quando lembrados do trabalho, possivelmente indicando uma tendência a julgar a confraternização como improdutiva e antiprofissional."

Mas a realidade é que, apesar de os americanos tenderem a admirar as pessoas que têm uma forte ética do trabalho, muitos são ambivalentes sobre o trabalho, e sua principal motivação para manter um emprego é o salário que paga as contas.

"A maioria das pessoas inevitavelmente vê o trabalho como um meio", escreveu Gary Gutting no "Times". "É um modo de ganhar a vida, mas não uma vida."

A função do trabalho, diz Gutting, citando Aristóteles, "é ter lazer, do qual depende a felicidade". O segredo para gastar bem esse tempo de lazer, ainda segundo Aristóteles, "é a atividade produtiva por si mesma".

Cabe a nós escolher a maneira de cumprir esse objetivo: chutando uma bola, balançando em uma rede ou desenhando.

"A questão é que se envolver nessas atividades -e compartilhá-las com outros- é o que faz uma boa vida", escreveu Gutting. "O lazer e não o trabalho, deve ser nosso objetivo principal."

Kreider, que percebe futilidade nas atividades com que as pessoas enchem suas vidas, provavelmente concordaria.

"Ser atarefado serve como um tipo de tranquilizador existencial, uma proteção contra o vazio; obviamente sua vida não pode ser tola ou trivial ou insignificante quando se é tão ocupado", escreve ele. "Não posso deixar de me perguntar se toda essa exaustão cômica não é uma maneira de encobrir o fato de que a maior parte do que fazemos não tem importância."

TOM BRADY

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