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Inteligência

SIMÓN ALBERTO CONSALVI

O poder de Chávez na Venezuela

Se Hugo Chávez viver até 2018, ele terá governado a Venezuela durante um período mais longo do que qualquer outro chefe de Estado do último século, incluindo o ditador Juan Vicente Gómez, que governou o país de 1908 a 1935 (embora estivesse fora do cargo em uma parte desse período, Gómez ainda exercia o poder). Ninguém esperava por isso quando Chávez ganhou sua primeira eleição, em 1998.

Chávez conseguiu capturar a Presidência porque, depois de 40 anos, os partidos políticos democráticos estavam em declínio, os preços do petróleo haviam baixado, os problemas dos pobres eram ignorados, a liderança política estava dividida e companhias de mídia privadas trabalhavam para desgastar a democracia.

Naquela época, Chávez recebeu o apoio da mídia e das classes superiores. Estas nunca imaginaram o que ele faria.

O próprio Chávez não sabia que estabeleceria um governo radical, aboliria a propriedade privada e criaria uma parceria ideológica com Cuba. É isso que incomoda muita gente que o apoiou em 1998.

Os venezuelanos votaram em um Chávez diferente, não no líder autocrático que hoje controla a maior parte do país.

Nos últimos 13 anos, o preço do petróleo esteve persistentemente alto -cerca de US$ 100 o barril-, além disso, a Venezuela tem reservas que estão entre as maiores do mundo. Chávez aprofundou a dependência do país no petróleo, que representa cerca de 95% da receita de exportações, contra 67% pouco antes de ele assumir o cargo.

Essa bonança permitiu que Chávez, sob a orientação de Fidel Castro, estabelecesse vários programas sociais, incluindo a venda de alimentos importados por preços abaixo do mercado e a distribuição de subsídios diretos em dinheiro.

Muitos venezuelanos deixaram de trabalhar depois de receber esses benefícios.

Um programa habitacional atraiu milhares de candidatos, que receberam um "vale casa", mas não a casa. Até agora, o programa falhou e os refugiados ocuparam ministérios, hotéis e outros edifícios. Parte do problema é que não há materiais de construção porque o governo desapropriou as fábricas de cimento, assim como a fundição Sidor, propriedade de argentinos. Apesar desses programas sociais, os pobres continuam mais pobres e poucos têm empregos regulares.

O controle estatal da mídia, que efetuou uma campanha de propaganda maciça que mostrou um alegre país em que o líder está sempre em contato com a população, reforçou o sucesso de Chávez. As empresas de mídia independentes são fracas e enfrentam ameaças do governo.

A reeleição de Chávez contra Henrique Capriles em 7 de outubro, com 55% dos votos, não foi uma disputa justa.

Além do "ventajismo" (o uso da mídia estatal e de recursos públicos para promover o presidente), houve sérias questões sobre a própria votação.

Chávez controla o Conselho Nacional Eleitoral e todos os outros órgãos federais. Só os venezuelanos podem compreender plenamente o poder do governo sobre o processo eleitoral e o vasto uso de recursos do Estado em favor do candidato oficial.

A outra realidade é a falta de um adversário viável a Chávez. A oposição se uniu ao redor do governador Capriles, mas tinha poucos recursos para lutar contra o poder do Estado. Existem muitos partidos políticos no país, mas eles têm pouca influência.

Apesar disso tudo, cerca de 6,5 milhões de venezuelanos desafiaram o regime e mostraram que a democracia está viva no país, mesmo que ele esteja sitiado.

Um fenômeno como Chávez não poderia ocorrer em outros países latino-americanos, onde há controles e existe certa diversificação da economia. Mas os dias em que a Venezuela teve esse sistema foram na última metade do século 20, quando um líder como Chávez seria inimaginável.

A Venezuela tem uma longa tradição de caudilhos, os homens fortes latino-americanos, e essa história ajuda a explicar a ascensão de Chávez.

Ele acredita ser o herdeiro de Simón Bolívar, o primeiro caudilho e fundador da Venezuela, e tenta imitá-lo repetindo constantemente suas palavras, embora manipule a realidade conforme necessário. Por exemplo, ele diz que Bolívar, que foi na verdade um conservador, montou um sistema que foi o "precursor do socialismo".

Chávez está preso em um labirinto de sua própria criação. Enquanto ele avança para estabelecer o "socialismo do século 21", que é simplesmente a nacionalização de toda a economia, e a condena a depender do Estado, seu fracasso é inevitável.

Imagine um cenário em que o preço do petróleo caia para US$ 60 ou US$ 70 o barril. O castelo de cartas construído por Chávez desmoronaria. Nunca em sua história a Venezuela dependeu tanto do petróleo.

Chávez destruiu a agricultura do país e, se o preço do petróleo cair, não haverá alternativa.

O fenômeno conhecido como Hugo Chávez só será mantido vivo enquanto seu parceiro puder dançar.

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