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Austeridade faz Portugal entrar na onda de manifestações

Por RAPHAEL MINDER

LISBOA - Há muito tempo, Portugal é considerado um modelo na terrível crise da zona do euro. Em troca do resgate internacional, seu governo cortou serviços e aumentou impostos enquanto os cidadãos pacientemente suportaram a situação sem a reação popular vista em outros locais no sul da Europa. Isto é, até agora.

De repente, os portugueses também se somaram às fileiras cada vez maiores dos descontentes na Europa, seguindo a Grécia e a Espanha, depois que o governo tentou instituir mais uma medida de austeridade em setembro. Para muitos portugueses foi demais. Dezenas de milhares de pessoas foram às ruas no maior protesto contra a crise em Portugal.

Enquanto Pedro Passos Coelho, o primeiro-ministro português de centro-direita, se preparava para anunciar um novo orçamento em 15 de outubro -recheado de aumentos de impostos ainda mais acentuados e cortes de empregos no setor público-, ele enfrentou o tipo de reação que até recentemente não se via na paisagem política e social portuguesa.

Os manifestantes se reuniram diante do prédio do Parlamento em Lisboa para ouvir o anúncio do orçamento. Os poderosos sindicatos portugueses preparam uma greve geral para 14 de novembro.

"Está claro que a quantidade de boa fé de que o governo desfrutava se transformou em grande ceticismo e desconfiança", disse Pedro C. Magalhães, professor de política na Universidade de Lisboa.

Para um governo que seguiu as prescrições de seus credores internacionais e apertou o cinto, foi um duro despertar para os riscos da austeridade, que tensionou a coalizão governante entre os Social-Democratas de Passos Coelho e o rival Partido Popular.

O ponto de virada foi em setembro, quando Passos Coelho ofereceu um plano para redistribuir os fundos da previdência social, cortando as taxas de previdência dos empregadores enquanto aumentava significativamente a dos empregados. Embora a medida se destinasse a reduzir os custos trabalhistas, a reação dos trabalhadores foi tão feroz que ele foi obrigado a recuar.

Esse passo em falso é considerado responsável por abalar a coesão social e política que sustentava o doloroso, mas constante, progresso de Portugal.

"Estamos em um ponto baixo em nosso relacionamento porque o governo prejudicou seriamente sua credibilidade ao não tirar o pulso da economia real antes de apresentar novas medidas", disse João Vieira Lopes, presidente da Confederação Portuguesa de Comércio e Serviços, que representa cerca de 200 mil empresas.

Vieira Lopes sugere que o problema é que o programa de resgate dos credores internacionais de Portugal não levou em conta as especificidades do país.

"Portugal não é cheio de grandes companhias que podem se adaptar a um declínio no mercado doméstico", disse, "mas sim de pequenas e médias empresas cuja única opção é fechar."

Muitas lojas em Lisboa estão fechadas ou anunciam grandes descontos, e o desemprego atingiu o recorde de 15%. As receitas caíram 2,2% nos primeiros oito meses de 2012, enquanto os aumentos de impostos sufocam a economia.

Em outubro, o Fundo Monetário Internacional previu que Portugal continuará em recessão no ano que vem, com uma economia destinada a se contrair 3% neste ano e mais 1% em 2013.

As consequências da inversão na previdência podem ser longas, adverte António Vitorino, ex-ministro socialista e comissário europeu. "Esse erro político pode ter consequências permanentes ao atingir uma sociedade que já está cansada da austeridade."

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