Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

O coração da Itália, sob direção indiana

Por ELISABETTA POVOLEDO
PESSINACREMONESE, Itália
- Juntamente com sobrenomes locais comuns nos catálogos telefônicos da província de Cremona, como Ferrariou Galli, há um nome cada vez mais presente: Singh.
Nos últimos 20 anos, imigrantes indianos do Punjab têm se assentado no coração agrícola da Itália para trabalhar basicamente em fazendas, muitas vezes como bergamini, como são chamados no dialeto nativo os trabalhadores em pecuária de leite.
Já se disse que se os trabalhadores indianos entrassem em greve a produção de Grana Padano, o queijo duro e granulado pelo qual
é conhecido este trecho do Vale do Pó, seria interrompida.
"Não sei se a produção pararia, mas isso certamente criaria muitas dificuldades", disse Simone Solfanelli, presidente da seção de
Cremona da Coldiretti, a maior organização agrícola da Itália. "Posso lhe dizer que eles são indispensáveis nas fazendas", e na produção de leite na província cerca de um décimo de todo o leite produzido na Itália.
Os indianos, que na maioria são sikhs (uma corrente religiosa-filosófica indiana), chegaram pela primeira vez à região exatamente quando uma geração de trabalhadores na pecuária de leite se aposentava, sem substitutos à vista.
"Eles salvaram uma economia que teria falido porque os jovens não queriam trabalhar com vacas", disse Dalido Malaggi, prefeito de Pessina Cremonese.
O trabalho é dividido em dois turnos de quatro horas por dia, com cerca de 12 horas de intervalo.
"Os jovens italianos não querem trabalhar nesse tipo de horário", disse Malaggi. Muitos imigrantes já sabiam o que era necessário para manter uma fazenda em funcionamento.
"Esta é uma terra de laticínios, e muitos de nós temos vacas em Punjab", disse Jaswinder Duhra, que vive na Itália há 25 anos e trabalhou para um dos principais fabricantes de queijos italianos."Estamos acostumados como trabalho aqui."
Não há estatísticas oficiais sobre quantos indianos trabalham em fazendas de leite, mas Solfanelli disse que dos 3 mil trabalhadores agrícolas na província cerca de um terço são indianos.
Uma medida de sua presença foi a inauguração em agosto do templo sikh Gurduwara Sri Guru Kalgidhar Sahib, destinado a conter 600 pessoas. Ele é considerado o maior templo sikh na Europa.
Dilbagh Singh chegou à Itália aos 14anos e agora, 12 anos depois, fala com o sotaque de sua cidade adotiva, Nogara. Ele disse que seus compatriotas "vieram para trabalhar e querem paz".
Com esse fim, Singh dirige um site na web sobre os sikhs na Itália, para que "os italianos possam nos compreender".
Cerca de 16 mil imigrantes indianos são empregados legalmente na agricultura na Itália, e a região do Lácio se tornou o mais novo polo de imigração para trabalhadores temporários.
"Basta você viajar 100 quilômetros a partir de Roma para descobrir um mundo que a maioria das pessoas nem sequer sabe que
existe", disse Patrizia Santangelo, uma cineasta cujo documentário, "Visit India", é sobre a comunidade sikh na província de Latina.
O filme mostra a exploração a que são submetidos muitos trabalhadores imigrantes.
"Muitas vezes eles vivem em acampamentos como sem-tetos, e podem receber salários baixos, de 2 a 4 euros por hora, por períodos de 12 horas", ela disse. "Mas o que me marcou é que, apesar de viverem em condições difíceis, os indianos conseguem ver o lado positivo das situações."
Muitos imigrantes indianos tornaram-se cidadãos italianos. Eles compraram casas e assentaram suas famílias aqui. Muitos também criaram filhos na Itália, que imaginam um futuro diferente.
"Eles dão duro na escola, não são mimados como nossos filhos", disse Gianluigi Fiamenghi, que emprega sete trabalhadores indianos em sua fazenda de leite, com 1.700 vacas. "E seus filhos não querem trabalhar em fazendas, eles vão para a universidade e querem progredir."
Um dos trabalhadores de Fiamenghi, Prem Singh, mudou-se para a Itália em 1995. Ele e sua esposa criam três filhos que hoje
estão na escola primária. "Eles se sentem mais italianos que indianos", diz o pai, acrescentando que não pretende voltar para
sua terra natal. "Nós fincamos raízes aqui. Agora aqui é a nossa casa, de verdade."

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.