São Paulo, segunda-feira, 01 de fevereiro de 2010

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ENSAIO

BENEDICT CAREY


Onde foi parar o tempo? Ele fugiu da mente

O tempo pode passar marchando, ou se esvaindo, ou avançando sorrateiramente. Mas às vezes parece ter fugido às pressas como um convidado irritado, deixando conversas inacabadas, relacionamentos sem resolver, metas inalcançadas.
"Se pensamos sobre nossas metas e se elas pouco avançaram [rumo à concretização], de repente nos parece que foi ontem que nós as definimos", disse Gal Zauberman, professor associado de marketing na Escola Wharton de Administração, na Pensilvânia. Mas a sensação da passagem do tempo pode ser diferente, disse, "dependendo do que você pensa: sobre o quê pensa, e como".
Na verdade, não se sabe ao certo como o cérebro marca o tempo. Segundo uma teoria, o cérebro teria um grupo de células especializadas em contar intervalos de tempo. Outra reza que uma larga gama de processos neurais atua como relógio interno.
De uma forma ou outra, constatam estudos, esse cronômetro biológico não faz um trabalho muito exato quando se trata de intervalos mais longos. O tempo parece demorar muito mais a passar em uma tarde ociosa e a passar correndo quando o cérebro está ocupado com um trabalho complexo.
E eventos emocionais -um rompimento, uma viagem transformadora- tendem a ser sentidos como mais recentes do que realmente foram. Em suma, dizem alguns psicólogos, as descobertas substanciam a observação do filósofo Martin Heidegger de que o tempo "persiste meramente como consequência dos eventos que nele ocorrem". Agora, pesquisadores estão descobrindo que o inverso também pode ser verdade: se muito poucos eventos vêm à mente, a percepção do tempo não persiste; o cérebro comprime o intervalo que se passou.
Em estudo publicado no periódico "Psychological Science", Zauberman liderou uma equipe que testou as memórias de estudantes universitários sobre uma série de fatos que foram notícia, incluindo a nomeação de Ben Bernanke para presidente do Fed (o Banco Central dos EUA), ocorrida 33 meses antes do estudo, e a decisão da cantora Britney Spears de raspar sua cabeça, ocorrida 20 meses antes. O estudo constatou que os estudantes subestimaram o tempo passado, em uma média de três meses.
A descoberta não surpreendeu por completo. Em um experimento clássico, o explorador francês Michael Siffre passou dois meses em uma caverna, sem contato com os ritmos do dia e da noite ou com relógios. Ele emergiu convencido de que passara só 25 dias isolado. Por conta própria, o cérebro tende a condensar o tempo.
Mas, descobriu o novo estudo, a maneira como o cérebro fixa o "timing" relativo dos fatos depende da memória. À medida que os participantes do estudo se recordavam dos fatos relacionados ao acontecimento original -a vida de Britney Spears, por exemplo, ou as intervenções de Bernanke na economia-, o acontecimento lhes parecia ter ocorrido havia mais tempo.
Os pesquisadores testaram memórias pessoais e memórias de clipes de filmes vistos em laboratório. O padrão se manteve: quanto mais fatos as pessoas se recordassem que tivessem ocorrido entre os acontecimentos originais e o momento presente, mais tempo atrás parecia ter passado o evento original.
Mas a pesquisa indica que o cérebro tem mais controle sobre sua própria percepção do tempo do que as pessoas talvez saibam. É precisamente porque elas agiram dentro de um plano ou com uma meta que lhes pareceu que o tempo tinha passado voando.
Contrastando com isso, novas pesquisas sugerem que focar, em lugar disso, em metas e desafios que foram de fato resolvidos durante o ano proporciona ao cérebro a oportunidade de preencher o ano que se passou com memórias e com tempo apreendido.


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