São Paulo, segunda-feira, 01 de agosto de 2011

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País em que o governo banca a fecundidade

Por DINA KRAFT
TEL AVIV, Israel - Judeus e árabes, héteros e homossexuais, laicos e religiosos, os pacientes que chegam diariamente ao Hospital Assuta, em Tel Aviv, estão unidos por uma só esperança: que a medicina lhes traga um bebê.
Israel é a capital mundial da fertilização in vitro (FIV), e o hospital, que realiza cerca de 7.000 procedimentos por ano, é uma das mais movimentadas clínicas de reprodução assistida do planeta.
Ao contrário de países onde os casais podem ir à falência tentando engravidar, Israel fornece de forma gratuita e ilimitada os procedimentos da FIV até que resultem em dois "bebês para levar para casa". Mulheres de até 45 anos podem se beneficiar.
Embora os procedimentos representem um dos maiores gastos do país com a saúde pública, essa parece ser uma das poucas questões com as quais quase todos os setores da sociedade israelense concordam.
Há um crescente número de solteiras fazendo FIV, e seus esforços são aprovados por rabinos.
"Uma coisa ímpar a respeito de Israel é que, por um lado, é uma cultura de alta tecnologia e, por outro, é muito tradicional", disse Sigal Gooldin, sociólogo da medicina da Universidade Hebraica. "Espera-se de qualquer um que viva aqui que tenha filhos."
Os israelenses já têm uma elevada taxa de fertilidade: uma média de 2,9 filhos por família. Além do imperativo bíblico de serem fecundos, alguns judeus israelenses se sentem motivados a repor seu contingente depois do Holocausto.
A demografia aqui também é política. Israel tem historicamente promovido a natalidade dos judeus como forma de manter uma maioria judaica no país e, mais recentemente, como um contrapeso à taxa maior de fertilidade dos palestinos nos territórios ocupados.
Cidadãos árabes de Israel, no entanto, têm os mesmos direitos a tratamentos de fertilização pagos pelo Estado.
Uma pesquisa publicada pela revista "Human Reproduction Update" em 2002 mostrou que Israel realizava 1.657 procedimentos de FIV por milhão de habitantes a cada ano, bem acima dos 899 na Islândia, o país com a segunda taxa mais elevada, e dos 126 nos EUA, que ficaram bem atrás de vários países europeus.
Um grande polo dessa "indústria dos bebês" é Assuta, que realiza cerca de um quarto das aproximadamente 28 mil FIVs anuais do país. No seu centro de fertilização, um laboratório com 60 mil embriões congelados fica entre uma sala de cirurgia, onde as mulheres têm seus óvulos aspirados, e uma sala de transferência, onde os embriões são implantados na paciente.
Essa atividade em franca expansão também proporciona vantagens para os médicos israelenses.
O grande número de pacientes com diversos problemas de fertilidade os ajuda a adaptar os tratamentos para obter maior sucesso, dizem eles.
E, como o custo não é um problema, há menos pressão para a implantação de vários embriões, prática que leva a um nascimento de múltiplos mais frequente do que o desejado.
O Ministério da Saúde diz gastar cerca de US$ 3.450 por tratamento, embora alguns críticos digam que o custo real pode ser maior.
Mira Huebner-Harel, consultora jurídica do Ministério da Saúde, disse que uma comissão estatal está avaliando a possibilidade de franquear os tratamentos a casais gays usando uma barriga "substituta".
Mas a política de incentivo à FIV tem seus críticos. Hedva Eyal, que trabalha na entidade feminista Isha L'Isha, diz que deveria haver mais discussão sobre o potencial impacto físico e emocional do tratamento, que inclui uma bateria de injeções hormonais.
Vered Letai-Sever, 32, fez oito tentativas no hospital Assuta até engravidar de Eitan, que nasceu há quatro meses e meio.
"Se vivêssemos em qualquer outro lugar, provavelmente nunca teríamos chegado aqui", disse ela, segurando o seu bebê.
"Há algo de profundamente humano nesta política, essa ideia de que a pessoa tem o direito de ser pai", acrescentou. "É algo que caracteriza a vida aqui: o valor depositado na vida."


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