São Paulo, segunda-feira, 02 de fevereiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Euro vai de mocinho a vilão em alguns países

Por LANDON THOMAS Jr.

ATENAS - “Os italianos, os espanhóis e os gregos vivíamos numa terra feliz, gastando o que não tínhamos”, diz George Economou, magnata grego da navegação, refletindo na sua ampla sala de reuniões sobre os problemas econômicos do seu e de outros países. “Era um mundo de fantasia.”
Para Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha, países na periferia da zona do euro, esse sonho de consumo infinito —alimentado por dívidas— virou o pior dos pesadelos, ameaçando qualquer um deles de ter de declarar moratória ou então abandonar a moeda única, adotada por 16 nações do continente.
A perspectiva é intimidadora. A adoção do euro, há pouco mais de uma década, deveria unir a Europa econômica e politicamente. Para o continente, a nova moeda simbolizava o potencial de um dia rivalizar com os EUA. Para os países mais pobres, ser admitido na zona do euro era motivo de orgulho, demonstrando que eles haviam domado os déficits públicos e botado ordem financeira na casa.
Agora, em meio à pior crise econômica desde o advento do euro, uma nova visão está emergindo —especialmente porque as notas de crédito de Grécia, Espanha e Portugal foram uma a uma sendo rebaixadas. O que se diz é que o bálsamo da adesão ao euro permitiu que esses países encobrissem sérios problemas econômicos que agora ressurgem rugindo.
“A adesão não é uma panaceia para os problemas sociais e econômicos de um país”, disse Simon Tilford, economista-chefe do Centro para a Reforma Europeia, em Londres.
“Na verdade, tem havido uma enorme divergência na competitividade, que se revela nos enormes desequilíbrios comerciais”, afirmou ele, comparando a Grécia a países mais ricos da zona do euro. “Embora a Grécia possa ter se isolado do risco de uma crise cambial, há também o risco de uma crise de crédito e de um colapso da confiança em sua solvência.”
Se por um lado dividir a moeda com algumas das economias mais poderosas do planeta ajudou os países mais pobres da Europa a participarem da fase de prosperidade, agora, nos tempos difíceis, as regras monetárias os impedem de fazer o que os países normalmente fazem para sobreviver a tempestades econômicas, o que inclui gastos gigantescos.
Alemanha, França e os países escandinavos podem montar pacotes multibilionários para estimular a economia e proteger seus bancos. Já os países periféricos estão ao deus-dará. Eles se veem diante de um terrível impasse: o crédito está disponível, só que a juros proibitivos; e novos empréstimos não só violam as exigências da Comissão Europeia como despertam dúvidas sobre a capacidade desses países em honrar seus compromissos.
Especuladores de títulos e câmbio demonstram a intenção de punir os países que tiverem perspectivas econômicas dúbias. A rentabilidade dos títulos de países periféricos onde há aumento de déficit está disparando. A libra esterlina despencou. A crescente disparidade entre as taxas de juros impostas à Grécia e a economias maiores, como a Alemanha, revela as primeiras fissuras no que era até agora uma Europa bastante forte.
A Standard & Poor’s também rebaixou a nota de crédito da Espanha por causa dos efeitos da sua crise imobiliária. Na Irlanda, a economia continua a sofrer com o colapso habitacional, e um defunto setor bancário tem em mãos dívidas vencidas que superam o valor do PIB nacional.
Mas os problemas da Grécia são provavelmente piores. O país tem sido alvo fácil para os justiceiros do mercado europeu de títulos e, para piorar, viveu recentemente uma onda de manifestações violentas. A mão onipotente do Estado grego gerou um déficit público superior a 90% da produção econômica do país. O incansável aumento do consumo criou um déficit em conta corrente de 14% do PIB, talvez o maior da Europa.
O economista Yannis Stournaras, consultor econômico do governo socialista anterior ao atual, zombou da possibilidade de que o país quebre de um jeito que foi comum na América Latina do passado. Tampouco aceitou a ideia de que a Grécia poderia abandonar o euro e tentar uma desvalorização para se recuperar.
“Moratória? Não, não, não”, disse ele. “Desde o começo do século 20 nunca tivemos problemas com os nossos pagamentos.” Mas há quem não descarte tal eventualidade, embora admita ser muito improvável. Um dos poucos políticos da Grécia que não evita esses temas é Stefanos Manos, que no começo da década de 1990, como ministro da Economia, lançou um radical programa de privatizações, afinal bem-sucedido. Ele fundou um novo partido e agora cogita voltar ao Parlamento.
“Precisamos de dinheiro para financiar os nossos déficits, e acho difícil atrairmos tal dinheiro no exterior. Não tenho certeza de que isso não vá escapar ao controle.”
Quanto ao resto da Europa, particularmente seus elos mais fracos, ele também tem dúvidas. “Não acho que a Europa esteja apta ao desafio”, afirmou. “Ela se ampliou rápido demais, sem consertar suas instituições.”


Texto Anterior: Nacionalização pode virar realidade
Próximo Texto: Lente: Fala de papagaio assinala avanços dos deficientes
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.