São Paulo, segunda-feira, 04 de outubro de 2010

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Drama de migrantes fere orgulho do povo sueco

Escandinávia esmaga sonhos dos bengaleses

Por JOHN TAGLIABUE
BRACKE, Suécia - Esta terra de abetos imponentes e lagos graciosos é famosa por suas frutas silvestres: mirtilos, amoras-alpinas, amoras-brancas-silvestres, groselhas, framboesas, morangos e muito mais.
O problema é que nenhum sueco quer apanhá-las, exceto, talvez, se for só um punhado para a sobremesa.
Por isso, há algumas décadas, as grandes empresas suecas que estão entre as maiores processadoras mundiais dessas frutas começaram a importar trabalhadores para a árdua tarefa de vasculhar bosques pedregosos e escalar montanhas para encontrar e colher as bagas.
A prática de trazer imigrantes -da China, Tailândia, do Vietnã e de Bangladesh -para a colheita do verão parecia funcionar bem, até poucos anos atrás.
Na primavera deste ano, uma frente fria dizimou a safra, assim punindo o setor e seus trabalhadores com um segundo ano consecutivo de colheitas ruins.
Após o desastre do ano passado, que fez muitos catadores voltarem para seus países endividados, as autoridades suecas exigiram que as empresas do setor paguem um salário mínimo de cerca de US$ 2.320 por temporada.
Mas, para burlar essa lei, as empresas contrataram catadores asiáticos por meio de companhias de recrutamento nos países de origem.
Para os suecos, que se orgulham de suas leis favoráveis aos trabalhadores, os catadores de frutas rapidamente se tornaram motivo de profundo constrangimento nacional, com as atenções voltadas particularmente para um grupo de 190 bengaleses que chegaram neste ano.
Eles foram contratados no seu país por uma empresa chamada Bangladesh Work Force, com a promessa de ganhar uma pequena fortuna colhendo frutas na Suécia.
Muitos bengaleses pagaram até 150 mil tecas (US$ 2.100) aos intermediários, num país onde um bom emprego rende cerca de US$ 42 mensais, segundo Mahmudur Rahman, 31, estudante de biotecnologia na Universidade de Uppsala (Suécia). Seu irmão e seu cunhado estavam entre os trabalhadores que chegaram na primavera deste ano.
Rahman disse que os trabalhadores receberam a promessa de ganhar quase US$ 10 mil em dois meses. Alguns contraíram empréstimos ou venderam bens para viajarem, contou. "Era um emprego de verão que deu errado", afirmou.
Com o final do verão, a maioria dos catadores voltou ao seu país, com a ajuda de grupos religiosos e da Cruz Vermelha.
Mas dúzias deles permanecem, abrigados em quatro casas sem mobília, onde dormem em colchões no chão. Arifur Rahaman, 32, deixou esposa e filho em Bangladesh para tentar a sorte. "Sem amora-alpina, sem dinheiro", disse.
O Nordic Food Group está entre os maiores processadores de frutas silvestres que existem na Escandinávia. Seu executivo Bertil Qvist disse que a imposição do salário mínimo deixou a empresa dependente de intermediários asiáticos, e que a culpa é desses agenciadores.
"As pessoas são convidadas a virem para cá com base em fundamentos falsos", afirmou. "Acham que vão colher bagas cultivadas, e não estão acostumadas ao ritmo de trabalho."
Os locais admitem que foi um ano ruim, mas dizem que os trabalhadores não foram alertados adequadamente sobre os riscos.
"É como ouro na floresta, diziam para eles, dinheiro rápido", afirmou Lars Riberth, pastor de uma igreja daqui, que angariou o equivalente a US$ 9.000 para ajudar o grupo. "É realmente um regime de escravidão."


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