São Paulo, segunda-feira, 09 de fevereiro de 2009

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CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Grãos de areia oferecem lições sobre os oceanos

Por CORNELIA DEAN

CORVALLIS, Oregon - Nos anos 1980, quando era um jovem geofísico, Rob Holman fez uma viagem de estudos a uma praia na Califórnia. Holman, que passara a infância longe do mar, no Canadá, fixou-se atentamente no oceano. Mas, quando olhou à sua volta, viu que os outros participantes do estudo estavam estudando a areia. Ele notou que "a areia não é igual em toda parte". Então começou a coletá-la e guardá-la em vidros.
Hoje Holman é um conhecido oceanógrafo costeiro na Universidade Oregon State, cujo sistema de fotografias computadorizadas, chamado Argus, proporcionou a pesquisadores novas maneiras de observar e medir praias. Ele ainda coleciona as amostras de areia -que já são mais de mil. Elas foram coletadas em suas viagens e por geólogos e amadores de todo o mundo (incluindo esta repórter), que lhe enviam grãos em envelopes.
Cada amostra é secada e rotulada segundo a latitude e longitude do local onde foi coletada, o que Holman determina a partir de dados às vezes incompletos fornecidos por seus colaboradores.
Há amostras de areia de todos os continentes, incluindo a Antártida.
Estudantes de geologia podem aprender muito com a coleção. "Esta fileira é um corte de norte ao sul ao longo da Costa Leste", disse Holman, apontando para tubos recolhidos entre Cape Cod e Key West, no nordeste e no sul dos EUA, respectivamente. "A areia vai ficando mais clara e mais fina." Isso acontece porque a areia não costuma ficar parada na praia.
Quando um grão de areia é depositado numa praia da Flórida, ele já foi fustigado pelas ondas por muito tempo. "A ação física de ser jogado continuamente de um lado a outro leva os grãos a se decomporem, fazendo seus cantos angulares se desfazerem", disse. "Os grãos ficam mais arredondados." E grãos de minerais relativamente densos já terão sido excluídos. O resultado é uma fileira de amostras que variam desde os grãos meio escuros e grosseiros do nordeste dos EUA até a areia fina e branca das praias do sudeste do país.
"Há muitas características que se podem analisar: a natureza e o formato da areia, de onde vêm os minerais, as diferenças no transporte e no envelhecimento", disse Holman. "Tudo isso afeta a areia que vemos na praia."
Holman desenvolveu o sistema Argus após 20 anos de pesquisas no Corpo de Engenheiros do Exército na costa de Duck, Carolina do Norte. Hoje há instalações da Argus também nos Estados de Oregon, Califórnia e Havaí e em Reino Unido, Holanda, Austrália, Nova Zelândia, Espanha, Itália e Brasil.
Os pesquisadores de Duck inserem instrumentos nas ondas para avaliar a topografia submarina da zona de quebra das ondas, especialmente da formação e movimentação dos bancos de areia. Entender os bancos de areia é crucial para o estudo da erosão das praias e da elevação do nível do mar relacionada ao clima, mas a zona da quebra de ondas é um ambiente conhecidamente hostil para a realização de pesquisas. Como questão prática, as medições feitas rotineiramente em Duck são impossíveis de serem obtidas em praticamente qualquer outro lugar.
Holman usou os dados obtidos em Duck e um filme de lapso de tempo (de uma câmera que montou numa torre da instalação do Corpo de Engenheiros) para calcular como correlacionar informações fotográficas com mudanças na topografia sob a zona de quebra das ondas.
Os resultados foram surpreendentes. Para começar, os bancos de areia não se movem segundo padrões simples, como pensavam muitos cientistas. "Aprendemos é que o processo é bem mais complicado do que pensávamos", disse Holman.
Com dados do Argus, cientistas podem acompanhar, quase em tempo real, os bancos de areia aparecendo, desaparecendo, descrevendo curvas, afastando-se, sendo rompidos e reagindo de outras maneiras sob as ondas que quebram. O sistema pode até ser usado para localizar em tempo real correntes fortes de água que retornam da praia ao mar.
S. Jeffress Williams, geólogo costeiro do instituto de Pesquisas Geológicas dos EUA, descreveu o sistema como "peça crucial de nova tecnologia". "O sistema Argus nos permite quantificar e documentar visualmente as mudanças que ocorrem ao longo da costa em diversos quadros de tempo diferentes."
Embora seja verdade que todas as praias "obedecem às mesmas regras", na medida em que o movimento dos ventos, da água, das ondas e da areia é sempre uma questão de F = ma (a força é igual à massa multiplicada pela aceleração), as praias apresentam comportamentos diferentes. "Esperamos entender o como e o porquê disso", disse Holman.


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