São Paulo, segunda-feira, 09 de fevereiro de 2009

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Remédio perde eficácia, e malária pode se espalhar

Por THOMAS FULLER

TASANH, Camboja - Os dramas do miserável Camboja são claramente visíveis na cidade de Tasanh: meninas se prostituindo, estradas de terra esburacadas e as onipresentes placas alertando sobre minas terrestres.
Mas o que não se vê a olho nu é um problema potencialmente mais grave, especialmente para o mundo exterior: o parasita que causa a forma mais letal da malária está apresentando, no país asiático, os primeiros sinais de resistência à melhor droga existente.
Tratamentos que usam a artemisinina, extraída de uma planta presente na medicina tradicional chinesa, têm sido elogiados nos últimos anos como sendo a maior esperança para a erradicação da malária na África, onde mais de 2.000 crianças morrem por dia devido a essa doença.
Mas uma série de estudos consolidou entre os pesquisadores o consenso de que a artemisinina está perdendo potência e que é necessário um esforço para impedir que a resistência a essa droga se espalhe do Camboja ao resto do mundo.
"Eis aí algo que não podemos simplesmente empurrar para debaixo do tapete", disse o americano Timothy Ziemer, diretor da Iniciativa do Presidente contra a Malária, um programa de US$ 1,2 bilhão criado pelo governo de George W. Bush há três anos, com a meta de reduzir pela metade as mortes pela doença nos países mais afetados.
Em dezembro, Ziemer se reuniu com autoridades tailandesas e cambojanas para avaliar o problema da resistência, que afeta as mesmas drogas usadas pelo programa americano na África. Especialistas lembram que, no passado, em várias ocasiões a fronteira Tailândia-Camboja já pareceu ser o berço de cepas da malária resistentes a medicamentos, a começar pela cloroquina na década de 1950.
Introduzida imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, a cloroquina era vista como uma cura milagrosa contra a malária falciparum, o tipo mais letal. Hoje, é considerada praticamente inútil em muitas partes do mundo, inclusive a África Subsaariana.
Tal resistência, porém, levou décadas para se espalhar pelo globo, de modo que as drogas à base de artemisinina ainda devem ser úteis durante muitos anos.
Para evitar a resistência contra a artemisinina, as autoridades globais tentam garantir que ela seja vendida apenas em combinação com outros medicamentos contra a malária que permanecem por mais tempo no organismo, o que elimina adicionalmente parasitas porventura resistentes à artemisinina.
"Isso poderia se espalhar em qualquer direção, e temos de garantir que não ocorra", disse Pascal Ringwald, coordenador de malária da Organização Mundial da Saúde. "Sabemos que ainda não está em Bangladesh e também não está na Índia." Os coquetéis à base de artemisinina agem rapidamente e aparentemente retardam a transmissão da doença, segundo o infectologista John MacArthur, da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, em Bancoc.
MacArthur e outros especialistas dizem que a resistência às drogas contra a malária é consequência natural da difusão dos medicamentos. "No caso da malária, é o darwinismo do parasita", disse. "Ele gosta de sobreviver."
Ainda assim, alguns pesquisadores continuam preocupados em não passar ao público uma mensagem errada sobre a eficácia das drogas à base de artemisinina.
"Esse não é o prenúncio da morte da artemisinina", disse Nicholas White, presidente de um programa conjunto de pesquisas sobre malária que envolve a Universidade de Oxford e a Universidade Mahidol, da Tailândia. "A droga ainda funciona no Camboja, mas talvez não tão bem quanto antes."
Porém, diante do histórico de fracassos dos medicamentos, parece existir um consenso sobre a solução: "Livrar-se da malária no Camboja", disse White. "Erradicá-la. Eliminá-la."


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