São Paulo, segunda-feira, 11 de julho de 2011

Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros

O enigma da carreira do italiano Rossini

Por ZACHARY WOOLFE

As teorias são muitas. Talvez Gioachino Rossini estivesse cansado. Ele pode ter ficado devastado com a morte de sua mãe, a quem amava muito. Talvez o problema tenha sido com sua saúde ou com as mudanças na arte e na política. Seus detratores insinuaram que ele teria simplesmente ficado rico e preguiçoso.
Só o que sabemos ao certo é que ele parou de produzir. Sua última ópera, a de número 39, "Guillaume Tell", terá apresentações raras no Festival Internacional de Música Caramoor, em Katonah, Nova York, em 9 e 15 de julho. Na estreia da obra, em 1829, Rossini tinha 37 anos e era o compositor mais celebrado do mundo, criador de comédias exuberantes como "O Barbeiro de Sevilha" e "La Cenerentola" e de tragédias sombrias como "La Donna del Lago" e "Otello".
Então, algo aconteceu. Rossini viveu por quase 40 anos depois de "Guillaume Tell", mas nunca mais compôs outra ópera. Ele nasceu em 1792 em Pesaro, na Itália. Seu pai ganhava dinheiro tocando trompete e trompa, e sua mãe era cantora aspirante. Rossini demonstrou talento desde os 18 anos. Seu primeiro sucesso foi "La Cambiale di Matrimonio".
Na Itália do início do século 19, as novas obras de sucesso entravam para o repertório em pouco tempo, e Rossini produziu várias obras novas a cada ano. Quando "O Barbeiro de Sevilha" fez sua estreia tumultuada em Roma, em 1816, ele já era uma celebridade. Suas óperas mais soturnas fizeram sucesso, especialmente em Paris, para onde se mudou em 1824. Em 1829, fechou um contrato em Paris para uma série de óperas novas e conseguiu pensão vitalícia.
Na estreia de "Guillaume Tell", três meses depois, o público reagiu apenas com cortesia, e Rossini deixou Paris menos de dez dias depois. Pensou-se por muito tempo que sua saída abrupta e, por extensão, sua aposentadoria, teriam se devido ao mal-estar que o fracasso de "Guillaume Tell" lhe teria causado. Mas as críticas da ópera foram altamente positivas.
Apesar do caráter reservado, Rossini enviou sinais de suas intenções. Em 1828, um jornal já pôde escrever com confiança: "Rossini prometeu compor uma obra, 'Guillaume Tell', mas afirmou que não vai além dessa promessa".
Nessa época, os gostos operísticos da cidade estavam se deslocando em direção aos espetáculos épicos de Meyerbeer, que Rossini tachava, em tom de pouco caso, de "o grande". Era uma nova era.
Sua saúde deteriorada não ajudava. Como reação à morte de sua mãe em 1827, Rossini sofreu depressões até a década de 1850. Ele já sofria havia muito tempo de gonorreia, que parece ter se agravado. Em 1855, deixou a Itália, buscando uma cura na França. Em Paris, ele recuperou sua saúde. Promovia saraus musicais nas noites de sábado e, em 1857, já estava compondo outra vez. Ele morreu em 1868.
Quando Wagner o visitou em Paris, Rossini lhe disse que, no final dos anos 1820, estava exausto e que, quando retornara à Itália para descansar, descobrira que a qualidade do canto e das plateias tinha decaído. "São essas as razões", disse ele, "e houve outras também pelas quais julguei que eu tinha algo melhor a fazer, que era guardar silêncio."
Wagner refletiu mais tarde que Rossini poderia ter produzido, se tivesse "sentido a religião de sua arte dentro de si". Cento e cinquenta anos mais tarde, é um assombro que ainda compartilhamos.
"Quanto a mim", disse Rossini a Wagner, "eu fiz parte do meu tempo": reconhecimento comprovado tanto pelo surpreendente final de sua carreira quanto por sua música espantosa.


Texto Anterior: Um artista extrai toda a essência de uma pedra
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.