São Paulo, segunda-feira, 13 de abril de 2009

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ENSAIO

NATALIE ANGIER


A real dimensão dos problemas numéricos

Por mais sombrias que sejam as notícias econômicas, alguns cientistas veem um pequeno lado positvo na repentina aparição de números incrivelmente altos no noticiário. Já que o público está debatendo quantias normalmente expressas pela notação científica, dizem eles, por que não falar no que esses números realmente significam? Na verdade, eles promovem os benefícios gerais do raciocínio quantitativo e científico.
Uma excelente forma de começar a afiar tais habilidades são os chamados problemas de Fermi, batizados em alusão a Enrico Fermi, físico que se divertia lançando desafios mentais aos seus colegas nas horas vagas do desenvolvimento da bomba atômica. Eis como funciona: tomemos dúvidas como "Qual é o volume total de sangue humano no mundo?" ou "Se você enfileirar todos os quilômetros que os norte-americanos dirigem por ano, até onde viajaria no espaço?", e tentemos estimar a resposta.
Você procura alguma abertura no problema e sistematicamente o decompõe. O importante não é achar a cifra exata, e sim uma aproximação, algo que esteja na mesma ordem de magnitude (ou um fator de 10) da resposta correta. Se, por exemplo, você obtém como resposta 900, e a resposta certa é 200, você está bem; se chega a 9.000, ou 20, você volta e tenta descobrir onde se perdeu.
"É só decompor problemas aparentemente complicados em problemas mais simples", disse John Adam, professor de matemática da Universidade Old Dominion, no Estado da Virgínia (EUA).
Adam e seu colega Lawrence Weinstein, professor de física, oferecem uma ampla e muitas vezes divertida variedade de exercícios de Fermi no livro "Guesstimation: Solving the World's Problems on the Back of a Cocktail Napkin" ("Adivinhação-estimativa: resolvendo os problemas mundiais nas costas de um guardanapo de coquetel").
Façamos uma rápida estimativa da grande viagem americana, em sentido vertical. Quantos quilômetros os EUA cobrem por ano? Recentemente, ao trocar os pneus do meu carro, que tem cinco anos, o mecânico viu meu hodômetro com 48 mil quilômetros e riu educadamente. A maioria das pessoas dirige o dobro disso, disse ele. Ok, cerca de 19 mil quilômetros por ano.
E de quantos carros estamos falando -um para cada duas pessoas? Isso significa 150 milhões de carros, vezes 19 mil quilômetros, o que nos leva a cerca de 3 trilhões de quilômetros. Ou seja, bem além do nosso plutoide favorito, Plutão, a cerca de 5 bilhões de quilômetros da Terra. Nesse ritmo, em 12 anos chegaremos à estrela mais próxima.
Para Weinstein, é errado achar que não há necessidade de se estimar o que se pode procurar no Google. "Odeio lhe dizer isso, mas não se pode acreditar em tudo na web", disse ele. Além do mais, acrescentou, o hábito de mensurar o mundo "tira as pessoas de um modo de pensamento da crise".
Para melhorar ainda mais o talento quantitativo, Adam sugere traduzir cifras amorfas em termos familiares. Um milhão de segundos, por exemplo, são cerca de dez dias, enquanto 1 bilhão de segundos equivale a cerca de 32 anos. E há 1 trilhão de segundos, em cerca de 30.000 a.C., os últimos neanderthais estavam apostando o aluguel em um bilhete de loteria, sem levar em conta qual era a probabilidade de ganhar.


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