São Paulo, segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Quando sexo não rima com sucesso

Muitas mulheres de sucesso têm dificuldades amorosas

Por KATRIN BENNHOLD

Paris

Num episódio de "Sex and the City", Miranda vai a um evento de encontros-relâmpagos e desperdiça três das suas abordagens de oito minutos ao revelar que é uma advogada corporativa. Na quarta vez, ela diz ser comissária de bordo, e um médico a convida para sair.
O que torna o episódio eloquente não é só que Miranda minta sobre seu sucesso, mas que o parceiro dela também: ele, afinal, trabalhava numa loja de sapatos.
Será que o poder feminino está acabando com o romantismo?
A atração sexual no século 21, ao que parece, ainda se alimenta dos estereótipos do século 20. Só que as mulheres, ao se equipararem ou superarem os homens na educação e no mercado de trabalho, estão também virando de ponta-cabeça os papéis tradicionais dos gêneros, com profundas consequências para a dinâmica dos relacionamentos.
Há um crescente contingente de mulheres de sucesso na faixa dos 30 a 40 anos que têm dificuldades para encontrar um parceiro. Há mulheres-alfa que terminam com os homens-alfa, mas decidem colocar a carreira em segundo plano quando chegam os bebês. E há também um terceiro grupo, pequeno, mas crescente: o das mulheres que ganham mais que seus parceiros, gerando diversos contorcionismos comportamentais destinados a manter intacta a aparência tradicional dos papéis de cada gênero.
Anne-Laure Kiechel trabalha num banco de investimentos em Paris e ganha o equivalente a mais de cinco vezes o valor do salário do seu namorado, consultor de comunicações. Ela fica de olho nas finanças do casal e banca todas as grandes despesas invisíveis, como férias.
Mas, em público, ele insiste em sacar o cartão de crédito, para não parecer "um gigolô", como ele mesmo disse.
"Isso me faz rir", afirmou Kiechel. "Mas, se lhe agrada, tudo bem."
Timothy Eustis, ex-professor em Nova York, virou pai, dono de casa e consultor enológico ocasional ao se mudar para a França com a esposa Sarah, executiva da marca de lingerie Etam. Eles não têm problemas com o fato de ela sustentar a casa, mas ambos valorizam o que ele chama de "pequenas tradições" para manter acesa a fagulha do romantismo.
"Eu faço um esforço para segurar a porta, quase sempre dirijo o carro, e, quando é hora de pagar a conta, eu pago a conta", afirmou.
"Sarah deixa intencionalmente que eu faça essas coisas, pois acha que beneficia o relacionamento", disse Eustis.
Mas alguns homens têm dúvidas mais fundamentais. Uma executiva italiana de 38 anos queixou-se de que seu namorado sugeriu que ela mudasse de emprego por não se sentir mais capaz de "seduzi-la" desde que passou a ganhar mais que ele. Uma consultora francesa de gestão contou que seu marido, um professor, parou de frequentar festas com ela por se sentir inadequado quando lhe perguntavam o que fazia. Uma executiva alemã de banco disse que uma das razões para ter sido trocada por uma fisioterapeuta é que "ela teria mais tempo" para o ex-marido.
"É incrível como até mesmo homens liberais acabam tendo dificuldades ao estarem com mulheres obviamente mais bem sucedidas", disse Sasha Havlicek, 35, executiva-chefe de uma empresa de pesquisas em Londres. Uma amiga dela passou a se fingir de indefesa com seu parceiro para promover a masculinidade dele. "O ego masculino pode ser uma coisa mais frágil do que um ego feminino, que está acostumado a agressões regulares."
Anke Domscheit-Berg, da Microsoft da Alemanha, tem histórias de pretendentes que fugiram após ver o "diretora" (de comunicações) no cartão. Para ela, "sucesso não é sexy".
"Os homens não querem mulheres bem sucedidas, eles querem ser admirados", disse Gesine Haag, 43, ex-executiva da match.com na Alemanha. "É importante para eles que a mulher esteja cheia de energia à noite em vez de ficar brincando com o BlackBerry na cama."
O psicanalista Bernard Prieur diz que os homens que ganham menos que as parceiras sofrem inseguranças: "Eles se sentem social e pessoalmente vulneráveis. Socialmente, vão contra milênios de crenças e estereótipos que os veem como arrimo do lar. E o sucesso da parceira lhes dá sentimento de fracasso", disse Prieur, na edição de novembro da revista francesa "Marie Claire".
Mas será que as coisas estão mudando? Kiechel afirmou que seu namorado incentiva sua carreira e se gaba com os amigos sobre como é inteligente e trabalhadora. Haag e Domscheit-Berg ganham mais que seus maridos e contaram que gostam de ver a reação do garçom quando mandam entregar a conta às esposas.
Domscheit-Berg, que também atua na Rede Internacional de Desenvolvimento de Gestão das Mulheres Europeias, aconselhou às mulheres que ganham bem: deixe o carrão da empresa em casa no primeiro encontro; ache seu homem antes dos 30 anos -antes de ter sucesso demais. E vá atrás de homens que tiram sua confiança de outra coisa que não o dinheiro. "Quanto mais diferente for a atividade dele, melhor."

O FATOR
FEMININO

A série examina as mais recentes mudanças no poder feminino e o impacto sobre as sociedades, além de avaliar a influência das mulheres sobre o desenvolvimento no começo do século 21.
global.nytimes.com/femalefactor


Próximo Texto: Pela honra, matar é legítimo
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.