São Paulo, segunda-feira, 15 de junho de 2009

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Taleban perde apoio entre paquistaneses

Inicialmente bem recebida, a sharia ganhou rejeição

Por SABRINA TAVERNISE

ISLAMABAD, Paquistão - Um ano atrás, a população do Paquistão estava profundamente dividida em relação ao que fazer diante do crescimento da insurgência em seu território. Algumas pessoas viam os militantes do Taleban como filhos da terra e irmãos muçulmanos que apenas queriam aplicar a lei islâmica, e muitas se opunham à ação militar direta contra o movimento.
Mas a história avança rapidamente no Paquistão, e, após meses em que a TV exibiu atos de crueldade do Taleban, promessas descumpridas e ataques suicidas, há um senso crescente -que se manifesta na mídia, entre políticos e entre o público- de que muitos paquistaneses estão finalmente se voltando contra o Taleban.
A mudança de rumo ainda é hesitante e difícil de quantificar. Mas parece ser especialmente profunda entre os milhões de paquistaneses diretamente ameaçados pelo avanço do Taleban das áreas tribais para as regiões mais habitadas do país, como o vale do Swat. A indignação dessas pessoas com o Taleban já pesa mais que sua frustração com a campanha militar que destruiu suas casas e matou seus familiares.
"É o Taleban o responsável por nosso sofrimento", disse Fakir Muhammed, refugiado do Swat que saúda a campanha militar para expulsar os militantes.
O apoio à luta contra o Taleban pode representar uma virada para o Paquistão, cujas divisões em relação a sua militância islâmica em alguns momentos parecem pôr o próprio Estado em risco.
Analistas e políticos avisam, entretanto, que é uma oportunidade que pode desaparecer rapidamente se a liderança política do país não conseguir capturar líderes do Taleban, dar assistência a 3 milhões de paquistaneses deslocados e criar um governo operacional em áreas tradicionalmente ignoradas pelo Estado.
Numa fita de áudio divulgada em 3 de junho, Osama bin Laden citou especificamente os combates no Swat e nas áreas tribais do Paquistão, culpando o governo de Barack Obama pela campanha militar e por plantar "novas sementes para aumentar o ódio e a vingança contra a América".
Autoridades americanas sabem que crise de refugiados pode alimentar a militância. Segundo a Chancelaria paquistanesa, menos de um quarto dos US$ 543 milhões que a ONU pediu para socorrer os refugiados já chegou ao país.
Em 4 de junho, o enviado especial dos EUA ao país, Richard Holbrooke, visitou acampamentos de refugiados como parte de uma viagem de três dias para difundir a mensagem de que os EUA querem ajudar. Ele disse que a Casa Branca pediu US$ 200 milhões adicionais e observou que os EUA estão dando mais auxílio que todos os outros países juntos.
Mesmo assim, o sentimento antiamericano ainda é forte. Muitos paquistaneses atribuem seus problemas atuais aos EUA e à guerra no Afeganistão.
Por muito tempo, os paquistaneses apoiaram o Taleban, vendo-o como aliado, com o intuito de exercer influência sobre o vizinho Afeganistão. Diferentemente dos afegãos, eles nunca viveram sob o domínio do Taleban e demoraram a reconhecer os perigos desse domínio. Mas isso tem mudado. A experiência de muitos paquistaneses com o Taleban os desiludiu.
Ao longo de mais de um ano de combates, os militantes foram avançando no Swat, matando ou expulsando os moradores ricos e prometendo melhorar a vida dos pobres. Em fevereiro, os militares acordaram uma trégua que praticamente entregou o Swat ao Taleban e autorizou os insurgentes a impor a sharia (lei islâmica).
Iftikhar Ehmad, dono de uma loja de celulares em Mingora, cidade mais populosa do vale, explicou que a perspectiva da sharia foi vista como atraente porque a justiça no Swat era corrupta e ineficaz. Mas a sharia não foi a mudança benigna pela qual as pessoas ansiavam. "Não era sharia. Era comportamento bandido", disse Ehmad na cidade-acampamento montada na cidade de Swabi.
A vida diária tornou-se degradante. Uma mulher foi açoitada em público, e um vídeo que a mostrava contorcendo-se de dor e suplicando por piedade suscitou ultraje generalizado. Os chefes do Taleban exigiam doações de dinheiro da população. Escolas de meninas foram incendiadas.
Quando o Exército entrou no Swat, em maio, moradores locais conduziram soldados a túneis com armas e a esconderijos do Taleban em hotéis, contaram militares. "Seis meses atrás, essas pessoas não se dispunham a revelar nada", comentou um oficial militar. "Pouco a pouco, elas vêm se abrindo cada vez mais."


Colaborou Irfan Ashraf, em Swabi e Mardan, no Paquistão


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