São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

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LENTE

Xamãs e bruxas voltam a ganhar adeptos

Vivemos numa época em que consumidores frenéticos oram no altar do materialismo e dependem de engenhocas que cabem na palma da mão para fazer os truques antes reservados aos magos. Assim, a impressão é que deveria restar pouco espaço para as velhas crenças em magia, espíritos e tribos. De fato, tradições seculares freqüentemente são descartadas como se fossem sistemas operacionais de computadores em desuso.
Em alguns lugares do mundo, porém, os usos sobrenaturais dos antigos vêm ganhando nova relevância, especialmente na medida em que a fé nos usos modernos é erodida.
Na zona rural de Taiwan, acreditou-se durante séculos que os xamãs das aldeias, ou jitong, encarnavam espíritos e curavam os doentes. Mas, à medida que Taiwan foi se urbanizando e ficando menos pobre, os jitong perderam espaço.
Hoje um novo tipo de jitong vem se adaptando às necessidades dos moradores das cidades, relatou Jonathan Adams no "New York Times".
Esses novos xamãs trabalham em arranha-céus em vez de choupanas e oferecem sugestões "ainda com a ajuda de espíritos desencarnados, é claro" sobre problemas tão diversos quanto trabalho, dinheiro e casamento.
Chang Yin, uma xamã em Taipé que recebe o espírito de um monge budista beberrão do século 12, assegurou a Adams que "os deuses mudaram, acompanhando os tempos, e se mantêm a par das novas tendências".
Um profissional financeiro de 40 anos visitou Chang recentemente. "Nos EUA ou no Ocidente, as pessoas procuram psicólogos", disse ele a Adams. "O jitong exerce o mesmo papel."
A população da Estônia é das mais seculares do mundo, constatam pesquisas. Muitos estonianos rejeitam não apenas o cristianismo, mas também, como relatou Ellen Barry no "New York Times", o ateísmo que a dominação soviética lhes impôs. Hoje, porém, alguns deles estão reencontrando as religiões animistas pré-cristãs que celebram a natureza, as bruxas e os elfos das florestas.
"A Estônia está repleta de magia natural", disse a tradutora Mari-Liis Roos, 37, numa visita recente ao poço das b6ruxas de Tuhala, durante uma de suas ocasionais erupções de água e vapor.
Geólogos dizem que o poço transborda quando a pressão da água subterrânea aumenta além de determinado ponto, mas muitos estonianos preferem a explicação antiga: que as bruxas estão fazendo uma sauna vigorosa. Algumas pessoas atravessam o país para visitar o poço, de legendárias qualidades curativas.
Nas Américas, onde as culturas indígenas lutam há muito tempo para sobreviver, vêm surgindo maneiras inovadoras de homenagear o passado.
Em Porto Rico, um concurso de beleza anual destaca as tradições dos taíno, a tribo nativa da ilha. E, no Estado americano do Novo México, jovens navajos mantêm seu folclore tribal vivo por meio de uma forma de arte geralmente encontrada nos centros urbanos dos EUA: competições performáticas de poesia, chamadas "slam".
Mas quando o antigo encontra o moderno, as tensões são inevitáveis.
Enquanto se atira de cabeça no século 21, o Laos também, com freqüência, pisoteia a cultura de seu passado. Fundada há 700 anos, a cidade de Luang Prabang, encrave montanhoso de monges budistas trajando vestes laranjas, por pouco escapou desse destino. A cidade, nomeada patrimônio mundial em 1995, hoje vive uma invasão de turistas curiosos a respeito dos monges.
"O que vemos são verdadeiros safáris", disse Nithakong Somsanith, artista que trabalha para preservar as tradições laocianas. "Eles [turistas] olham os monges como se olhassem macacos ou búfalos. É um teatro."

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