São Paulo, segunda-feira, 16 de maio de 2011

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ENSAIO
ALINA TUGEND


Somos dependentes dos números

Números e classificações estão por toda parte. Aumentamos nosso número de seguidores no Twitter e de amigos no Facebook. Usamos notas de testes padronizados para avaliar professores e alunos. "Os números tornam tangível o intangível", disse o jornalista Jonah Lehrer, autor de "How We Decide" [como tomamos decisões]. "Eles dão a ilusão de controle."
Muitas pessoas que compram carros, por exemplo, ficam fixadas em quantos cavalos de força tem o motor, embora isso não importe, disse Lehrer. "Queremos quantificar tudo", ele continuou, "para basear uma decisão em fatos, em vez de perguntar se aquela variável importa."
Muitas vezes precisamos encontrar maneiras de medir e avaliar pessoas o mais objetivamente possível. O problema, porém, é quando confiamos impensadamente nesses números para nos dizer tudo, disse Sherry Turkle, diretora da Iniciativa sobre Tecnologia e Self do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
Os números tornam-se não apenas uma parte da maneira como julgamos e avaliamos, mas a única maneira.
"Uma das fantasias da classificação numérica é que você sabe como chegou lá", disse a professora Turkle, que é autora de "Alone Together: Why We Expect More From Technology and Less From Each Other" [sozinhos juntos: por que esperamos mais da tecnologia e menos uns dos outros]. "Mas o problema é quando os números são obtidos de maneira irracional ou desconhecida, e não entendemos como chegamos lá, então para que servem?"
Meu colega Michael Winerip escreveu recentemente um artigo sobre uma excelente professora colegial, com ótimas avaliações de desempenho. Mas uma fórmula usada pelo Departamento de Educação de Nova York colocou a professora em sétimo lugar entre seus colegas.
A fórmula usava 32 variáveis adicionadas a um modelo estatístico que "parece transparente, mas é obscuro como lama", escreveu Winerip. E, mesmo que compreendamos os números, eles nem sempre são úteis.
Robin Black, autora da coletânea de contos "If I Loved You, I Would Tell You This" [Se eu o amasse, contaria isto a você], escreveu em um blog como o temor sobre as diversas maneiras de medir o sucesso de seu livro superou o motivo principal pelo qual o escrevera. "Eu vou a um lugar onde tudo tem um número", ela me disse. "Quantos exemplares enviados, quantas resenhas, quantas vendas."
Na Amazon, os autores podem verificar quantos livros venderam e, usando mapas interativos, até saber quantas vendas ocorreram em cada cidade.
Antes, ela disse, "a cada domingo, você olharia os mais vendidos do jornal "The New York Times". Hoje, você se tortura 24 horas por dia".
E as estatísticas não dizem quase nada. As classificações da Amazon, por exemplo, podem variar enormemente com base na venda de muito poucos livros.
Todos esse números nos ajudam a perder de vista por que realmente estamos fazendo algo. Black, por exemplo, disse que seus livros eram principalmente sobre perda. "Recebi um carta de alguém que disse: 'Perdi minha filha e seu livro realmente me ajudou'", ela contou. "Isso é tão importante! Como medi-lo contra 500 seguidores no Twitter?"
Essa dependência dos números é até certo ponto geracional, disse Howard Gardner, professor de cognição na Escola Graduada de Educação de Harvard. "Para quase todo mundo com menos de 25 anos nos Estados Unidos, os únicos modelos são classificações quantificáveis", ele disse. Por isso, quando os alunos pesquisam um trabalho, muitas vezes procuram artigos ou trabalhos on-line que tenham o maior número de acessos.
"Está certo que o que tiver mais acessos ou mais editores deva ser melhor que alguém que passou a vida estudando Kant?", ele perguntou. A obsessão por números, disse Frankel, significa que não examinamos as intangíveis que não podem ser mensuradas, como sabedoria, julgamento e experiência.
Também perdemos o sentido de nós mesmos como qualquer coisa além de uma classificação e começamos a nos sentir mal se nossos números não se equiparam aos dos outros.
Em uma postagem em um blog, Lehrer escreveu: "O que mais me perturba é o desejo das pessoas (especialmente eu mesmo) de verificar esses números e aceitar essas medições como importante". Ele continuou: "É por isso que eu gostaria que houvesse plataforma social popular que não medisse nada". Seria "um alívio", afirmou. Aliás, 320 pessoas "curtiram" essa postagem.
Ou, como Black colocou: "Tenho de parar de me preocupar com números. Preciso recuperar a parte ambígua da minha própria inteligência".


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