São Paulo, segunda-feira, 16 de novembro de 2009

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Ensaio
Peter S. Goodman


A recessão acabou; as demissões, não

Os especialistas há muito tempo nos asseguram que a vida econômica é governada por um ciclo empresarial de retração e expansão, tão confiável quanto as estações do ano. Nesse contexto, o agravamento no desemprego é como uma nevasca no fim do inverno: por pior que seja, o calendário nos promete a primavera.
Mas, assim como a mudança climática alterou as estações, alguns economistas argumentam que o ciclo empresarial já não funciona como antes, deixando de repor os empregos que destrói e mantendo a economia americana vulnerável a uma escassez de trabalho potencialmente de longo prazo.
As ferramentas que usamos para avaliar o ciclo empresarial remontam à década de 1920, quando a economia era muito diferente. Nos EUA, a participação da indústria no nível geral de emprego declinou fortemente, dando lugar aos serviços. A automação e a globalização deram a administradores parcimoniosos várias maneiras de aumentar a produção sem contratar.
“É uma mudança na estrutura do ciclo empresarial”, argumenta Allen Sinai, economista-chefe global da empresa de pesquisas Decision Economics. “Parece haver uma nova tendência de substituir o trabalho. É permanente, enquanto houver alternativas como a terceirização e a robótica.”
É certo que as velhas leis da economia costumam castigar aqueles que se inclinam por argumentos relativos a mudanças na vida comercial.
Durante o boom tecnológico da década de 1990, alguns saudaram a “nova economia” que supostamente nos libertaria da tirania do ciclo econômico e explicaria como empresas que jamais ganharam um tostão poderiam valer mais do que marcas estabelecidas. Quando a aritmética voltou, a “nova economia” virou sinônimo de tolice.
Nesta década, enquanto os investidores inflavam os preços dos imóveis para níveis sem qualquer conexão com a renda, alguns economistas argumentavam que as expansões e quebras imobiliárias haviam se tornado inoperantes devido à inovação financeira. Todos sabemos no que deu.
Mas a nova reavaliação do ciclo empresarial já leva em conta dados de duas décadas. Quando a recessão deu lugar à expansão, em março de 1991, levou pelo menos um ano para que as contratações fossem retomadas. Quando a recessão seguinte terminou, em março de 2001, dois anos se passaram até que o emprego voltasse a crescer. Muitos economistas supõem que uma terceira recuperação sem empregos já começou, pois as empresas, nervosas com as prolongadas consequências da crise financeira e com as perspectivas pífias, ainda relutam em contratar.
Não é assim que deveria ser, ao menos na nossa visão tradicional do ciclo econômico. Quando a economia cresce, as empresas contratam agressivamente, já que aumentam a produção e vendem mais. Ao gastarem seus salários, os trabalhadores distribuem dólares pela economia, criando oportunidades empresariais que levam outras empresas a contratarem —um círculo virtuoso. Quando o crescimento diminui, as empresas dispensam pessoas.
Mas, para Sinai e seus colegas, nossa visão do ciclo empresarial é antiquada, por remontar a uma época em que a indústria empregava cerca de um terço da força de trabalho norte-americana, bem antes daquilo que hoje chamamos de economia global.
Em meados do século passado, um varejista de Chicago tinha de fazer encomendas a uma fábrica do meio-oeste dos EUA. Hoje, ele pode enviar seus pedidos a trabalhadores na China e em outros lugares. A tendência geral parece deixar muitas empresas norte-americanas menos inclinadas a contratar.
Nem todos concordam com tal visão. Economistas voltados para questões do trabalho, como Lawrence Mishel, do Instituto de Política Econômica, de Washington, argumenta que o ciclo empresarial funciona como sempre; o problema é que o crescimento econômico tem sido fraco nos últimos tempos. “Quando o crescimento voltar, os empregos voltarão”, disse Mishel.
Outros sugerem que o ciclo empresarial não mudou, e sim que nós desenvolvemos suposições irreais sobre a recompensa que deveria florescer nos bons tempos.
Kenneth Rogoff, economista de Harvard, acredita que a prolongada disfunção da crise financeira dará lugar a um fluxo mais saudável de dinheiro, que não se baseia nos juros excessivamente baixos para estimular a atividade econômica. Mais empresas irão tomar empréstimos e se expandir, e o desemprego irá se assentar.
Em outras palavras, a recessão ainda vira expansão, assim como a primavera se segue ao inverno, mas os meses quentes podem não ser tão generosos como no passado, quando o dinheiro fertilizava uma safra excepcional. De qualquer forma, é melhor os EUA se prepararem para colheitas mais magras.


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