São Paulo, segunda-feira, 18 de abril de 2011

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

ANÁLISE DO NOTICIÁRIO

Peso da dívida cria armadilha de crescimento fraco

Um plano de socorro que já falhou duas vezes na Europa

Por STEVEN ERLANGER

PARIS - Pela terceira vez em um ano, a União Europeia passa pelo mesmo ritual, o de socorrer outro país insolvente. Hoje, Portugal segue a Grécia e a Irlanda para o escritório do bem-estar social europeu, pedindo novos empréstimos sob a condição de cortar drasticamente seus gastos.
Até agora, os mercados aceitaram com calma a terceira crise financeira soberana sucessiva da Europa. Mas economistas estão bem mais alarmados, notadamente porque a fórmula de ajuda que os líderes europeus continuam aplicando aos países mais endividados não dá sinais de funcionar.
Grécia, Irlanda e agora quase certamente Portugal têm acesso a centenas de bilhões de dólares em ajuda europeia de emergência para ajudá-los a evitar a moratória da dívida. Mas ajudas são apenas mais empréstimos, e as taxas de juros que os países estão pagando, embora um pouco menores do que o mercado privado cobraria, ainda são terrivelmente altas. Sua pilha de dívida aumenta a cada dia.
O preço desses empréstimos foi condicionado a um corte de gastos dos governos muito mais drástico do que os líderes gostariam ou têm poder político para realizar por conta própria. E, para países que dependem de gastos do governo para gerar crescimento, as reduções rápidas de gastos significam uma estagnação econômica ou recessão sustentadas, tornando cada dólar de dívida muito mais difícil de pagar.
Os economistas chamam isso de "armadilha da dívida". Fugir da armadilha, geralmente, exige desvalorizar a moeda, o que não pode acontecer entre países que usam o euro como moeda comum, ou um forte crescimento econômico, o que nenhum dos três tem, ou um processo de falência, algo que os três evitam. E a isso deve-se acrescentar a probabilidade de que os três continuarão tendo governos instáveis até que encontrem uma saída, e a crise financeira europeia não tem final à vista.
"O que falta no debate sobre como os países podem restabelecer suas finanças a alguma espécie de sustentabilidade é o limite de quanto eles podem cortar em um período de austeridade", disse Simon Tilford, economista-chefe do Centro para a Reforma Europeia, em Londres.
"Existe um limite de quanto um governo pode cortar os gastos e sobreviver politicamente, a menos que haja uma luz no fim do túnel, um caminho de volta ao crescimento econômico."
O problema dos países mais fracos não é apenas a dívida soberana, mas também a falta de competitividade. Sem que os países restabeleçam a competitividade e vendam mais produtos no exterior, o que só pode ocorrer através de um processo de longo prazo de redução de salários e impostos para incentivar o investimento no setor privado, os economistas não são otimistas sobre as perspectivas de crescimento.
Os bancos de países abastados como Alemanha, França e Países Baixos, assim como da Grã-Bretanha, detêm muita dívida grega, portuguesa e irlandesa. E, se esses países não puderem pagar suas dívidas, terão de reescaloná-las, reduzi-las ou entrar em moratória, causando uma grande crise bancária no resto da Europa.
Essa admissão exigiria que os governos pedissem a seus contribuintes para recapitalizar os bancos, o que é exatamente o que os líderes políticos temem fazer.
"Temos uma crise bancária entremeada a uma crise da dívida soberana", disse Tilford. "A Europa precisa enfrentar ambas e precisa reconhecer que os setores bancários dos países credores -especialmente a Alemanha- não estão hoje em posição de tratar de reestruturação e moratória."
A decisão de Portugal de buscar o socorro da União Europeia dificilmente era inesperada, e já haviam sido reservados fundos para cobrir suas necessidades. Mas a decisão é um marcador sobre os custos políticos da austeridade.
Os esforços portugueses para conseguir um pequeno "empréstimo ponte" para conduzir o país até as eleições de junho falharam. Por isso, no dia 8 de abril, os ministros das Finanças europeus, na Hungria, disseram que iniciaram negociações, juntamente com o Fundo Monetário Internacional, com todos os partidos políticos para um pacote de socorro de aproximadamente 80 bilhões de euros para Portugal.
"Se a oposição assinar o pacote antes das eleições, os eleitores dirão: 'Vocês são os mesmos, aumentando impostos, fechando escolas'", disse Ricardo Costa, vice-editor do semanário Expresso. "Mas nosso principal problema é que não estamos crescendo o suficiente; na verdade não estamos crescendo nada", disse. "Se não crescermos, não sairemos desse problema em uma década."

Colaborou Stephen Castle, de Bruxelas



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