São Paulo, segunda-feira, 19 de outubro de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Recuperação civil afegã ainda está longe


Perigo impede agentes humanitários de deixar suas bases em Cabul

Por ELISABETH BUMILLER e MARK LANDLER

WASHINGTON — Ao mesmo tempo em que o presidente dos EUA, Barack Obama, lidera um debate acirrado sobre o envio ou não de mais tropas ao Afeganistão, funcionários do governo dizem que os EUA estão muito longe de alcançar as metas definidas por Obama de combater a corrupção crônica afegã, criar um governo e um sistema jurídico que funcionem e treinar uma força policial incompetente no país.
Entrevistas com funcionários seniores de Obama e das Forças Armadas americanas e relatórios recentes avaliando o progresso no Afeganistão indicam que, quase sete meses após o presidente ter anunciado um esforço civil intensificado para reforçar seu envio de 17 mil soldados americanos adicionais ao país, muitas instituições civis afegãs têm deteriorado tanto quanto a segurança local.
A situação atual no Afeganistão é tão perigosa, segundo relatos, que muitos funcionários humanitários não podem viajar para fora da capital, Cabul, para dar suporte técnico a agricultores.
O Judiciário é tão fraco que os afegãos estão recorrendo, com frequência crescente, a um sistema de tribunais do Taleban que opera na sombra, porque, nas palavras de um militar de alto escalão, “muitos afegãos da zona rural veem a justiça do Taleban como alguma coisa, pelo menos”.
Funcionários do governo dos EUA descrevem Obama como impaciente com o progresso civil feito até agora. “O presidente não está satisfeito com nada disto”, disse um funcionário sênior que pediu anonimato.
A contestada eleição afegã de 20 de agosto deixou clara a ineficácia do governo do presidente Hamid Karzai, disseram funcionários de Obama, e frustrou as medidas de reforma. A eleição foi tão manchada por indícios de fraude e irregularidades que nenhum vencedor emergiu claramente dela. O chefe da missão da ONU no Afeganistão, o norueguês Kai Eide, e o próprio Karzai admitiram que a eleição foi fraudada.
Mesmo antes do pleito, em janeiro, um relatório do Departamento de Defesa dos EUA concluiu que “a construção de um governo afegão competente e independente será um processo demorado que levará no mínimo algumas décadas”.
Funcionários de Obama atribuíram muitos dos reveses à eleição e disseram que um desfecho para o pleito os colocaria numa posição melhor para avançar com as reformas civis.
“[O progresso] sempre foi visto como algo difícil de fazer e extremamente vinculado à realização de uma eleição bem sucedida”, disse Bruce Riedel, membro sênior do Brookings Institution, organização de pesquisas em política pública com sede em Washington. O Brookings coordenou a revisão inicial feita pelo governo Obama da política para o Afeganistão, no semestre passado. “Em vez disso, tivemos um fiasco.” As dúvidas da Casa Branca sobre o mau funcionamento do governo afegão têm sido ofuscadas, até certo ponto, pelo debate público acirrado, nas últimas semanas, sobre a conveniência de se aumentar o número de soldados no país e a dimensão desse aumento.
Funcionários do governo disseram que houve avanços na educação e no acesso à saúde no Afeganistão. Fontes do Departamento de Estado também disseram estar perto de alcançar o alvo de ter 974 funcionários humanitários no país até o final do ano, como parte do que descreveram como “incremento” civil de Obama. “Desde o início, houve um consenso de que precisávamos agir rapidamente”, disse Jacob L. Lew, vice-secretário de Estado responsável pelo envio de funcionários civis. “Estamos muito satisfeitos com as pessoas que estamos enviando. Elas estão motivadas, estão preparadas e são corajosas.”
Mas Henry Crumpton, ex-alto funcionário da CIA e do Departamento de Estado e atual assessor informal do general Stanley McChrystal, que comanda as forças dos EUA no Afeganistão, descreveu o esforço como insuficiente.
“No momento, a maioria avassaladora dos assessores civis está em Cabul, e a grande maioria deles nunca saiu de seus próprios locais de base”, disse Crumpton, que esteve recentemente no Afeganistão. “Nosso sistema de levar a ajuda a quem precisa dela está parado. Muito pouco da ajuda que está disponível está chegando à população afegã.”


Colaboraram Mark Mazzetti, Thom Shanker e Peter Baker


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