São Paulo, segunda-feira, 19 de outubro de 2009

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Mark Leibovich
Ensaio

Agora a piada é sobre Obama

WASHINGTON — Barack Obama está perdendo apoio de sua base cômica de fim de noite na TV americana?
É provável que ele não tenha percebido ou não se importe. Afinal, está no meio de tantos supostos “momentos definitivos” em sua Presidência —uma decisão “definitiva” sobre o Afeganistão, a batalha legislativa “definitiva” sobre a saúde, entre outras coisas.
Mas talvez haja outro conjunto mais sutil de episódios “definitivos” sobre o presidente dos EUA sendo encenados nas comédias televisivas, que antes, em geral, foram espaços relativamente gentis com ele. As piadas sobre Obama estão ficando mais duras. Não são mais apenas sobre o cachorro Bo, as orelhas grandes, o boliche ruim e as cúpulas de cerveja.
Um episódio conspícuo (senão “definitivo”) ocorreu em 3 de outubro no programa cômico “Saturday Night Live”, em um esquete ambientado no Salão Oval da Casa Branca. O presidente (interpretado por Fred Armisen) estava defendendo seu histórico contra críticos que o haviam acusado de transformar os EUA “em algo que parece a União Soviética ou a Alemanha nazista”.
De modo algum, protestou o falso Obama. “Quando você examina meu histórico, fica muito claro o que fiz até agora”, disse. “Nada.”
O esquete continuou mostrando Obama/Armisen percorrendo uma lista de coisas que ele tinha prometido fazer —fechar a prisão de Guantánamo, reformular o sistema de saúde... Todas estavam marcadas “a fazer”. Desde o início, Obama foi elogiado como alguém que “consegue programas cômicos de fim de noite”, cujo humor irônico e autodepreciativo é bem adequado às sensibilidades do gênero. Ele foi o primeiro presidente a aparecer como convidado de Jay Leno e David Letterman, os mais populares apresentadores de programas desse tipo. “Você ignora a influência deles por seu próprio risco”, disse Dan Pfeiffer, vice-diretor de comunicações da Casa Branca. “Eles são importantes indicadores de para onde a narrativa vai seguir.”
Mas os indicadores recentes poderiam se mostrar proféticos. Houve uma proliferação de piadas que se alimentam de —ou são alimentadas por— uma antiga narrativa ressuscitada contra o presidente que remonta à campanha eleitoral do ano passado, quando John McCain e Hillary Clinton tentaram retratar Obama como um bom orador que realiza pouco.
Recentemente, o comediante Jon Stewart apresentou o tema “não fazer nada” do “Saturday Night Live” em seu programa noturno de notícias satíricas, “The Daily Show”. Ele começou como uma simples justaposição de videoclipes de Obama prometendo pôr fim à política militar de expulsar homossexuais. Continuou com clipes dos meses seguintes do secretário da Defesa, Robert Gates, e do assessor de Segurança Nacional, Jim Jones, dizendo que ainda não tinham conseguido reverter a política, citando o “prato cheio” de afazeres de Obama.
O que se seguiu foi Stewart desesperado com um homem que ele havia apoiado, implorando que o presidente fizesse algo. “Toda essa coisa que o senhor colocou no prato”, disse Stewart. “É [palavrão] hora de comer, irmão. É assim que se tiram as coisas do prato.”
Depois de gargalhadas e aplausos da plateia, Stewart lembrou a Obama que “o senhor é o presidente dos EUA”. Pareceu algo entre um apelo liberal à ação ou um grito por socorro.
Jeff Nussbaum, redator democrata de discursos e piadas, discorda de que programas cômicos na TV sejam um indicador importante de uma tendência cultural. “Para usar um termo econômico, é mais um indicador de desaceleração”, disse.
De modo geral, o grosso das piadas de fim de noite dirigidas ao presidente não é pessoal. “As piadas ainda são principalmente sobre coisas como os elogios da mídia a Obama, ou o que a oposição está dizendo sobre ele”, disse Bob Lichter, do Centro para Mídia e Assuntos Públicos da Universidade George Mason, que estuda os temas dos programas de humor desde 1988.
Lichter disse que, no mínimo, o esquete do “Saturday Night Live” ofereceu uma articulação cômica de uma mensagem potencialmente devastadora: “O perigo é que Obama seja definido pela inação e por não cumprir as expectativas”.


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