São Paulo, segunda-feira, 20 de abril de 2009

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Socorro a montadoras russas salva empregos, não carros

Por ANDREW E. KRAMER

TOLYATTI, Rússia — Se existe um país que realmente precisa de um czar do setor automobilístico, é a Rússia, o país do czares —e do Lada.
A fábrica em Tolyatti vem produzindo há quatro décadas a mesma versão do Lada, o carro popular quadrado presente em todo o antigo bloco oriental.
Conhecida como Avtovaz, é uma das montadoras menos eficientes do mundo. Cada operário produz em média oito carros por ano, comparado com 36 na linha de montagem da General Motors em Bowling Green, Kentucky (EUA), por exemplo.
Mesmo assim, o governo russo está dando à Avtovaz bilhões de dólares de ajuda incondicional. Não haverá demissões de executivos-chefes. Os contratos dos operários não serão renegociados. Não há exigências de que sejam produzidos carros de qualidade melhor, muito menos carros híbridos que consumam menos combustível. O socorro do setor automotivo, no estilo russo, visa sobretudo assegurar a paz nas ruas e não tanto reestruturar um setor, para o desconsolo de alguns críticos.
“O mal maior é excesso de proteção do governo”, disse o ex-primeiro-ministro russo Yegor T. Gaidar. “A fábrica vai criar tantos problemas para a economia russa quanto a GM criou para os EUA.”
As preocupações de Moscou vão muito além do setor automotivo. A base manufatureira do país, trôpega mesmo nos melhores dos tempos, vem sofrendo contração acelerada na recessão global. As demissões se espalham. O setor manufatureiro encolheu 13% apenas em fevereiro. E a insatisfação do operariado se intensifica em algumas das cidades fabris russas em que os problemas são maiores. Em 11 de março, 16 operários siderúrgicos russos iniciaram uma greve de fome para protestar contra diminuições de salários numa siderúrgica nos montes Urais.
Em Tolyatti, onde uma joint venture com a GM demitiu 400 pessoas em dezembro, a tropa de choque foi convocada para dispersar uma multidão enfurecida que se reunira no estacionamento da fábrica.
A tendência já é histórica na Rússia: no fim da era soviética, o encolhimento da base manufatureira contribuiu para a intranquilidade social. Para impedir isso de se repetir agora, autoridades do governo, numa reunião em Tolyatti, prometeram ajuda adicional à fábrica: R$ 1,5 bilhão emprestados sem juros por um ano, R$ 500 milhões em crédito de bancos estatais a juros favoráveis, e um compromisso dos bancos estatais de ajudar a Avtovaz a levantar outros R$ 5,7 bilhões.
“Além de produzir carros, a Avtovaz cumpre um papel social”, explicou o ex-vice-prefeito de Tolyatti, Vladimir Yagutyan. “Ela dá empregos às pessoas. Felizmente ou infelizmente, o Estado precisar dar apoio à Avtovaz. A estabilidade local depende disso.”
Segundo um comunicado da empresa, a fábrica da Avtovaz e seus fornecedores geram 2 milhões de empregos. A força de trabalho russa é de cerca de 75 milhões de pessoas. Muitos desses empregos são em cidades de dimensões pequenas e médias, a pouca distância de Moscou. O colapso do mercado automotivo aconteceu mais tarde na Rússia que nos EUA, mas pode ser ainda mais grave. A Rússia vinha sendo o mercado automotivo de crescimento mais acelerado no mundo —aumentou 35% em 2007. Agora, a perspectiva é de queda de entre 25% e 50% nas vendas de automóveis, segundo relatório da representação da PricewaterhouseCoopers em Moscou.
No fim do ano passado o governo russo habilmente afastou as dificuldades econômicas desse cinturão politicamente frágil da indústria automobilística, na região central da Rússia. Uma tarifa foi imposta sobre carros importados. A iniciativa suscitou protestos e repressão policial.
Agora o governo está reforçando uma política de zero demissões em Avtovaz, apesar da queda grande na demanda dos produtos da fábrica. E o governo está subsidiando financiamentos de carros, para estimular a demanda. Além disso, aprovou garantias de crédito do Estado para a fábrica.
Mesmo empregados obrigados a tirar férias coletivas não parecem estar preocupados com a possibilidade de demissão. “A fábrica é nossa ama seca”, disse o funcionário Denis Makarov. “Se a Avtovaz parar, uma cidade inteira ficará na rua. Todo o mundo entende isso.”


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