São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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LENTE

Carnaval carnívoro

Comer carne talvez esteja no nosso sangue. Os cientistas recentemente descobriram que já há 3,4 milhões de anos os ancestrais dos humanos podem ter usado pedras pesadas para dissecar animais, consumindo carne pelo menos 800 mil anos antes do que se pensava, segundo a revista "Nature".
E o apetite continua.
Mesmo em épocas de vacas magras, há uma enorme fome por carne sustentável. Talvez seja por causa da obsessão por controle num mundo cada vez mais globalizado, ou pela idealização de um passado primitivo (some-se a isso o medo da E. coli e do mal da vaca louca).
Mas, de repente, a carne está seguindo o caminho das verduras e legumes: ser local, e motivo de obsessão. Carnes "de boutique" -cortes selecionados, de pequenos produtores e pastos regionais- estão se popularizando.
Conforme o público se conscientiza de como a carne industrial é produzida, há uma demanda por carne de criadores que não enviam seus animais para grandes frigoríficos.
E nunca antes tanta carne especializada esteve tão disponível nos açougues e feiras livres, escreveu o "Times". "Obviamente, todo mundo está em meio a uma total obsessão pela carne", disse Tia Keenan, vendedora de queijos em Nova York.
Com a demanda por carne local e com a aparição de mais restaurantes especializados em miúdos de animais, a profissão de açougueiro está de volta, de um jeito glamoroso. O Japanese Premium Beef, inaugurado no ano passado em Nova York, vende carne da raça wagyu por US$ 110 o quilo, numa fachada que mais parece uma loja Prada.
Açougueiros de luxo como Tom Mylan, ex-Marlow & Daugthers (Brooklyn), estão ganhando status "cult" e atraindo seguidores. Eles abrem lojas em Nova York, Londres e San Francisco, e dão aulas: de US$ 75 para aprender a trinchar um porco de 40 quilos, até US$ 10 mil por seis a oito semanas de formação.
"É essa coisa do 'faça você mesmo'" que tem se infiltrado, disse ao "Times" David Kamp, autor de "The United States of Arugula" ("Estados Unidos da Rúcula"). O resultado é "uma nova celebração do carnivorismo".
Para alguns, isso significa ter uma câmara frigorífica no meio da sala. É ali que John Durant, 26, mantém miúdos e costelas de cervo, no seu apartamento de Nova York. Ele é parte de uma subcultura cujos membros nos EUA e na Europa buscam a boa saúde por meio de um retorno à dieta e aos exercícios dos ancestrais paleolíticos, escreveu o "Times".
O estilo homem das cavernas implica comer grandes quantidades de carne e então jejuar entre as refeições, para simular as épocas de escassez entre as caçadas. Durant acredita que o corpo humano evoluiu para ter uma vida de caçador-coletor, e seu objetivo é se livrar de -na visão dele- milênios de maus hábitos.
Num mundo obcecado pela carne, pode ser fácil perder alguns hábitos, ou se curvar. No seu casamento, em julho, a vegetariana Chelsea Clinton serviu carne. A decisão causou polêmica na internet.
No Rio, a confeiteira vegana Fernanda Capobianco vai se casar em outubro com o colega François Payard. Ela contou ao "Times" que, apesar das suas restrições éticas, vai servir carne. "Estamos convidando chefs como Eric Ripert e Daniel Boulud", contou. "Como podemos convidar chefs e não ter carne? Vão achar que somos loucos."
ANITA PATIL

Envie comentários para nytweekly@nytimes.com.



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