São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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Recursos escondem armadilha

Essas compras oscilaram muito nos últimos dois anos por causa da crise econômica global, condicionando o rumo das economias da região. As exportações latino-americanas para a China caíram no primeiro semestre em 2009, e depois dispararam 45% nos primeiros seis meses deste ano, segundo a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe). E, o que é mais significativo, atender essa demanda leva a região a recuar nos seus esforços para se diversificar.
Na década de 1980, as matérias-primas representavam metade do valor dos produtos exportados pela América Latina e pelo Caribe, antes de caírem para menos de 27% em 1999. Mas esse número tem voltado a subir na última década, e no ano passado chegou a quase 39%, diz a Cepal.
As exportações que mais cresceram foram as de recursos naturais da América do Sul, e sua produção ocorreu à custa de bens industriais e de serviços com variados graus de tecnologia, segundo um estudo divulgado neste mês pela comissão.
Ele mostra que as exportações da América do Sul se parecem muito com o que eram há 20 anos, no equilíbrio entre matérias-primas e produtos industrializados. Alicia Bárcena, secretária-executiva da Cepal, chamou essa tendência de "re-primarização da economia", e a comissão disse que ela é especialmente forte no Chile, onde as exportações (muitas delas de cobre) devem crescer 33% neste ano.
"É claro que essa é uma preocupação", disse o presidente do Chile, Sebastián Piñera. Ele lembrou que, nas últimas duas décadas, o Chile obteve alguns progressos na diversificação da sua economia, fortalecendo a produção de vinho, salmão e frutas para exportação. Mas o fato de o preço do cobre ter recentemente triplicado ofuscou esse progresso.
Piñera definiu a meta de duplicar os investimentos públicos do Chile nas áreas de ciência e tecnologia, de 0,5% para 1% do PIB até 2014, quando termina o seu mandato. Mas países ocidentais mais desenvolvidos já aplicam 2,5% do seu PIB nesse campo, e alguns países asiáticos, como Japão e Coreia do Sul, chegam a 4%, de acordo com Bárcena.
A América Latina enfrenta barreiras para produtos de maior valor agregado, como o etanol e o chocolate, e a atração do mercado pelas matérias-primas das quais se originam -açúcar e cacau- tem sido forte.
"Enquanto os preços das commodities continuarem razoavelmente altos -e devem continuar, a não ser que haja um pouso forçado na Ásia-, a dependência das exportações de produtos primários parece ser o futuro da região, para o bem e para o mal", disse Riordan Roett, diretor do programa de estudos latino-americanos da Universidade Johns Hopkins.
A chave, revelou, será usar os dividendos advindos das exportações para "avançar na direção de uma sociedade baseada no conhecimento".
O Chile, sob a administração de governos anteriores, economizou bem. Agora cabe a Piñera, que ficou bilionário fazendo investimentos astutos, usar parte dessa poupança para modernizar mais o país. Piñera já demonstrou capacidade de aproveitar seu espírito empreendedor no caso dos mineiros presos.
Quando a mina San José desabou, em 5 de agosto, ele rapidamente mobilizou seu governo para procurar os homens. "A cada noite eu pensava: 'O que podemos fazer além do que já foi feito?'", afirmou.
A questão poderia descrever também os desafios econômicos que o Chile terá pela frente nos próximos cem anos.


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