São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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ANÁLISE DO NOTICIÁRIO

A Presidência americana, acorrentada ao mundo

Por MATT BAI

As Presidências americanas historicamente tendem a ser vistas como pertencentes a períodos, mais que a indivíduos. Houve Presidências da era industrial, Presidências da era da Depressão, Presidências da Guerra Fria.
Quando os historiadores olharem para trás daqui a 50 anos, em que era vão situar o mandato do presidente Obama, e o que isso revela sobre os desafios que ele enfrenta?
Em entrevistas, vários historiadores citam o mesmo tema básico. Até o fim da União Soviética, a segurança econômica e nacional dos Estados Unidos era amplamente autodeterminada, graças a seu poder industrial e sua capacidade de negociar tratados com outros países.
Mas o advento de mercados realmente globais, juntamente com as ameaças de forças não oficiais como a Al Qaeda, modificou tudo isso. Hoje, os americanos vivem em um mundo integrado, no qual os empregos americanos dependem de políticas econômicas de governos na Ásia ou na América Latina, enquanto a segurança está sujeita aos caprichos de um religioso que vive em uma caverna.
John Lewis Gaddis, o eminente acadêmico do período da Guerra Fria, chama a última década de "era de regressão", o que significa que a ideia popular de um mundo "unipolar" -em que os Estados Unidos não teriam qualquer concorrente econômico ou militar sério- deu lugar à percepção de que o melhor que os EUA podem desejar é um equilíbrio de poder estável.
David M. Kennedy, um historiador da Universidade Stanford, na Califórnia, disse suspeitar de que seus futuros colegas historiadores classificariam nossas presidências mais recentes como o resumo de uma "era de globalização", em que "todo o conceito de soberania é menos importante do que costumava ser".
Tudo isso tem ramificações importantes para Obama. Os presidentes, cujas estátuas ornam o Panteão Nacional em Washington, são aqueles que foram considerados não apenas sábios e justos, mas também mestres do destino da nação.
Eles são celebrados como homens decisivos que pareceram definir e controlar os acontecimentos de sua época.
O que os historiadores estão sugerindo é que o presidente moderno talvez simplesmente não tenha a capacidade de exercer essa firme condução.
A impotência diante da queda livre econômica surgiu como um marco da Presidência moderna. Enquanto Obama enfrenta uma crise econômica mais aguda do que seus antecessores, caracterizada por uma quase depressão, a verdade é que todos os presidentes remontando a Jimmy Carter, em um momento ou outro, tiveram de fazer campanha ou governar em ambiente dominado pelos mesmos fatores cíclicos e persistentes- recessão, desemprego, aumento dos custos da energia. E talvez a Presidência Obama, ao atingir seu ponto médio, seja melhor compreendida não isoladamente, mas como parte de um momento político mais longo e ainda indefinido.
É um momento em que, com a interdependência global, surgiu uma certa falta de controle, uma vulnerabilidade a influências díspares além das fronteiras territoriais, que são menos óbvias do que o lançamento de um satélite soviético. E essas influências podem minar o ideal americano do que deve ser um presidente.
Os americanos são suscetíveis a presidentes que falam com a autoconfiança de um xerife de filme de caubói, ou que, como Obama, projetam uma aura de celebridade ou grandiosidade histórica. Mas os americanos se decepcionam quando esses presidentes inevitavelmente se revelam menos que onipotentes, ou, como George W. Bush, são vítimas de suas próprias ideias românticas do poderio americano.
"Isto é o que acabará definindo esta era de Presidência -o poder reduzido, a autoridade reduzida, a capacidade reduzida de moldar os acontecimentos", diz Robert Dallek, o biógrafo presidencial. "É a Presidência em eclipse."
Tal pessimismo sobre o que Dallek chama de "qualidades ingovernáveis" do momento é exagerado em tempos difíceis. Durante um período na década de 1980, estava na moda dizer que a cidade de Nova York também havia se tornado "ingovernável"; ninguém mais diz isso. Pronunciamentos sobre a queda do predomínio do país soaram regularmente nos anos que antecederam a vitória na Guerra Fria.
Seria injusto sugerir que Obama ou qualquer outro presidente está simplesmente submerso nas correntes históricas, incapaz de navegar a si mesmo ou ao país através de tempos desafiadores.
O que é provavelmente verdade é que até os sucessos de um presidente, em uma era na qual uma crise da dívida na Grécia pode causar pânico em Wall Street, têm a probabilidade de parecer mais desiguais e menos retumbantes para os eleitores do que, por exemplo, a conclusão da Ferrovia Continental ou a rendição do Japão.
Se você é um presidente americano, ainda tem a oportunidade de liderar em uma crise e afinal prevalecer. Mas provavelmente não deve esperar monumentos de mármore pelo seu esforço.


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