São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2010

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Elevando os padrões e a esperança

Por CELIA W. DUGGER

CIDADE DO CABO - Gcobani Mndini, um rapaz esguio e tímido de 17 anos, disse que já era membro de um bando quando começou a nona série. "Entrei para o bando porque queria fazer parte de alguma coisa", disse.
Desde então, descobriu que se encaixa no último lugar que teria imaginado -um colégio particular que está reinventando a educação para adolescentes dos bairros pobres da África do Sul.
Gcobani deixou a vida com o bando e surgiu como um talentoso estudante de ciência que tenta ser admitido nas melhores universidades do país.
Enquanto muitas escolas públicas da África do Sul falharam para uma geração pós-apartheid de crianças das periferias pobres e áreas rurais, um movimento crescente de educadores, filantropos e pais desesperados não deixa de buscar alternativas.
Há uma década, bancos e fundações patrocinam os alunos promissores das periferias para que frequentem escolas de elite, principalmente brancas. Mas hoje novas escolas particulares estão surgindo para servir a crianças pobres e negras da classe trabalhadora, dando ao sistema público ainda predominante uma nova concorrência e até criando modelos que acabarão por influenciá-lo.
Três escolas conhecidas como Leap (Salto) representam uma abordagem, e estão reinventando a educação para 500 adolescentes das periferias negras de Cidade do Cabo e Johannesburgo.
Nas escolas, os alunos têm classes prolongadas durante a semana, das 8h15 às 17h15, e também nas manhãs de sábado. Eles passam um tempo extra estudando matemática, ciência e inglês. Os mais velhos, que se preparam para os exames de admissão que vão moldar seus futuros, ficam até as 20h, três vezes por semana.
Mas as escolas ensinam mais que uma firme ética de trabalho. Diariamente, os alunos têm uma classe de Orientação para a Vida, ou OV, onde falam sobre os problemas pessoais que podem perturbar o aprendizado.
Depois de um ano negando que estava em uma gangue, Gcobani disse que foi somente na OV que passou a enfrentar as consequências de suas opções. "Às vezes, a classe inteira o confrontava", disse a colega Lucinda Plaatjie.
A combinação de rigor acadêmico com honestidade emocional recompensaram. Os alunos da Leap superaram em muito a média nacional nos exames de admissão. Nove em dez passaram nos últimos cinco anos.
Em nível nacional, o desempenho nos exames decaiu anualmente nos últimos seis anos, com apenas 60% aprovados em 2009. As escolas públicas estão falhando para muitas crianças negras e pobres, dizem especialistas.
As escolas Leap são criação de John Gilmour, um treinador e educador que deixou emprego confortável como diretor de colégio preparatório majoritariamente branco, para fundá-las.
Na década de 1990, como diretor de um colégio público branco no subúrbio de Pinelands, ele iniciou um intenso programa de ensino para crianças do bairro negro vizinho de Langa. Mas, após mais de uma década, as notas dos alunos em matemática e ciência quase não haviam melhorado.
Em 2003, um ano antes de ele fundar a primeira escola Leap para atender a Langa, somente seis dos 650 alunos do bairro que fizeram o exame tiveram nota suficiente para entrar na universidade.
Então Gilmour havia concluído que as crianças das vastas periferias da Cidade do Cabo precisavam de muito mais que um time esportivo ou algumas horas extras de aulas. As escolas Leap, duas na Cidade do Cabo e uma em Johannesburgo -foram o resultado.
São estruturas utilitárias com pisos velhos e funcionários dedicados que trabalham muitas horas por um salário modesto. A maior parte do custo anual de US$ 4 mil por aluno é levantada entre particulares. O governo contribui com cerca de US$ 800.
As escolas ainda são obras em progresso, conduzidas em um espírito de experimentação. Nos últimos três verões, a Leap colaborou com o grupo Teach With Africa [Ensinar com a África], baseado em San Francisco, que este ano enviou 22 professores voluntários americanos, com métodos criativos próprios.
Em uma manhã recente, uma aula de ciência começou com uma revisão teórica entediante do efeito fotoelétrico. Então Ross Hill, 31, e Jamie Brandt, 36, que é da Califórnia, acordaram a classe fazendo todos encenarem o efeito.
Os estudantes fótons saltaram sobre um pedaço de zinco (um grupo de alunos oscilantes), fazendo os alunos elétrons saltarem para fora. "Vamos, fótons!", exclamou Hill. "Apenas um salto delicado, carinhoso!"
Uma garota fóton empurrou os alunos zinco. A classe inteira riu e gritou, e Hill exclamou: "Oh, maravilha!"


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