São Paulo, segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

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Taleban explora fronteira porosa

Por SOUAD MEKHENNET e RICHARD A. OPPEL Jr.

CHAMAN, Paquistão - O saco marrom espesso que um homem chamado Abdulmalek carregava no ombro em uma tarde recente poderia conter qualquer coisa: armas, drogas ou explosivos. Mas, disse o homem, ir e vir para cada lado da fronteira entre Afeganistão e Paquistão não é problema.
Os guardas afegãos de fronteira nunca o revistam, disse o homem, apesar de ele passar quatro ou cinco vezes por semana por esse movimentado posto de divisa. "Que revista?", disse Abdulmalek, 34, dono de uma loja de roupas e que, como muitos afegãos, tem só um nome. "Não há revistas."
Outros afegãos dizem que podem entrar no Paquistão sem dificuldade, subornando os guardas de cada lado da fronteira com o equivalente a menos de US$ 1 ou pagando a taxistas um valor igualmente simbólico para levá-los. Os guardas não pedem documentos de identificação a quem atravessa a fronteira de táxi.
A maneira como o Taleban utiliza as áreas tribais do Paquistão para lançar ataques dentro do Afeganistão talvez seja a questão que mais provoca desavenças entre Paquistão e EUA. Mas o problema não se limita às áreas tribais do Paquistão, uma região sem leis.
Também há brechas enormes nas verificações de segurança em outros postos de fronteira movimentados, como em Chaman, na Província do Baluquistão, onde, segundo autoridades americanas, os líderes do Taleban se refugiaram, fora do alcance das forças dos EUA e da Otan (aliança militar ocidental).
O posto de travessia em Chaman deveria ser um dos mais vigiados do país: é o único entre Candahar, lugar de origem do Taleban afegão, e o Baluquistão, que, segundo autoridades americanas, é onde se abrigam os comandantes do Taleban que controlam muitos combatentes afegãos.
Mas os insurgentes -na verdade, qualquer pessoa- podem atravessar a fronteira e contrabandear armas e drogas livremente, sublinhando o desafio enfrentado pelo esforço de guerra americano no Afeganistão, para o qual a fronteira representa uma barreira muito mais firme, já que o Paquistão não permite a travessia de forças militares da Otan ou americanas.
O resultado é que contrabandistas e insurgentes controlam boa parte dos 2.400 km de fronteira inóspita entre Afeganistão e Paquistão, criando um espaço de batalha flexível para os radicais.
Autoridades paquistanesas e afegãs culpam umas às outras pela falta de segurança na fronteira e os riscos que ela encerra.
A culpa também é atribuída aos estrangeiros. "Os afegãos realmente não ajudam na fronteira, mas as tropas da Otan e EUA, tampouco", opinou um funcionário sênior de inteligência ocidental.
Comandantes paquistaneses se queixam de que EUA e outros governos da Otan não lhes deram quase nada dos equipamentos necessários para reforçar a segurança ou impedir a travessia livre de combatentes do Taleban.
"Os insurgentes podem estar atravessando por Chaman, sim", disse o general Salim Nawaz, comandante do Corpo de Fronteira Paquistanês, a força paramilitar responsável pela segurança da fronteira em Chaman.
Um alto militar americano que acompanha o tema não contestou a visão paquistanesa sobre os problemas da fronteira e disse que serão enviados mais equipamentos. A situação é ainda mais difícil em trechos mais rurais dos 1.100 km de divisa entre o Afeganistão e o Baluquistão, que inclui 276 postos do lado paquistanês da fronteira.
Em um posto próximo à cidade de Nushki, o coronel paquistanês Javed Nasir admitiu que caminhões carregados de haxixe, ópio e heroína driblam regularmente a segurança da fronteira, entrando no Paquistão. Muitos dos carregamentos são vendidos depois por milhões de dólares, que financiam armas e salários do Taleban.
"Há muito contrabando de entorpecentes", disse Nasir. "Mas nossa maior preocupação é com as armas que vêm do Afeganistão."
Com a chegada próxima de outros 30 mil soldados americanos ao sul do Afeganistão, como parte do reforço militar ordenado por Barack Obama, comandantes americanos querem aumentar em 30% o tráfego de suprimentos passando por Chaman.
Mas esse esforço está sendo prejudicado por um desvio que levou o tráfego de veículos para uma estrada de terra de uma pista só, pela qual só pode passar um caminhão de cada vez e que é a única opção para a travessia da fronteira com veículos.
"Minha preocupação é que temos uma rodovia de quatro pistas que acaba chegando a uma estradinha de terra", disse o alto militar americano, observando que o posto de fronteira precisa de melhorias de ambos os lados.


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