São Paulo, segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

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Caçadores de Laos ganham voz

Por MALIA WOLLAN

SACRAMENTO - Entre trechos de música gospel e informações sobre o trânsito, Yia Yang pode ser ouvido na rádio AM do norte da Califórnia recomendando a seus ouvintes que fiquem atentos às bocas de suas espingardas.
Imigrante da etnia hmong originário do norte do Laos, Yang, 50, é o apresentador de um programa na rádio KJAY 1430-AM que trata de tudo relacionado à caça. A rádio tem como público uma das maiores comunidades hmong dos EUA, na qual o vínculo entre caça e sobrevivência ainda é algo muito concreto.
"Uma das principais fontes de alimento no Laos era a caça", disse Yang, dono de uma revendedora de carros em Sacramento, cidade com mais de 16 mil moradores da etnia hmong.
Yang disse que caçar traz lembranças das florestas do Laos, onde seu irmão mais velho -que, segundo ele, foi soldado treinado pela CIA- o ensinou a caçar animais semelhantes a guaxinins.
Durante a Guerra do Vietnã, a CIA treinou os hmong em segredo para combater as forças comunistas que acabaram controlando o Laos -logo, o esforço foi em vão. Depois da guerra, muitos hmong fugiram para campos de refugiados na Tailândia. E, da Tailândia, mais de 200 mil deles emigraram aos EUA, principalmente para Califórnia, Minnesota e Wisconsin.
"Grande parte do papel tradicional dos homens, no Laos, era prover suas famílias de carne", disse Paul Hillmer, diretor do Projeto História Oral Hmong na Universidade Concordia, em Saint Paul. "As dificuldades que os hmong encontraram nos EUA eram ligadas à obrigação de adaptar-se a coisas como divisas de propriedades particulares, licenças e normas relativas à caça."
Assim, Yang responde com paciência a um fluxo constante de pessoas que telefonam de todo o vale de Sacramento para fazer desde perguntas práticas -"preciso de uma licença especial para caçar cervos com arco e flecha?" ("Não, mas é preciso licença de caça e autorização para abater cervos com arco e flecha")- até outras, mais exóticas.
Um caçador, por exemplo, queria saber como deveria entregar a cabeça do urso que tinha abatido ao Departamento Estadual de Pesca e Caça, conforme exige a lei. (Resposta: leve o crânio do animal à sede do departamento em até dez dias depois de matar o urso.)
Autoridades como o capitão Roy Griffith, diretor da agência de caça e pesca, elogiam Yang por traduzir aspectos básicos das leis sobre caça e pesca aos membros de um grupo étnico que às vezes se mostra esquivo.
As agências estaduais responsáveis pela caça e pesca no Minnesota e Wisconsin contrataram pessoas que falam a língua hmong para atuar como embaixadoras culturais junto à população de imigrantes do Laos.
A Califórnia depende de cerca de 850 instrutores voluntários, um dos quais é o próprio Yang, para ministrar o curso obrigatório de dez horas de formação de caçadores e segurança de armas.
A rádio KJAY 1430-AM faz suas transmissões desde um trailer decrépito à margem do rio Sacramento. Durante o dia, a estação apresenta uma programação em hmong, com segmentos de uma hora de duração dedicados à música tradicional e a notícias internacionais que interessam aos hmong.
No inverno, quando as temporadas de caça de ursos e cervos terminam, o programa de Yang às vezes ele vai ao ar assim mesmo para falar da caça de porcos selvagens, patos e esquilos. "As pessoas telefonam à rádio para me perguntar: 'Quantos esquilos posso trazer para casa?'", ele contou. "A sopa de esquilo com pimentas é muito apreciada."


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