São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2010

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DINHEIRO & NEGÓCIOS

França resiste aos golpes na Europa

Paris interveio cedo para salvar empresas e empregos

Por STEVEN ERLANGER
QUIMPER, França - A HB-Henriot, uma das companhias mais antigas da França, fabrica faiança -tipo de louça esmaltada pintada à mão- artesanalmente desde 1690. O sal jogado no rio Odet já deixou sua argila inutilizável, porque faz a louça rachar nos fornos, mas a empresa resiste, depois de absorver um concorrente em 1968, como 1 das 2 fábricas de faiança na região. Uma placa do governo a chama de "empresa do patrimônio vivo".
Essa designação não gera dinheiro para a HB-Henriot, disse seu diretor-geral, Michel Merle, e ela foi muito atingida pela competição asiática, pelo dólar fraco e pela crise econômica nos EUA e no Japão, principais mercados para suas exportações.
Mas o governo francês interveio rapidamente e ajudou a salvar a empresa e seus 54 empregos, segundo Merle. Paris acelerou os pagamentos e as restituições fiscais para pequenas e médias empresas; abriu mão de impostos e aceitou deduções imediatamente, para só auditá-las depois; concedeu subsídios equivalentes a quase um mês de salário por empregado, para que as companhias pudessem reduzir custos trabalhistas e estoques sem perder funcionários.
E o governo também forneceu garantias de crédito, para que banqueiros nervosos ficassem mais dispostos a conceder empréstimos a pequenas empresas como a HB-Henriot.
A empresa é um ótimo exemplo de como a França está não só resistindo à tempestade econômica como também emergindo como uma das economias mais estáveis da Europa, a primeira a sair da recessão, com um crescimento inesperado no último trimestre de 2009, enquanto a recuperação alemã parava.
A França se mexeu antes. Concentrou-se em salvar empresas e empregos, às vezes incomodando seus parceiros europeus; enfatizou investimentos em infraestrutura criadora de empregos; amparou seus bancos e os pressionou a emprestar; e decidiu deixar que seu deficit público crescesse por mais alguns anos, mas com moderação.
Atualmente, a Grécia luta para evitar uma moratória ou um resgate; Espanha e Portugal assistem ansiosos; a Suécia recai na recessão; a Alemanha argumenta sobre o deficit público historicamente alto; e o Reino Unido se vê às voltas com dívidas e deficit de proporções gregas -enquanto isso, a França parece sólida, até mesmo prudente.
Mas a França também teve sorte. O economista Alexandre Delaigue, autor do popular blog Éconoclaste, disse simplesmente: "A França foi menos atingida porque seu setor imobiliário era menos importante do que na Irlanda e na Espanha, suas finanças menos importantes do que no Reino Unido, e estava menos exposta ao Leste Europeu do que a Alemanha".
A recessão francesa não foi nem de longe tão grave quanto a alemã, muito menos a dos Estados Unidos. O crescimento neste ano deve ser modesto, mas positivo em 1,2% -mais ou menos igual ao da Alemanha, acima do 0,7% previsto para a Europa como um todo, e abaixo dos 2,2% nos EUA.
Mas os bancos franceses estão em melhores condições que os alemães, e a França precisa bem menos que a Alemanha de mercados para bens industriais e de luxo. A política francesa está longe de ser perfeita: o desemprego está subindo, especialmente entre os jovens, junto com o deficit público e a já elevada dívida nacional, questões que irão durar além da crise.
O governo agora promete cortar o crescimento no gasto público total para menos de 1% ao ano a partir de 2011, e reduzir o deficit a 3% do PIB até 2013, embora suas previsões de crescimento pareçam otimistas demais e talvez seja necessário elevar impostos -apesar das constantes negativas a respeito.
No entanto, em geral, o veredicto é positivo para o presidente Nicolas Sarkozy e seu governo, que agiram rapidamente para reconhecer a crise e exercer os poderes de Estado. "A França resistiu à crise melhor do que a maioria dos seus parceiros europeus e saiu da recessão primeiro", disse o primeiro-ministro François Fillon.
Grande parte do crédito vai para Fillon, para Patrick Devedjian, ministro encarregado de implementar o plano de recuperação, e para Christine Lagarde, ministra de Economia, Indústria e Emprego. Numa entrevista em inglês, Lagarde disse: "Acho que nos saímos relativa e razoavelmente bem -aplicamos os três Ts: 'timely, temporary and targeted' [medidas na hora certa, temporárias e com alvo]".


Colaborou Nadim Audi



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