São Paulo, segunda-feira, 22 de junho de 2009

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CIÊNCIA & TECNOLOGIA

Onde paleontologia e arte se fundem

Por DONALD G. McNEIL Jr.

Se você estiver em um museu e se vir diante de um Homo habilis, Australopithecus afarensis ou Paranthropus boisei, é possível que esteja olhando para um trabalho de Viktor Deak.
Deak, 32, é um dos maiores paleoartistas do mundo. Muitas das imagens de hominídeos expostas na nova Sala das Origens Humanas no Museu Americano de História Natural, em Nova York, são dele, assim como as imagens vistas no livro "The Last Human" (O último humano). Nos dois casos, ele criou as imagens em colaboração com Gary Sawyer, antropólogo do museu.
Boa parte da obra de Deak pode ser vista em seu site na internet, www.anatomicalorigins.com. Seu mural de 24 metros de comprimento mostrando seis milhões de anos de história dos proto-humanos, cujos pedaços ósseos foram encontrados no nordeste da África, chegou a Manhattan neste mês como parte da exposição "O Legado de Lucy".
A atração central da exposição é o esqueleto fossilizado de Lucy. Com 3 milhões de anos de idade e pouco mais de um metro de altura, vindo da Etiópia, o fóssil foi nomeado em homenagem à canção "Lucy in the Sky with Diamonds", dos Beatles, que estava tocando no acampamento quando ele foi encontrado, em 1974.
Mas o mural criado por Deak, uma imensa colagem produzida com a ajuda do Photoshop, é mais divertido de se olhar do que os ossos. O pano de fundo emprega milhares das fotos feitas por Deak de vegetação, rochas, vales e promontórios das voçorocas do Dakota do Sul, da selva porto-riquenha e das pradarias do Wyoming, EUA. Apenas uma parte pequena foi de fato fotografada na África -uma foto feita pela mãe de um amigo de Deak durante um safári africano, mostrando árvores espinhosas distantes. Mas é claro que a Etiópia de hoje não tem mais as florestas e savanas verdejantes da Etiópia de 3 milhões de anos atrás, de modo que Deak foi obrigado a improvisar.
Sua paisagem é repleta de homens-macacos criados a partir de fotos das cabeças esculpidas por Deak, às quais foram sobrepostas fotos de pêlos de chimpanzés, cada uma colocada sobre o corpo de um humano -geralmente o próprio Deak, sua mulher ou amigos dele- em pose primitiva, e então ajustada para ter braços mais longos, nádegas salientes ou qualquer outra característica apropriada.
Perguntado sobre como começou a fazer paleoarte, ele responde: "Fui um garoto estranho". Uma de suas primeiras esculturas foi criada num churrasco familiar: um esqueleto humano feito de ossos de frango.
Durante seus estudos na Escola de Artes Visuais de Nova York, estava desenhando no museu de história natural quando um profissional do museu viu seu trabalho e o apresentou a Gary Sawyer.
"Percebi que ele era capaz de pensar tridimensional, abstrata e simbolicamente", disse Sawyer, a quem Deak se refere como sua "mãe espiritual", em entrevista telefônica. "Era com esse tipo de estudante que eu queria trabalhar."
Instado por Sawyer, Deak foi à Escola Médica Downstate, da Universidade Estadual de Nova York, para dissecar cadáveres. "Me recordo que ele me chamou uma vez, com as mãos cheias de matéria orgânica, e disse 'isto é fantástico!'", comentou Sawyer.
Você não gostaria de ficar sozinho à noite no apartamento de Deak. Suas estantes são repletas de crânios, alguns apenas parcialmente descarnados. Mesmo sua pequena máquina de fazer macarrão é assustadora. Ele a utiliza para moldar argila vermelha na espessura correta para recriar músculos faciais.
Deak, como artista, diz ter pouca paciência com a arte contemporânea. É que ele desaprova de quase tudo dos últimos 100 mil anos -todo o cânone do Homo sapiens. Afinal, diz Deak, não apenas nossos ancestrais imediatos exterminaram muitos dos grandes mamíferos, como provavelmente mataram e comeram alguns de seus objetos de arte favoritos, incluindo o Homo neanderthalensis, o Homo erectus e o Homo floresiensis.


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