São Paulo, segunda-feira, 22 de junho de 2009

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VIDA COTIDIANA: RELACIONAMENTOS

Vizinhos dividem espaços e valores

Por CHRIS COLIN

Vicki Seltzer vive com seus gatos num bairro tranquilo em Visalia, Califórnia. Connie Baechler aluga uma ampla casa em Smyrna, Geórgia (EUA), onde vive com seu noivo. São arranjos residenciais bons e típicos, mas algo lhes fazia falta. Por isso, elas e 17 outras pessoas embarcaram num ônibus fretado numa manhã de sábado para tentar encontrar um jeito de morar que seja mais apropriado para os tempos atuais.
O passeio que fizeram fez parte de vários que vêm sendo promovidos em pontos distintos dos EUA nesta temporada, visando oferecer aos participantes uma visão de perto de várias comunidades de co-habitação. O movimento chegou da Dinamarca há duas décadas e vem ganhando força nos EUA. A ideia é oferecer uma resposta à sensação, cada vez mais comum, de que as pessoas pagam demais por suas casas, veem seus amigos muito pouco e, de modo geral, vivem uma vida mais isolada do que o desejável. Não são queixas recentes, mas a recessão as tem agravado. Perguntas remediais são permitidas nesses passeios, como, por exemplo, "o que é co-habitação"?
A Associação de Co-Habitação dos EUA tem respondido a essa pergunta com frequência, à medida que mais pessoas se candidatam a suas visitas guiadas. A resposta é que as comunidades são unidades habitacionais individuais cujos residentes compartilham alguns espaços comuns, alguns jantares por semana e um compromisso com um modo de vida ecológico.
Os passageiros nas visitas guiadas dizem que o atual clima geral de incerteza desencadeia ondas de reavaliação: é assim que quero criar minha família? Passar os anos de vida que me restam? Será que existe uma opção melhor -uma comunidade mais estável?
A consultora californiana Judy Pope, que fez parte de um dos passeios guiados, falou de um interesse pragmático pela comoradia: "Eu tinha um portfólio de investimentos bastante sólido com o qual ia me aposentar", explicou. "Agora, por pressões financeiras, estou sentindo necessidade de viver com outras pessoas. Não posso continuar a morar sozinha na minha casa grande e velha."
Em alguns casos, o ambiente de proximidade nessas comunidades funciona como proteção contra a economia fraca. Os moradores emprestam dinheiro uns aos outros quando necessário ou, por exemplo, se cotizam para pagar reformas nas casas.
Há as economias decorrentes de se viver numa casa de projeto mais eficiente e da divisão dos custos de manutenção. Mas viver numa comunidade de comoradia nem sempre custa menos que uma casa mais tradicional. Para os defensores da proposta, os benefícios são mais de valor agregado.
"Você ganha mais em troca do que gasta", explicou Laura Fitcher, que vive no sistema de comoradia há 15 anos. "Em vez de ir ao cinema, pode ter entretenimento na casa ao lado. Se tiver filhos, não precisa levá-los para longe para brincar com outras crianças." Ela explicou que o preço da co-habitação frequentemente inclui uma casa comunitária com quartos para hóspedes, um salão de festas, um playground para as crianças e a segurança de moradores que ficam atentos uns aos outros.
Jason Reichert, que participou de uma visita guiada na Nova Inglaterra, disse que gosta da ideia de enfrentar as crises econômica e ambiental no país com a ajuda de um grupo. "A comunidade em que meus avós viviam superou a Grande Depressão por ser muito unida", explicou. "Uma família sabia cultivar legumes, e outra sabia criar galinhas. Hoje nós perdemos isso. Mas a co-habitação está realizando algo semelhante."
Craig Ragland, diretor da Associação de Co-Habitação, disse: "Alguns enxergam essas comunidades como bote salva-vidas. A ideia é: 'Se estou cercado de pessoas que se preocupam comigo, tenho menos chances de afundar'."
Segundo a associação, há nos EUA mais de 115 comunidades rurais, urbanas e suburbanas de comoradia, abrangendo 2.675 unidades habitacionais. Em cada comunidade há entre três e 67 casas, distribuídas em terrenos urbanos pequenos ou em áreas de 222 hectares. Algumas são comunidades "retroadaptadas", com casas geminadas ou lado a lado previamente existentes que foram compradas e reformadas.
Outras começam com um terreno e constroem as unidades habitacionais. Nos dois casos os moradores são proprietários de suas casas, mas concordam em participar dos arranjos comunitários.
Numa visita guiada recente, Connie Baechler explicou seu interesse pela co-habitação: "Gosto de meus vizinhos no lugar onde moro, mas não temos uma comunidade que se reúne e conversa", disse. "Então acabo dirigindo 30 km depois do trabalho para jantar com uma amiga. Sempre há o Facebook, mas quero estar sentada ao lado de uma pessoa tridimensional. Com a co-habitação, poderemos nos encontrar a poucos metros de casa."


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