São Paulo, segunda-feira, 24 de agosto de 2009

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Avançado demais, celular japonês perde mercado


Tecnologia popular em Tóquio não funciona fora dali

Toshifumi Kitamura/France Presse — Getty Images
“Smartphones” no Japão podem incluir um chip que serve de cartão de crédito, permitindo, com um gesto, a compra de produtos em máquinas

Por HIROKO TABUCHI

TÓQUIO — À primeira vista, os celulares japoneses são o sonho de qualquer amante de “gadgets”: preparados para acessar a internet, servem também como cartões de crédito, cartões de embarque e até calculadoras de gordura corporal.
Mas é difícil encontrar em Chicago ou Londres quem use um celular de marcas japonesas como Panasonic, Sharp ou NEC, apesar dos vários anos de incursões dos fabricantes nos mercados externos.
“O Japão está anos à frente em qualquer inovação. Mas não conseguiu gerar negócios a partir disso”, afirmou Gerhard Fasol, presidente da consultoria Eurotechnology Japan.
Os japoneses chamam isso de “síndrome de Galápagos”, comparando esses celulares às espécies endêmicas que Darwin encontrou naquelas ilhas, fantasticamente evoluídas e divergentes dos seus primos continentais, explica Takeshi Natsuno, professor da Universidade Keio, em Tóquio.
Neste ano, Natsuno juntou algumas das melhores cabeças desse campo para debater como os celulares japoneses podem se globalizar. “A coisa mais assombrosa do Japão é que mesmo a pessoa mediana ali terá um telefone superavançado”, disse ele. “Então, nos perguntamos se o Japão não consegue avançar com base nessa vantagem.”
O único fabricante japonês de celulares com presença significativa no mercado global é a Sony, em parceria com a sueca Ericsson. Mas a Sony Ericsson tem sofrido enormes prejuízos. Sua participação no mercado era de apenas 6,3% no primeiro trimestre de 2009, atrás da finlandesa Nokia, das sul-coreanas Samsung e LG e da norte-americana Motorola.
Isso é ainda mais surpreendente porque os celulares japoneses ditaram o ritmo de quase todas as inovações do setor: capacidade para e-mail em 1999, câmeras em 2000, redes de terceira geração em 2001, downloads totais de música em 2002, pagamentos eletrônicos em 2004 e TV digital em 2005.
O Japão tem 100 milhões de usuários de “smartphones” de terceira geração, o dobro do número dos EUA, que é um mercado muito maior. Muitos japoneses usam celulares, e não PCs, para acessar a internet.
De fato, os fabricantes japoneses de celulares achavam que tinham se posicionado para dominar a era dos dados digitais. Mas foram um pouco inteligentes demais. Na década de 1990, estabeleceram um padrão para redes de segunda geração que foi rejeitado em todos os demais lugares. As operadoras criaram serviços fechados para a web, como o i-Mode, que estimularam enormes mercados de comércio eletrônico e conteúdo dentro do Japão, mas também aumentaram o isolamento do país em relação ao mercado global.
Então, o Japão rapidamente adotou um padrão de terceira geração em 2001. O resto do mundo hesitou, essencialmente tornando os telefones japoneses avançados demais para a maioria dos mercados.
Ao mesmo tempo, o rápido crescimento do mercado japonês, no final da década de 1990 e começo da de 2000, deu às empresas poucos incentivos para entrar nos mercados externos. Mas, agora, o mercado local está encolhendo rapidamente, afetado pela recessão e por uma economia em envelhecimento; os fabricantes entregaram 19% menos aparelhos em 2008 e devem entregar ainda menos em 2009. Oito fabricantes disputam um mercado que será inferior a 30 milhões de unidades neste ano.
Várias companhias japonesas agora cogitam uma investida nos mercados externos, inclusive a NEC, que abandonou em 2006 seus deficitários esforços internacionais no campo dos celulares. Panasonic, Sharp, Toshiba e Fujitsu estariam planejando manobras similares. “Os fabricantes japoneses de celulares precisam olhar ao exterior ou deixar o negócio”, disse Kenshi Tazaki, executivo da consultoria Gartner Japan.
Numa recente reunião do grupo de Natsuno, 20 homens e 1 mulher se aglomeravam em torno de uma mesa num arranha-céu no centro de Tóquio, examinando dados de mercado, disparando xingamentos e balançado a cabeça com frequência.
A discussão então se voltou para os próprios celulares. A ênfase no equipamento torna até os mais novos telefones japonses surpreendentemente volumosos. Alguns analistas dizem que as operadoras sufocam as inovações ao exigirem tantas funções com equipamentos periféricos para os telefones.
Enquanto isso, os desenvolvedores japoneses têm ciúmes da popularidade global do iPhone e da loja da Apple, o que afastou os setores norte-americano e europeu de celulares da sua obsessão com especificações de hardware, para fazê-lo priorizar o software. Brincando com seu iPhone 3G, Natsuno disse: “É o tipo de telefone que eu queria produzir”.


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