São Paulo, segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

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LENTE

É possível se recuperar da devastação?

As cenas do Haiti são de fato desanimadoras. Um país à beira do abismo parece ter sido empurrado para baixo, com sua paisagem de corpos em decomposição, prédios demolidos e uma população ferida e faminta. Como disse Damon Winter, fotógrafo do "New York Times" que testemunhou a devastação: "Você se pergunta como as pessoas prosseguem suas vidas com tanta perda; a cidade não irá mais existir em qualquer forma próxima ao que era -não vejo como possa".
Mas o Haiti irá, de alguma maneira, se recuperar. A ajuda internacional chegou. Os corpos estão sendo sepultados. Os prédios serão reconstruídos. As famílias vão chorar suas perdas. Pesquisadores acreditam que os humanos evoluíram para lidar com fatos traumáticos e tocar a vida.
Embora a psique haitiana possa afinal se restabelecer, a forma que sua capital, Porto Príncipe, assumirá é um enigma. O caminho escolhido pode significar a diferença entre o retorno a um status quo infeliz ou um futuro mais brilhante.
Quando um violento terremoto atingiu Áquila, na Itália, em abril passado, o auxílio emergencial foi extraordinário, escreveu Michael Kimmelman no "New York Times". Mas agora, relatou, "o futuro de Áquila em longo prazo está em dúvida". "A escassez de dinheiro, vontade política, bom senso arquitetônico e atenção internacional [...] ameaça acabar o que o terremoto começou."
Não é pouca coisa reconstruir uma cidade onde cerca de 110 mil monumentos e artefatos foram afetados pelo tremor, ou aparecer com os bilhões necessários. Áquila era uma localidade medieval graciosa, um centro cultural e uma cidade universitária.
"Se não reconstruirmos adequadamente", disse o prefeito Massimo Cialente a Kimmelman, "será uma vergonha para toda a nação". "Teremos outra Pompeia", acrescentou.
Nenhum plano grandioso de reconstrução foi discutido depois do catastrófico tsunami de 26 de dezembro de 2004, que deixou mais de 200 mil mortos na Ásia. Aldeias e famílias inteiras foram varridas.
Cinco anos depois, a paisagem é diferente. A enxurrada de ajuda financeira -US$ 12 bilhões para todas as áreas afetadas e cerca de US$ 1 bilhão para Tâmil Nadu, o Estado mais atingido da Índia- transformou a região e a sua economia, noticiou o "New York Times". Muita gente melhorou de vida.
J. Sasikala perdeu todas as suas posses, inclusive sua choupana de barro. Ela agora vive em uma casa de concreto com sala, cozinha e dormitório, abastecida com gás e eletricidade. De uma agência humanitária, recebeu treinamento para fazer artesanato.
Ela também se tornou proprietária do imóvel. As autoridades consideraram que todas as novas casas deveriam ficar em nome de mulheres. Os homens bebem e jogam, disseram eles. As mulheres são mais confiáveis. O "New York Times" noticiou que 50 mil casas foram construídas na costa de Tâmil Nadu e que, com as mulheres registradas como proprietárias, o tecido social se alterou. Os homens se queixaram, mas aquiesceram. O status das mulheres foi elevado, e muitas estão mandando suas filhas para a escola. Elas têm mais controle sobre as finanças domésticas.
K. Maniplan, vizinho de Sasikala, contou ao "New York Times" que chegou a se perguntar se a aldeia iria se recuperar. Agora, afirmou, ele acha estranhamente que o tsunami foi bom.
Pode ser difícil imaginar como, mas será possível que algum dia os haitianos digam o mesmo do terremoto de 2010?
TOM BRADY


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