São Paulo, segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DIÁRIO DE LAMU

Projeto de porto queniano desestrutura ilha intocada

Por JEFFREY GETTLEMAN
LAMU, Quênia - Lamu é um lugar historicamente ligado ao mar, onde a modernidade fundiu-se graciosamente com a cultura tradicional, sem estragar esta última por completo. Mas tudo isso pode estar prestes a mudar.
Para a consternação de muitos moradores e turistas, o governo queniano planeja construir no local o maior porto da África oriental. Trata-se de um projeto ambicioso, de bilhões de dólares, que tem o potencial de transformar o comércio da região.
Oleodutos, linhas férreas, rodovias, aeroportos, uma refinaria de petróleo e ancoradouros de grande profundidade para receber superpetroleiros do século 21 estão todos incluídos nos planos, embora seja difícil visualizar essa infraestrutura sendo erguida nesse trecho da costa queniana esquecido há muitos anos, pontilhado por ruínas de construções e manguezais impenetráveis.
O governo chinês, um dos investidores mais agressivos na África, apoia o projeto e já deu início aos estudos de viabilidade.
"Isto é real", disse o ministro dos Transportes do Quênia, Chirau Ali Mwakwere. "Estamos dando passos enormes em direção à realização do que poderia ser descrito como um sonho."
Mas não seria o sonho de um historiador. Lamu é um dos últimos redutos da cultura suaíli pura, um resquício dos tempos de sultões que traziam sangue árabe e africano nas veias e que dominaram a costa oriental da África durante centenas de anos. Por ser uma ilha pequena, à qual só é possível chegar por uma pequena pista de pouso ou uma estrada acidentada e uma balsa, Lamu tem sido poupada dos grandes hotéis e da urbanização que dominaram a cidade portuária de Mombaça, Zanzibar e outros pontos turísticos na região.
Por isso mesmo, líderes de Lamu acham que o porto trará mais problemas que vantagens.
A maior preocupação é o meio ambiente. A pesca garante a subsistência de muitos dos 85 mil moradores do distrito de Lamu, e os pescadores temem que a drenagem planejada do porto afete a reprodução dos peixes.
Omar Mzee, ex-deputado de Lamu, se preocupa com a poluição a ser gerada pelo porto e a possibilidade de vazamentos de petróleo. "Vai ser uma confusão total", disse. "O governo está pensando no PIB nacional. Mas isso não vai beneficiar Lamu."
O governo argumenta que a economia queniana em crescimento necessita urgentemente de um porto maior. Mas Mzee disse que Lamu é marginalizada há décadas devido a sua localização costeira e pelo fato de sua população ser muçulmana, enquanto o Quênia, desde sua independência, em 1963, é governado por políticos cristãos das regiões de montanha. "O governo não nos leva muito a sério", disse Mzee.


Texto Anterior: China pune com rigor o uso de drogas
Próximo Texto: Dinheiro & Negócios
CEOs dão poucos sinais de contrição

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.