São Paulo, segunda-feira, 25 de maio de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Pragmático, Omã navega entre Irã e nações árabes

Por MICHAEL SLACKMAN

MASCATE, Omã - Enquanto o Irã se vê envolvido numa espécie de guerra fria contra Egito, Arábia Saudita e outras nações árabes, o discreto, mas influente, Sultanato de Omã acelerou sua cooperação com Teerã, nutrindo uma aliança que ajuda a fortalecer o Irã e a salientar as profundas divisões entre as capitais árabes.
Omã, um país estrategicamente vital e insistentemente pragmático, recusa as aberturas de seus vizinhos maiores para se afastar do Irã. Em vez disso, desafiou o Egito e a Arábia Saudita ao rejeitar o boicote a uma cúpula no Qatar, em janeiro, promovida para apoiar o Hamas, grupo militante patrocinado pelo Irã. A agência iraniana de notícias Fars disse que Omã e Irã estão próximos de completar um pacto de segurança.
Os estreitos laços entre os dois países, e as razões por trás disso, ajudam a explicar o fracasso do Ocidente em paralisar o Irã com sanções comerciais, bem como a incapacidade dos adversários árabes do Irã em construir uma oposição unificada à sua crescente influência regional.
"Para nós, isso é a expressão de ser realista", disse Salim al Mahruqi, ex-diplomata omani, hoje funcionário do Ministério da Cultura. "O Irã é um vizinho grande e está aí para ficar." Omã, como Síria e Qatar, vê o Irã como um aliado político e econômico importante, poderoso demais e perigoso demais para ignorar, quanto mais para antagonizar. Mesmo os Emirados Árabes Unidos, que disputam com o Irã a posse de três ilhas do golfo Pérsico, pouco se empenham em impedir um comércio anual de bilhões de dólares com o Irã.
Raramente no noticiário, Omã há muito tempo tem uma atuação fundamental nos bastidores da região. Trata-se de uma monarquia absolutista, governada desde 1970 pelo sultão Qaboos bin Said, que fomentou uma abordagem diplomática que dá a sua nação o status ímpar de ter relações estreitas tanto com o Irã quanto com os Estados Unidos. Omã às vezes serve de intermediário entre as duas nações. Ao contrário de Síria e Qatar, que buscam papéis regionais maiores, Omã está estritamente focado em reforçar sua estabilidade. Os omanis continuam a relação com o Irã por causa de laços históricos, por saberem que Teerã, se quisesse, poderia facilmente invadir sua nação, e porque esse é um parceiro comercial importante há várias gerações.
Um sinal visível da cooperação está longe da capital Mascate, na ponta de uma península de montanhas escarpadas, na Província de Musandam. Há anos Omã ajuda contrabandistas iranianos a burlarem as sanções comerciais internacionais.
Frotas de pequenas lanchas cruzam diariamente o estreito de Hormuz, numa viagem de menos de uma hora. Atracadas em Omã, elas embarcam comida, roupas, eletrônicos, produtos farmacêuticos, aparelhos de ar condicionado e até motos.
"Ninguém jamais tentou impedir esse contrabando", disse Omran Abdel Kader Abdullah, 18, que contou ter entrado para o negócio familiar de fornecer produtos aos contrabandistas assim que acabou o ensino médio. "É o nosso meio de vida. Todas as famílias estão envolvidas."
Na verdade, o governo local coordena a entrega dos bens às lanchas dos contrabandistas, distribuindo encomendas todas as manhãs a quem tiver uma caminhonete. O comércio é considerado ilegal no Irã, porque os contrabandistas evitam pagar taxas e impostos iranianos. Mas Omã recolhe impostos sobre todos os bens.
Considerações pragmáticas como essas de pouco servem para acalmar a ansiedade dos governos árabes, que veem no Irã uma ameaça à sua própria posição regional e aos seus interesses nacionais. Por isso, Omã tem relações abaladas com seus vizinhos árabes.
Enquanto o Ocidente está preocupado que o Irã vá desenvolver armas nucleares no futuro, autoridades no Egito, Arábia Saudita, Marrocos, Jordânia e Bahrein se queixam do que o Irã está fazendo hoje. O Marrocos tomou a medida mais extrema, rompendo relações com o Irã em março.
Os omanis dizem não temer as ambições nucleares iranianas. Mas estão preocupados com a exportação da ideologia revolucionária islâmica do Irã. Acima de tudo, o Irã tem uma força militar convencional muito mais poderosa. E a política externa de Omã reflete diferenças religiosas com a Arábia Saudita. Há também a questão econômica. Omã enfrenta um déficit orçamentário neste ano, em parte por causa de uma redução nos dividendos do petróleo. Ele tem muito menos petróleo do que muitos vizinhos seus, e quer diversificar sua economia.
Exportações para o Irã geram uma renda importante. Permitir que os contrabandistas ajam é outro exemplo de como o interesse de Omã costuma estar alinhado ao do Irã. "É tudo negócio", disse Rashed Said, 27, entregando 140 caixas com roupas no cais. "É tudo dinheiro."

Colaborou Mona el-Naggar, em Omã


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