São Paulo, segunda-feira, 25 de maio de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS MUNDIAIS

À sombra da Rússia, Abkházia tenta atrair expatriados

Por ELLEN BARRY

SUKHUMI, Geórgia - Enquanto a noite cai sobre o Mar Negro, cerca de 12 de peregrinos se reúnem na sala de aula onde estudam o abkhaz, a língua de origem de sua nova terra. O bairro ainda está repleto de buracos de bala da guerra travada pela Abkházia para separar-se da Geórgia.
Em momentos de fraqueza, quando a dificuldade em aprender o russo e o abkhaz cansa sua cabeça, Selin Katsba sente saudades de Istambul, onde passou a infância. Mas então ela se recorda de tudo. Muitas pessoas de etnia abkhaz que ela conhece na Turquia estão pensando em retornar à terra que seus bisavós deixaram, especialmente agora que o local está sob a proteção da Rússia. Se ela hesitar, os outros também hesitarão.
"Aos olhos de meus pares e de minha família, sou como um símbolo e uma líder, porque retornei", comenta Katsba, 22. "É importante que eu permaneça aqui."
Agora que a Rússia reconheceu o território separatista georgiano como país soberano, as autoridades esperam que os abkhazes étnicos retornem dos lugares para os quais fugiram no século 19, em parte para escapar da expansão do império russo. Elas esperam que alguns dos estimados 500 mil abkhazes que vivem na Turquia retornem para somar-se aos abkhazes da Abkházia, cujo número caiu para menos de 100 mil, e que empreendedores que fazem parte dessa diáspora tragam investimentos.
Até agora, os retornados estão chegando um a um, e ninguém prevê um fluxo grande e repentino. Mas, se a repatriação dos abkhazes ganhar força, poderá ter um efeito a longo prazo, reforçando os laços com a Turquia, reafirmando a separação da Geórgia e reduzindo a dependência da Rússia. As autoridades em Sukhumi dizem que há planos para construir uma mesquita na capital.
Nove meses depois de celebrar sua independência da Geórgia, a Abkházia continua com seu litoral belíssimo e uma infraestrutura turística grande, embora decrépita. O que falta à região são pessoas. Quando a guerra com a Geórgia começou, em 1992 e 1993, cerca de 200 mil georgianos abandonaram suas casas, reduzindo a população quase pela metade. O censo mais recente, em 2003, contabilizou uma população de 215 mil pessoas, e boa parte do território ainda ostenta o ar esdrúxulo de um resort turístico abandonado.
Os abkhazes vêm procurando aumentar seu contingente com a repatriação desde a década de 1990, e autoridades dizem que até agora apenas cerca de 2.000 abkhazes voltaram. Muitos dos que retornaram pouco após a guerra não falavam nem russo, nem o idioma abkhaz, e encontraram sua pátria de origem arcada sob o peso de falta de diversos bens, restrições aos deslocamentos, pobreza e isolamento. Gennady Matveyev, russo cujos avós se assentaram em Sukhumi, disse que os primeiros a chegar nunca se encaixam perfeitamente.
Mas o reconhecimento pela Rússia infundiu vida ao projeto, e Matveyev disse que os abkhazes que vêm chegando mais recentemente são jovens e instruídos, "pessoas de um nível mais alto". Como incentivo, o Estado hoje oferece aos repatriados a cidadania, moradia gratuita por um ano e cinco anos de ajuda financeira.
O tema desperta o entusiasmo do Movimento Patriótico Juventude da Abkházia. No ano passado, 45 integrantes da organização percorreram cidades turcas, reunindo-se com jovens da diáspora. O presidente do grupo, Alias Avidzba, contou que os jovens que eles encontraram perguntavam se a Abkházia estava tendo "contato demais com a Rússia".
"Essa é a imagem que se tem desde fora, mas explicávamos que ela é falsa", disse. Cemre Jade, 29, socióloga nascida na Turquia e que trabalha para o Centro de Estudos Estratégicos da Abkházia, descreve a Abkházia como uma economia prestes a viver um crescimento enorme. Mas, para membros da diáspora na Turquia, disse, a atração principal é a ideia de voltar para casa. "Não é errado dizer que você vem de outro país", disse Jade, de antepassados adigues, povo caucasiano relacionado aos abkhazes. "Você pode dizer 'este é meu país no Cáucaso, e algum dia viverei lá. Algum dia vou retornar à Abkházia'."


Texto Anterior: Pragmático, Omã navega entre Irã e nações árabes
Próximo Texto: Babilônia vira frágil atrativo no Iraque
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.