São Paulo, segunda-feira, 25 de outubro de 2010

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Desvalorizações criam iminência de "guerra cambial"

Por DAVID E. SANGER e MICHAEL WINES
WASHINGTON - Enquanto o governo Obama eleva o tom na sua batalha com os líderes chineses por causa do valor artificialmente baixo do yuan, cada vez mais países abandonam regras do mercado e começam a agir pela cartilha de Pequim.
Japão e Brasil adotaram recentemente medidas para desvalorizar suas moedas. A Câmara dos Representantes (deputados) dos EUA aprovou no mês passado a primeira lei destinada a impor enormes tarifas sobre produtos chineses caso Pequim não permita a valorização do yuan. Na França, o presidente Nicolas Sarkozy saiu em defesa de novo sistema de coordenação cambial global, como fizeram os países ricos na década de 1970.
Não está claro se o resultado será uma "guerra cambial", como alertou recentemente o ministro brasileiro da Fazenda, Guido Mantega.
Timothy Geithner, secretário do Tesouro dos EUA, tentou aplacar tal temor. "Não vamos ter uma guerra comercial", declarou. "Não vamos ter guerras cambiais." Ele disse acreditar que uma "fração substancial da liderança chinesa" já entende a necessidade de permitir a valorização cambial.
Mas não se sabe até onde a China está disposta a ir, pois moeda mais cara significa exportações mais caras e uma possível perda de empregos.
Alguns economistas argumentam que o impasse em torno do yuan pode prenunciar uma nova era de protecionismo. Isso deve abalar o comércio mundial e enfraquecer ainda mais uma recuperação já fraca. Mas outros defendem que o consenso dos anos 1980 e 90 em torno do livre mercado prejudicou a competitividade americana e foi explorado por potências em ascensão como a China.
"Todo mundo entra no jogo que objetiva empobrecer o vizinho, querendo ou não", afirmou Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim e economista da entidade americana Fundação Carnegie para a Paz Internacional.
Muita gente mundo afora teme acabar sendo pisoteada nessa luta entre EUA e China.
Recentemente, o Japão interveio no mercado cambial pela primeira vez em seis anos, depois de acusar a China de provocar a maior alta do iene em 15 anos, em parte ao comprar títulos da dívida japonesa. O Brasil tomou medidas similares e prometeu fazer o que for possível para evitar uma maior valorização do real.
Mantega disse que as ações dos países desenvolvidos para manter os juros baixos, o que é uma forma de desvalorizar a moeda, são uma "estratégia do passado", que ameaça a economia do Brasil e de outros mercados emergentes "dinâmicos". "É um tipo de ação desesperada adotada pelos países a fim de ativar suas economias", afirmou.
"Como eles não têm conseguido ativar seus próprios mercados internos, a saída se torna exportar", disse.
"Então os países desenvolvidos trabalham para desvalorizar suas moedas com o objetivo de se tornarem mais competitivos nos poucos mercados dinâmicos do mundo."
A maioria dos governos ocidentais e muitos economistas culpam a China pelos atritos cambiais, já que o país não deixa o yuan se aproximar do seu valor real. Além do mais, a China subsidia exportações com juros artificialmente baixos.
Não é surpreendente que na China o problema apareça sob outro ângulo. A imprensa local está cheia de artigos argumentando que os americanos não apreciam os esforços da China por eles. Enquanto as moedas de outras nações se desvalorizaram frente ao dólar na crise financeira de 2008, notam alguns economistas, esse não foi o caso do yuan. E, embora as exportações chinesas possam estar artificialmente baratas, o efeito tem sido oferecer barganhas aos compradores americanos, à custa do consumidor chinês.
A China poderia resolver grande parte do problema passando para uma economia guiada pelo consumo doméstico. Mas o progresso da China rumo a essa meta tem sido lento. Desde junho, quando o governo anunciou que iria deixar o yuan mais próximo do seu valor real, a moeda se valorizou apenas cerca de 1%.
A maioria dos especialistas diz que o valor real seria 15% a 20% maior.
Vários fatores econômicos e políticos limitam a flexibilidade da China, segundo Li Daokui, que dirige o Centro para a China na Economia Mundial, da Universidade Tsinghua.
Se a China deixar o yuan se valorizar muito rapidamente, disse ele, isso poderia deixar as exportações caras demais, derrubando todo um setor econômico. O resultado seria uma alta do desemprego e um risco de turbulência social.
Para Li, uma "suave valorização" do yuan é necessária, mas os chineses comuns precisam ser preparados até mesmo para esse pequeno passo.


Colaboraram Alexei Barrionuevo, de São Paulo, Steven Erlanger, de Paris, e Martin Fackler, de Tóquio



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