São Paulo, segunda-feira, 26 de outubro de 2009

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Ajuda do governo dos EUA alimentou alta recente em Wall Street

Por GRAHAM BOWLEY

Ao mesmo tempo em que a economia dos EUA continua a enfrentar dificuldades, boa parte de Wall Street está ganhando muito dinheiro -e mais uma vez antevendo bônus polpudos.
Muitos se perguntam como isso pode ser. Como é possível que alguns bancos já estejam prosperando tão pouco tempo após um colapso financeiro, enquanto multidões de americanos temem perder seus empregos e suas casas?
As pessoas talvez se surpreendam ao descobrir que uma das forças mais poderosas que está alimentando a retomada em Wall Street não é formada pelos bancos, mas por Washington. Muitas das medidas tomadas pelos políticos no ano passado para estabilizar o sistema financeiro -a redução dos juros a quase zero, o reforço dos grandes bancos com injeções de dinheiro dos contribuintes, a avalização de bilhões de dólares das dívidas das instituições financeiras- ajudaram a preparar o cenário para esta nova era de riqueza em Wall Street.
Gigantes como Goldman Sachs e JPMorgan Chase estão fazendo fortunas em setores em alta como o comércio de ações e títulos, em lugar de enriquecer concedendo crédito às pessoas. Cada um deles anunciou lucros superiores a US$ 3 bilhões no terceiro trimestre. Além disso, estão lucrando ao assumir mais riscos que concorrentes mais fracos -benefício resultante da concorrência reduzida. Assim, ao mesmo tempo em que os grandes bancos rejeitam propostas de regulamentação maior, Wall Street tem Washington a agradecer, em parte, por sua bonança mais recente.
"Tudo isso é facilitado pelo Fed (Banco Central dos EUA) e pelo governo, que querem que as instituições financeiras voltem a conceder empréstimos", disse Gary Richardson, pesquisador do Birô de Pesquisas Econômicas dos EUA. "Acabamos de mostrar a elas que desembolsaremos trilhões de dólares para protegê-las. Isso me preocupa muito."
Nem todos os bancos estão se saindo tão bem assim. O Citigroup e o Bank of America, cuja sorte está ligada aos altos e baixos dos consumidores comuns, estão lutando para dar uma virada.
Mas o declínio de algumas instituições, ao lado da queda de concorrentes antes fortes como o Lehman Brothers, concentrou o poderio financeiro dos EUA em menos mãos. Agora, os fortes têm poder maior para arrancar mais lucro dos mercados financeiros e para cobrar taxas mais altas.
"Eles podem cobrar mais por seus serviços, porque as empresas precisam de bancos comerciais e bancos de investimento, e há poucos para ajudá-las", disse Douglas Elliott, do Brookings Institution, organização de Washington que analisa políticas públicas.
Agora, o setor conta com novas ferramentas, graças ao governo. Com os juros tão baixos, os bancos podem emprestar dinheiro barato e aplicá-lo de maneiras lucrativas, quer seja para conceder empréstimos a empresas a juros mais altos, quer seja para especular nos mercados. As negociações de renda fixa -uma área que inclui títulos e divisas- vêm sendo especialmente lucrativas.
"Os resultados fortes das negociações lideraram", disse Howard Chen, analista de bancos no Credit Suisse, descrevendo os lucros mais recentes.
Para prevenir um colapso financeiro catastrófico que teria afetado toda a economia, o governo injetou bilhões de dólares nos bancos. Desde então, algumas instituições grandes, como o Goldman e o Morgan, já restituíram ao governo o dinheiro que receberam no pacote de socorro. Mas a maior parte do setor dos bancos ainda goza de outras formas de apoio do governo, e isso vem ajudando a elevar seus lucros.
O Goldman Sachs e seu rival Morgan Stanley foram autorizados a converter-se em holdings bancários à moda antiga. Essa mudança lhes deu acesso a financiamentos baratos do Fed, até então fora de seu alcance.
Esses dois bancos e outros, como o JPMorgan, também foram autorizados a emitir dezenas de bilhões de dólares em obrigações garantidas pela Corporação Federal de Seguro de Depósitos (FDIC), que segura depósitos bancários. Com a garantia, os bancos puderam contrair os empréstimos em condições vantajosas. É verdade que os bancos também estão se beneficiando da estabilização da economia. "A confiança voltou", disse Shubh Saumya, especialista em serviços financeiros no Boston Consulting Group. "Os banqueiros estão reavendo alguns dos ativos que eles desvalorizaram no ano passado, no meio da crise."
Uma razão importante dos lucros notáveis obtidos pelo Goldman Sachs neste ano é a disposição de seus negociantes em assumir riscos grandes -eles disponibilizaram mais dinheiro, enquanto outros bancos atingidos em 2008 frearam esse tipo de ação. Executivos dizem que há abismos estratégicos abrindo-se entre bancos de Wall Street, que estão assumindo mais riscos, e outros que estão optando por trilhar um caminho mais seguro.
Mesmo assim, o sucesso recente se limita em grande medida às grandes firmas de Wall Street que trabalham com títulos de crédito. Recentemente, o Citigroup e o Bank of America anunciaram perdas com inadimplências de cartões de crédito e hipotecas -sinal das dificuldades que ainda acometem a população e o setor produtivo dos EUA.


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