São Paulo, segunda-feira, 27 de abril de 2009

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A reinvenção da velha forma de ir à escola: a pé


Itália combate obesidade, trânsito e aquecimento global simultaneamente


Por ELISABETH ROSENTHAL

LECCO, Itália - Todas as manhãs, cerca de 450 alunos percorrem 17 rotas de ônibus escolares que dão acesso a dez escolas primárias em Lecco, no extremo sul do lago Como, na Itália. Só que não há um só ônibus escolar. Em 2003, para enfrentar a tripla ameaça da obesidade infantil, dos congestionamentos e do efeito estufa provocado pelas emissões dos carros, um grupo ambiental local propôs um conceito retrô-radical: que as crianças fossem à escola andando.
Criou-se então um "piedibus" (mistura em italiano de "pé" e "ônibus"), um trajeto em que há motorista, mas não há veículo. Todas as manhãs, funcionários pagos e pais voluntários com trajes amarelos guiam fileiras de alunos pelas ruas sinuosas de Lecco. Na Escola Carducci, cem crianças, ou mais de metade dos alunos, atualmente usam o "piedibus". Muitas costumavam ir de carro, como Giulio Greppi, 9, que agora percorre a pé o percurso de aproximadamente meio quilômetro. "Consigo ver meus amigos, e nos sentimos especiais porque sabemos que é bom para o meio ambiente", disse o menino.
Embora cada rota seja curta, os "piedibus" já eliminaram mais de 160 mil quilômetros de deslocamentos de carro, evitando a emissão de milhares de toneladas de gases do efeito estufa, estima Dario Pesenti, auditor ambiental do município. Nos EUA e na Europa, especialistas dizem que cada vez mais crianças são levadas de carro para a escola, o que significa uma parcela considerável das emissões de carbono pelo transporte. Uma pesquisa mostrou que idas à escola representaram 18% dos deslocamentos de carro dos moradores urbanos do Reino Unido no ano passado.
Em 1969, 40% dos estudantes norte-americanos iam à escola a pé; em 2001, ano dos dados mais recentes da Pesquisa Nacional de Viagens Domiciliares, um levantamento do governo federal, só 13% o faziam. Centenas de projetos para reduzir o uso do carro já existem em vários lugares da Europa e, mais recentemente, da América do Norte. Diversas cidades da França, do Reino Unido e da Itália já criaram rotas para estudantes pedestres, embora raramente sejam tão extensas e duradouras como as de Lecco.
Enquanto as emissões industriais de dióxido de carbono estão diminuindo em ambos os continentes, as do transporte representam quase um terço do total de emissões de gases do efeito estufa nos EUA e 22% na União Europeia. Em todo o mundo, mas especialmente na Europa, onde os países da UE prometem cortar sua geração de gases do efeito estufa até 2012, conforme estipula o Protocolo de Kyoto, há uma pressão pela redução das emissões de automóveis. Em 2008, a Agência Ambiental Europeia alertou que os trajetos de carro até as escolas são um fenômeno em expansão, com graves implicações para o efeito estufa.
Nos EUA e na Europa, "múltiplas cordas estão enrolando a ida tradicional à escola e fazendo com que seja mais difícil que as crianças caminhem", disse Elizabeth Wilson, pesquisadora dos transportes no Instituto Humphrey de Assuntos Públicos da Universidade de Minnesota (EUA).
Entre esses fatores estão o fato de que cada vez mais gente tem carro, a redução no serviço de ônibus escolares, por causa de cortes nos orçamentos das escolas, e o declínio das escolas de bairro, com o decorrente aumento das opções de escolas, o que leva os alunos a frequentemente viverem mais longe do lugar onde estudam.
No Reino Unido, cerca de metade dos sistemas escolares locais atualmente tem algum tipo de incentivo às caminhadas, segundo Roger Mackett, professor do Centro para os Estudos dos Transportes do University College, em Londres. "Há um esforço bastante grande para manter isso", disse ele. "É sempre mais fácil colocar as crianças no banco de trás do carro. Uma vez que você tem dois ou três carros, não usá-los exige esforço."


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