São Paulo, segunda-feira, 27 de abril de 2009

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A última viagem do guardião do Hubble

Por DENNIS OVERBYE

HOUSTON - John Grunsfeld participava de uma reunião de astrônomos em Atlanta, em janeiro de 2004, quando foiconvocado a voltar a Washington para falar sobre o telescópio espacial Hubble.
Como astronauta, Grunsfeld já esteve em duas viagens espaciais para fazer reparos no mais famoso instrumento a proporcionar à humanidade uma visão do cosmos. Foram experiências que, poucos meses antes, ele descrevera para uma comissão de alto nível que discutiu o destino do Hubble como sendo as mais significativas de sua vida.
Grunsfeld antecipava ansiosamente liderar a terceira e última missão de reparos e manutenção do telescópio, que fora adiada pela perda do ônibus espacial Columbia e sua tripulação no ano anterior.
Grunsfeld correu para Washington, onde foi informado de que a missão tinha sido cancelada por Sean O'Keefe, administrador da Nasa, que a considerara demasiado arriscada. Na condição de cientista-chefe da Nasa, Grunsfeld teve que anunciar para o mundo que a agência espacial dos EUA ia abandonar seu maior instrumento científico, ao mesmo tempo em que traçava planos para um esforço ainda mais arriscado e caro para levar humanos de volta à Lua.
"Sendo astronauta, não há muitas coisas que realmente me causaram choque", comentou Grunsfeld. Mas, acrescentou, "acho que ninguém jamais está preparado para tentar enterrar alguma coisa sobre a qual dissera 'isto é algo pelo qual vale a pena eu arriscar minha vida'".
Ele voltou para casa naquela noite em janeiro e se perguntou se deveria pedir demissão. Mas Grunsfeld e outros seis astronautas, sob o comando de Scott Altman, devem partir para socorrer o telescópio pela última vez em 12 de maio, no ônibus espacial Atlantis.
Será a quinta e última visita que astronautas farão ao Hubble. Quando a potência das baterias e dos giroscópios do telescópio finalmente chegar ao fim, em algum ponto na metade da próxima década, a Nasa pretende enviar um foguete e fazer o telescópio cair no mar.
Grunsfeld se apresentou para o trabalho recentemente numa piscina próxima ao Centro Espacial Johnson. A piscina continha réplicas do Hubble e da Estação Espacial Internacional submersas. Grunsfeld vestiu uma roupa espacial de 180 quilos. Estava se preparando para treinar para sua volta ao espaço.
Se tudo correr bem, o Hubble será abandonado no ápice de sua capacidade científica. Como reparador-chefe do Hubble nos últimos 18 anos, Grunsfeld já se envolveu com o telescópio intelectual, emocional e fisicamente. "Ele talvez seja a única pessoa na Terra que já observou com o Hubble", disse o astrônomo Bruce Margon, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz.
Em setembro passado, Grunsfeld e seus colegas de tripulação estavam a duas semanas de decolar rumo ao Hubble quando um roteador de dados apresentou falhas, obrigando o telescópio a ser fechado até que um roteador reserva pudesse ser acionado. A missão de manutenção foi adiada.
Para que a missão pudesse incluir a instalação do novo roteador, seus planejadores tiveram que reduzir o tempo para o reparo e a ressurreição da câmera principal do Hubble, previsto originalmente para dois passeios no espaço. Agora os planejadores esperam que os trabalhos possam ser feitos em poucas horas, durante uma só saída espacial. Se isso não for possível, disse Grunsfeld, as imagens que vêm inspirando pessoas em todo o mundo, que identificaram planetas que orbitam outras estrelas e que ajudaram a pesquisar o destino de um cosmos dominado pela energia escura, serão perdidas.
Se alguém está à altura desse desafio, esse alguém parece ser Grunsfeld, que fará sua quinta viagem ao espaço. Na primeira delas, Grunsfeld viveu um momento de irrealidade. "Era mágico demais. A Terra estava 300 milhas abaixo de mim. Eu estava a um metro de distância do Telescópio Espacial Hubble. Não resisti. Tive que esticar o braço e tocá-lo".
Antes do treino recente feito numa réplica submersa do Hubble, Grunsfeld estava exibindo um par de luvas ultrassensíveis que o ajudarão na missão. Quando saiu da água, relatou que ele e Andrew Feustel, que será seu parceiro na ida ao espaço, mais uma vez tinham conseguido reparar a câmera, e em pouco tempo, apesar de um suporte para seus pés ter se quebrado na metade do trabalho.
Grunsfeld comentou que vai abraçar o Hubble pela última vez com emoções variadas. "Tento dizer a mim mesmo que é apenas um satélite, nada mais", disse. Mas seu envolvimento com o Hubble vai continuar. Foi concedido a ele tempo para observação no telescópio, que ele usará para estudar a cratera lunar Tycho, formada por um impacto há 70 milhões ou 90 milhões de anos atrás, mais ou menos na mesma época em que se acredita que um asteróide varreu os dinossauros da Terra.
Grunsfeld disse que esse provavelmente será seu último voo espacial. "Realizei tudo o que eu queria na vida depois de minha primeira viagem espacial", explicou. "Ser o homem que conserta o Hubble é simplesmente inacreditável."


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