São Paulo, segunda-feira, 27 de julho de 2009

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LENTE

Relegados ao esquecimento, salvos pela morte

Celebridades como o recém-falecido Michael Jackson às vezes parecem mais vivas depois que morrem. A morte torna-se apenas mais um capítulo em uma carreira agitada, muitas vezes um capítulo rentável. Como escreveu Bob Greene no "New York Times", Jackson poderá seguir as pegadas de Elvis Presley, cuja morte aos 42 anos quase não afetou sua comerciabilidade. Foi amplamente divulgado que o antigo empresário de Presley, o coronel Tom Parker, disse horas após a morte de seu cliente: "Isto não muda nada".
Na morte, Presley tornou-se um grande faturador. E essa lição foi captada pelo pai de Michael Jackson, que três dias após o falecimento do filho disse a um repórter: "Hoje ele é maior que nunca". A notícia da morte realmente funciona de maneiras estranhas na mente do público. Às vezes, como com o "rei do pop", o fato não parece se concretizar; às vezes, quando as celebridades vivem mais que sua fama, o público rapidamente as relega a um pós-vida. Mesmo quando a pessoa é um verdadeiro rei.
Muitos associam o kaiser Guilherme 2? da Alemanha somente à época da Primeira Guerra Mundial. Assim, quando Guilherme morreu, em 4 de junho de 1941, a notícia de que ele ainda estava vivo foi para alguns a parte mais surpreendente de sua morte. No obituário na primeira página do "New York Times", em 1941, Guido Enderis captou o estranho destino do rei: "Com a renúncia ao trono de rei da Prússia e imperador da Alemanha, Guilherme 2? desapareceu no esquecimento da privacidade".
Millvina Dean também passou a maior parte de sua vida no "esquecimento da privacidade", trabalhando como assistente e secretária em pequenas empresas em Southampton, Reino Unido. Ela nunca chamou a atenção para si mesma como última sobrevivente do naufrágio do Titanic em 1912.
Quando Dean morreu, em maio passado, aos 97 anos, John Burns, do "Times", escreveu um substancial obituário de 1.115 palavras sobre sua vida nada notável. Dean raramente falava sobre o passado, relatou Burns. "Ninguém sabia sobre mim e o Titanic, para ser sincera. Na verdade, ninguém se interessava, por isso também não me interessei", ela havia dito a Burns.
Somente depois da descoberta dos destroços do Titanic, em 1985, o mundo novamente tomou consciência de sua existência. Mas, ao morrer, ela estava em um lar de idosos, lutando para pagar as contas. Sua vida na consciência pública foi duas vezes chocante: uma porque ela sobreviveu e outra porque ainda vivia.
É claro que com o Twitter e o Facebook uma morte pode ser disseminada febrilmente pela mente do público, não importa o verdadeiro destino da pessoa. Na mesma semana em que Jackson morreu, a web se tornou uma fonte de relatos da morte de várias celebridades, incluindo o ator Jeff Goldblum.
Mas uma morte por tweet tem o benefício de fazer outros apreciarem a vida que eles pensavam que tinham perdido, como Goldblum disse a Monica Corcoran, do "Times". "Pessoas com quem eu tinha perdido contato voltaram para a minha vida", ele disse. "Elas ligaram para dizer: "Estou contente que você esteja vivo', e isso foi uma espécie de reencontro para mim." Ao que parece, existe vida após a cibermorte.
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