São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2010

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Zebravalos, golforcas e tigreões

Por SEAN B. CARROLL

Os adestradores do Hawaii Sea Life Park ficaram perplexos quando, em 1985, uma fêmea de golfinho, que pesa 180 kg, pariu um filhote escuro, parecido com a falsa-orca de 900 kg que dividia o tanque com ela.
O filhote era uma "golforca", um híbrido de 66 dentes -nem os 88 dos golfinhos, nem os 44 das falsas-orcas.
E em 2006, um caçador no Ártico canadense abateu um urso que tinha o pelo branco como um urso polar, mas com trechos marrons, garras longas e uma corcova, como o urso pardo. Um exame de DNA confirmou que se tratava de um híbrido.
A hibridização entre espécies diferentes não é tão rara. Alguns biólogos estimam que até 10% das espécies animais e 25% das espécies vegetais podem ocasionalmente procriar com outras espécies.
A questão mais importante não é se tais ligações ocasionalmente produzem filhotes, mas a viabilidade do híbrido, e se duas espécies podem se combinar para dar origem a uma terceira.
Vários exemplos de híbridos produzidos por humanos podem crescer em cativeiro, como o "zebravalo" (zebra com cavalo), o "bisoi" (bisão com boi), o "tigreão" (tigre com leão) e a mula (jumento com cavalo). Já os híbridos naturais têm muitos fatores jogando contra seu sucesso em longo prazo.
Um dos principais obstáculos é que duas espécies, quando são geneticamente muito diferentes ou possuem números diferentes de cromossomos, em geral resultam em filhotes inviáveis ou inférteis (como o "zebravalo" e a mula), sendo assim becos sem saída do ponto de vista evolutivo.
Mas é possível que algumas combinações possam permitir que os híbridos se adaptem a condições nas quais seus pais jamais teriam como prosperar.
Análises de DNA estão atualmente permitindo que os biólogos decifrem melhor as histórias das espécies e detectem caso de hibridização que tenham aportado novos genes e capacidades a diversos tipos de organismos, inclusive, ao que parece até agora, nós mesmos.
Análises da distância genética geral entre os neandertais e os humanos modernos revelam que nosso DNA é 99,84% idêntico ao deles.
Essa pequena divergência indica que as duas linhagens se separaram entre 270 mil e 440 mil anos atrás. Fósseis mostram que os neandertais se restringiam à Europa e à Ásia, enquanto o Homo sapiens se originou na África.
Os estudos indicam que os humanos modernos migraram para fora do continente africano e chegaram ao Oriente Médio há mais de 100 mil anos, e à Europa cerca de 45 mil anos atrás, e podem ter encontrado neandertais durante algum tempo em ambos os lugares.
Agora, parece que 1% a 4% da sequência de DNA dos europeus e dos asiáticos, mas não dos africanos, recebeu a contribuição de neandertais que se misturavam ao Homo sapiens, talvez no Oriente Médio, 50 a 80 milênios atrás.
É possível que as versões neandertais de alguns genes tenham permitido que os humanos modernos se adaptassem a novos climas e habitats.
A descoberta de espécies híbridas e de hibridismos do passado está levando os biólogos a reverem sua ideia das espécies como unidades independentes.
As barreiras entre as espécies não são necessariamente enormes abismos; às vezes, é possível cruzá-las com resultados tidos como maravilhosos.


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