São Paulo, segunda-feira, 28 de setembro de 2009

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No Japão, o barato passa a ser chique

Por HIROKO TABUCHI

TÓQUIO - Não faz muito tempo, muitos japoneses compravam tantos melões por R$ 180 e tantas bolsas por R$ 1.800 que o Japão era o único país do mundo onde artigos de luxo eram considerados produtos do mercado de massas.
Os consumidores japoneses mantiveram essa reputação até mesmo durante a estagnação econômica dos anos 1990. Mas a recessão atual fez algo que quedas econômicas anteriores não conseguiram: converteu os japoneses em frequentadores de lojas de descontos.
Em sete anos operando no Japão por meio da subsidiária Seiyu, a rede Wal-Mart, rainha do varejo de descontos, nunca conseguiu apresentar lucros. Mas a empresa prevê que isso mude neste ano; suas vendas têm crescido mensalmente desde novembro.
Varejistas de descontos em todos os setores têm anunciado aumentos no faturamento, enquanto quase todo o resto do comércio apresenta queda. O resultado é que as butiques de luxo, antes todo-poderosas no Japão, estão em choque.
As vendas da LVMH Moet Hennessy Louis Vuitton, fabricante da bolsa que por muito tempo foi a mais procurada no Japão, caíram 20% no primeiro semestre de 2009.
Nos anos 1970 e 1980, e mesmo enquanto a economia cambaleava pelos anos 1990, muitos consumidores gastavam generosamente com bolsas Louis Vuitton e cachecóis Hermès, mesmo às expensas de suas férias, viagens e, em alguns casos, refeições e aluguéis.
Hoje, segundo relatório da consultoria McKinsey, o mercado de luxo do Japão, que movimenta entre US$ 15 bilhões e US$ 20 bilhões, está entre os mais atingidos pela crise econômica global. Analistas e consumidores dizem que a mudança pode ser permanente. Uma nova geração de fashionistas japoneses nem sequer sonha com artigos de luxo.
"Louis Vuitton não me atrai nem um pouco", comentou Izumi Hiranuma, 19. "Antigamente as pessoas achavam que precisavam de uma bolsa para se enquadrarem na sociedade. Mas garotas mais novas, como eu, já não pensam assim."
No novo ambiente, o barato é chique, seja qual for o produto. Nos corredores dos supermercados, as vendas de legumes e verduras comuns estão em alta -coisas como brotos de feijão, cebolas e cogumelos de produção local.
Em lugar de melões, os consumidores japoneses têm optado por bananas. "Desde o ano passado, venho comprando menos frutas [importadas], devido ao preço", disse a dona de casa Maki Kudo, 36. "Em vez de pensar nas marcas, hoje me preocupo com o preço."
A frugalidade tem se manifestado até mesmo em casos improváveis, como as vendas de guarda-chuvas, que subiram à medida que mais japoneses optam por enfrentar a chuva a pé em lugar de chamar um táxi, segundo pesquisa do Instituto Dai-Ichi Life.
Uma guerra de preços começou na categoria das chamadas cervejas de imitação, feitas com proteína de soja ou ervilhas em lugar de cevada.
Em julho, a empresa Seven & I Holdings lançou uma nova cerveja de imitação por R$ 2,40 a latinha. No mesmo mês, o shopping center Aeon lançou sua própria bebida semelhante à cerveja, por R$ 1,90. Em seguida, a rede de supermercados Daiei reduziu os preços de sua cerveja própria para menos de R$ 1,80.
A Seiyu lançou uma guerra de preços, oferecendo almoços prontos (conhecidos como bentos) à base de arroz e salmão por 298 ienes (R$ 5,85). Abandonando o hábito japonês de os supermercados produzirem eles próprios as caixas em que as refeições são embaladas, a Seiyu reduziu os custos ao montar as refeições numa fábrica centralizada.
A empresa apostou que os frugais consumidores japoneses não se importariam com a mudança, desde que as refeições fossem baratas. Ela tinha razão: outro supermercado lançou uma linha concorrente de bentos.
"O preço é minha preocupação número um", disse a consumidora Chie Kawano. "Não preciso de nada luxuoso." No Japão, o barato passa a ser chique

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