São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

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LENTE

TOM BRADY

Misturando rumor e realidade

Uma velha piada entre jornalistas recomenda: "Nunca deixe os fatos atrapalharem uma boa matéria". Especialmente, ao que parece, quando se pode ajeitá-los.
Durante o atual "julgamento" de Tiger Woods via tabloides, o exemplo mais notório disso foi uma reconstituição por computador do acidente de trânsito que o golfista sofreu. O vídeo mostra uma simulação robótica da mulher dele, Elin Nordegren, perseguindo-o com um taco de golfe, contou Noam Cohen no "New York Times".
A animação foi criada pela empresa Next Media, de Hong Kong, dona de jornais sensacionalistas como o "Apple Daily". Os vídeos, que se baseiam em relatos da internet e de jornais, foram realizados por programadores, designers, animadores e atores. Representam a forma como os profissionais acham que os fatos ocorreram.
Ou não.
"Trata-se de uma criação", disse ao "Times" Ken A. Bode, representante do espectador junto ao grupo sem fins lucrativos Corporação para a Televisão Pública. "Como algum jornalista taiwanês sabe o que aconteceu entre Tiger Woods e a mulher dele?" Mesmo assim, o vídeo, em chinês, já foi visto mais de 2,3 milhões de vezes no YouTube.
"Não saber" não impediu que promotores italianos no julgamento da universitária norte-americana Amanda Knox exibissem uma animação em vídeo mostrando como eles acham que sua colega de moradia Meredith Kercher foi morta, segundo o "Times".
Essa versão mostra Knox numa briga com Kercher, enquanto seu namorado segura uma faca no pescoço da vítima e outro cúmplice a agarra por trás.
A animação incluía fotos horripilantes da autopsia de Kercher, talvez conferindo um ar de autenticidade ao que era pura especulação. Knox, 22, e seu ex-namorado italiano Raffaele Sollecito, 25, foram condenados por homicídio.
Podemos estar entrando em uma era na qual a separação entre a simulação em vídeo e a realidade foi borrada a ponto de as pessoas terem dificuldades para distingui-las. Mas Daisy Li, roteirista da Next Media e responsável pelo vídeo sobre Tiger Woods, confia no seu público. "Os leitores podem diferenciar que isso é uma ilustração", afirmou ela ao "New York Times".
Em outra reportagem, John Anderson disse que o cineasta James Cameron está tentando "dissolver a barreira entre emoção humana e animação" em seu novo filme, "Avatar", que custou US$ 230 milhões e usa um avançado processo digital chamado "captura de atuação", que traduz os movimentos de um ator em imagem gerada por computador.
É algo que pode ou não revolucionar o cinema. "Avatar", do mesmo diretor de "Titanic", estreou neste mês em 107 países e já faturou US$ 232,2 milhões nas bilheterias.
Gert Nielsen, consultor dinamarquês para jornalismo gráfico, disse ao "New York Times" que é um dos poucos nesse setor que acha mais importante a história numa ilustração jornalística do que a precisão em cada detalhe.
"Se você não sabe se o carro do vizinho é vermelho ou preto, isso não deve impedi-lo de fazer um gráfico", disse ele. Mas Nielsen acha que, ao criar uma história e usar "balões de pensamento" para descrever o que Nordegren estaria pensando, "os caras do 'Apple Daily' são loucos demais até para o meu gosto".

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