São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

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ENSAIO

MANOHLA DARGIS

Poucas ofertas para mulheres diretoras

Será mais difícil que de costume para Oscar e seus amigos ignorarem as contribuições feitas pelas mulheres ao cinema quando chegar a hora da entrega dos prêmios, em março.
As mulheres têm sido uma força considerável neste ano, quer tenha sido por lotar os cinemas em números recordes para assistir a "Lua Nova" ou por terem ajudado a transformar "Preciosa: Uma História de Esperança" de incógnita em um filme sobre mulheres acaloradamente discutido na memória viva.
Meryl Streep (em "Julie e Julia") e Carey Mulligan ("Educação") receberam aplausos da crítica. E Sandra Bullock encontrou ouro aos 45 anos com "A Proposta" e, mais recentemente, "The Blind Side".
"Lua Nova" e "The Blind Side" talvez não cheguem às listas de dez melhores filmes de muitos críticos, mas sua popularidade com o público é benéfica para as mulheres no cinema -e pode ser grande demais para ser ignorada, mesmo por Hollywood.
Há anos, a visão convencional, tanto em Hollywood quanto na imprensa, vem sendo que as mulheres não vão ao cinema. Apesar de sucessos recentes como "O Diabo Veste Prada", "Sex and the City" e "Mamma Mia!" terem ajudado a abalar essa visão, será preciso mais que milhões de garotas adolescentes (e suas mães) delirando diante de vampiros sedutores para levar mudanças a Hollywood. As mulheres precisam fortalecer seus próprios músculos.
Não me refiro às beldades seminuas que aparecem em fantasias adolescentes, fazendo caras e bocas enquanto disparam canhões -estou falando de filmes feitos para e com mulheres.
Também estou falando de filmes dirigidos por mulheres. Em 81 anos, só três mulheres foram indicadas ao Oscar de melhor direção: Lina Wertmüller por "Pasqualino Sete Belezas", em 1976; Jane Campion por "O Piano", em 1993, e Sofia Coppola por "Encontros e Desencontros", em 2003. Nenhuma levou o prêmio.
Neste ano, a impressão que se tem é promissora, com títulos destacados como "Guerra ao Terror", de Kathryn Bigelow, "Julie e Julia", de Nora Ephron, "Educação", de Lone Scherfig, e "Brilho de Uma Paixão", de Jane Campion, todos bem-sucedidos demais, crítica e comercialmente, para serem desprezados.
Soa como progresso. No entanto, quanto mais se analisa a lista de diretoras deste ano, piores ficam os números. Dos quase 600 filmes que serão resenhados no "New York Times" no final de 2009, cerca de 60, ou 10%, foram dirigidos por mulheres.
Só um punhado de diretoras neste ano foi pago por 1 dos 6 grandes estúdios de Hollywood e suas divisões remanescentes. Dois estúdios -Paramount e Warner Brothers- não lançaram um único filme dirigido por uma mulher.
Espero que as pessoas que controlam o dinheiro -incluindo Sandra Bullock, cuja produtora fez sucessos como "A Proposta"- comecem a dar às cineastas mulheres a chance de fazer outra coisa senão romances tolos (bons romances seriam um bom começo).
De quando em quando uma nova cineasta chama a atenção pública, apenas para desaparecer logo depois. Quem se lembra de Kimberley Peirce, diretora de "Meninos Não Choram"? Susan Seidelman, Penny Marshall, Martha Coolidge, Amy Heckerling ou Nancy Savoca, nenhuma delas teve a carreira que merecia.
Na década de 1920, Ida May Park, atriz americana convertida em diretora, publicou um ensaio em um livro intitulado "Carreiras para Mulheres", no qual precaveu outras mulheres contra o caminho que ela mesma tinha escolhido. "A não ser que você seja resistente e resoluta, o papel de diretora não é para você", escreveu.
Há mulheres que concordariam, ou o fariam se tivessem a oportunidade de dirigir. O problema é que, 90 anos mais tarde, as mulheres avançaram, mas o mesmo não pode ser dito de boa parte da indústria do cinema.


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