São Paulo, segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Um cruzamento de arte e jornalismo na era digital

Exposição mostra jornais como vitais para obras de arte

HOLLAND COTTER
RESENHA

NOVA YORK - Depois da invasão constante do Twitter, do Facebook e da Nação Blogueira, chegamos ao seguinte: "O Derradeiro Jornal". Ou é isso o que o título da exposição de outono do New Museum parece nos estar dizendo. Na realidade, porém, a situação não está tão grave.
"O Derradeiro Jornal" não está tão preocupado em jogar a palavra impressa no lixo quanto em reciclá-la e reposicioná-la como arte ou, pelo menos, em arte. Como que em um voto de confiança, a exposição vai produzir dois tabloides enquanto ficar no museu -até 9 de janeiro-, um deles encomendado pelo museu.
A ideia por trás da exposição -o jornalismo impresso como fenômeno visual e existencial- é pontual e suficientemente específica para ser tratada e ilustrada por meio de arte. Será o fenômeno intrinsecamente efêmero ou monumental? Trata-se de contar a verdade ou de tecer ilusões? Fazemos as mesmas perguntas à arte.
Também indagamos: quem possui o poder de escrever as notícias ou de fazer arte e, por extensão, de criar história?
Quais são as similaridades entre jornais e museus? Até que ponto ambos são responsáveis por fornecer informação social, além de entretenimento?
Mesmo que a exposição não fizer mais que isso, ela vai demonstrar até onde e com que frequência os jornais têm servido de matéria-prima para a arte contemporânea, antiga e nova.
Em uma colagem de Judith Bernstein de 1967 intitulada "Are You Running With Me Jesus?" (você está correndo comigo, Jesus?), recortes de jornais estão conservados como que em um relicário, emoldurados e conservados atrás de uma proteção de vidro. Os componentes principais da colagem são um pedaço desgastado de uma bandeira americana e recortes de jornal sobre guerras raciais urbanas. Todas as superfícies estão cobertas com declarações políticas e ditos obscenos escritos à mão. O resultado é como uma versão em cápsula do tempo de um discurso irado em um blog.
Três desenhos de 1986 de Adrian Piper, intitulados coletivamente "Vanilla Nightmares" (pesadelos de baunilha), foram feitos diretamente sobre páginas do "New York Times" contendo artigos de teor racial.
William Pope.L reencena sua performance de 2000 "Eating the Wall Street Journal" (comendo o "Wall Street Journal"), em que ele lentamente devorou páginas desse jornal. O New Museum confiou as tarefas gustativas a assistentes usando máscaras de Barack Obama.
Outros artistas editam fisicamente textos de jornal publicados em papel. Para um projeto contínuo intitulado "Truth Study Center" (centro de estudo da verdade), Wolfgang Tillmans recorta artigos de jornais e revistas e os expõe com suas próprias fotos para criar histórias complexas e comoventes, de enfoque amplo, sobre violência política e religiosa.
Para uma instalação escultural, Thomas Hirschhorn, afastando-se de seu registro chocante, faz modelos trajarem vestidos feitos de fotos de jornalismo, sendo cada vestido composto de imagens de um assunto.
Mas o foco titular da mostra é a vida contínua do jornalismo impresso, e o jornalismo está de fato vivo na exposição. Um tablóide em formato grande intitulado "New City Reader", concebido para a ocasião por Joseph Grima, diretor editorial da Domus, e Kazys Varnelis, diretor do Laboratório Network de Arquitetura da Universidade Columbia, aborda o noticiário como uma espécie de não ficção criativa.
Sua primeira edição, graficamente notável, reimagina um evento de mais de 30 anos atrás de notícias sobre o noticiário, quando, enfrentando problemas tecnológicos graves, o "New York Times" conseguiu produzir um jornal na noite do blecaute que afetou a cidade em 1977.
E, a pedido do New Museum, um grupo chamado Latitudes, de Barcelona, que entende de jornalismo impresso, está publicando outro tabloide que também fará as vezes de catálogo da exposição.
Tal documento ajudaria a alicerçar uma exposição que pode facilmente demais lançar temas no ar, em lugar de aterrissar sobre eles. E ajudaria a confirmar o compromisso do museu em ser um centro de reflexão séria, além de entretenimento.


Texto Anterior: Livros infantis perdem espaço nas prateleiras
Próximo Texto: Livros eletrônicos: variedade, preços mais baixos e livrarias preocupadas
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.